Falando dos que são
orientados em seu esforço pelo gosto e a estima que têm pela sua própria e
autodirigida atividade, João da Cruz mostra que é precisamente esse apego à sua
própria maneira de rezar e meditar que impede seu crescimento na vida
espiritual.
Quanto mais espiritual for alguma coisa, mais enfadonha acham-na. Pois como procuram tratar das coisas espirituais com completa liberdade e de acordo com a inclinação de sua vontade, causa-lhes tristeza e repugnância entrar no caminho estreito que, diz o Cristo, é o caminho da vida.
João da
Cruz supõe aqui uma total contradição entre o que é autenticamente espiritual
(portanto simples e obscuro) e o que parece
a essas pessoas ser espiritual porque isso as excita e estimula
psicologicamente.
Deus conduz essas pessoas ao
caminho da vida privando-as da luz e consolação que procuram, impedindo seus
esforços, tornando-as confusas e privando-as das satisfações que procuram
alcançar por seus próprios esforços. Assim bloqueadas e frustradas, incapazes
de prosseguir com seus costumeiros projetos, encontram-se num estado muito
doloroso em que seus desejos, a estima de si mesmas, sua presunção, agressividade,
e assim por diante, são sistematicamente humilhados. E, o que é pior, não
conseguem compreender como isto aconteceu! Não sabem o que lhes sucede. Aqui é
que devem decidir, ou continuar no caminho da oração sob a secreta orientação
da graça, na noite da fé pura, ou, então, voltar a uma forma de existência na
qual podem desfrutar rotinas habituais e conservar um senso ilusório de sua
própria e perfeita autonomia em domínios que lhes são inteiramente familiares
sem ter de permanecer sujeitos à obediência da fé nessas circunstâncias
desagradáveis e desconcertantes próprias à “noite escura”.
Diz São João da Cruz que Deus
leva essas pessoas à escuridão –
... aí desmamando-as Deus de todos os sabores e gostos, por meio de fortes securas e trevas interiores, tira-lhes todas estas impertinências e ninharias; ao mesmo tempo, faz com que ganhem virtudes por meios muito diferentes. Por mais que a alma principiante se exercite na mortificação de todas as suas ações e paixões, jamais chegará a consegui-lo totalmente, por maiores esforços que empregue, até que Deus opere passivamente nela por meio da purificação da noite.
Thomas Merton, Poesia e Contemplação