segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Ano Novo

2012 foi um ano difícil... Juntemos, pois, a beleza e a dor... 
Isso tem que dar música com Erhu...

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Poema do Pe. José de Anchieta sobre Jesus na Manjedoura


- Que fazeis, menino Deus,
Nestas palhas encostado?
- Jazo aqui por teu pecado.

- Ó menino mui formoso,
Pois que sois suma riqueza,
Como estais em tal pobreza?

- Por fazer-te glorioso
E de graça mui colmado,
Jazo aqui por teu pecado.

- Pois que não cabeis no céu,
Dizei-me, santo Menino,
Que vos fez tão pequenino?

- O amor me deu este véu,
Em que jazo embrulhado,
Por despir-te do pecado.

- Ó menino de Belém,
Pois sois Deus de eternidade,
Quem vos fez de tal idade?

- Por querer-te todo o bem
E te dar eterno estado,
Tal me fez o teu pecado.

Padre José de Anchieta.

Fonte: Montfort

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

A verdadeira contemplação não prescinde do comum



"Nada é mais alheio à autêntica tradição monástica e contemplativa (isto é, carmelitana) na Igreja do que uma espécie de agnosticismo que exaltaria o contemplativo acima do cristão comum, introduzindo-o num domínio de conhecimento e de experiências esotéricos, livrando-o das lutas, preocupações e sofrimentos comuns à existência humana, colocando-o num plano elevado, num estado privilegiado entre os espiritualmente puros, como se fosse quase um anjo, invocado pela matéria e as paixões e, afinal, sem estar familiarizado com a economia da cruz, dos sacramentos e da caridade.


O caminho da oração monástica não é algo que leve a uma fuga sutil da economia cristã da encarnação e da redenção. É um modo especial de seguir o Cristo, de participar da sua paixão e ressurreição e da sua obra redentora em relação ao mundo. Por esta mesma razão, as dimensões da oração em solitude são as mesmas da angústia comum ao homem, de sua busca de si mesmo, de seus momentos de náusea em face de sua vaidade, falsidade e capacidade de traição. Longe de estabelecer alguém numa segurança narcisista intangível, o caminho da oração nos coloca cara a cara com a impostura e a indignidade do falso eu que procura viver unicamente para si mesmo e saborear as "consolações da oração" egoisticamente. Este "eu" é pura ilusão."

Thomas Merton, Poesia e Contemplação.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A necessidade da contemplação



"Creio na influência de homens silenciosos e irradiantes e digo a mim mesmo que estes homens são raros. Entretanto, eles dão sabor ao mundo... Nada estará perdido enquanto homens como esses continuarem a existir. Se há algo que devemos desejar em nossos dias, é que possamos ver em nós mesmos os inícios da contemplação."

Marius Grout


"A religião tem sempre tendência a perder sua consistência interior e a fé sobrenatural quando lhe falta o fervor da contemplação. É o elemento silencioso, vazio e aparentemente "inútil" na vida de oração, que a torna verdadeiramente uma vida"

Thomas Merton

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Autocomplacência - Sinal de Estagnação Espiritual



"Quantas vezes o guia espiritual, ouvindo almas religiosas aparentemente admiráveis, se entristece e fica atônito pelo sentimento de que diante dele se encontra um muro de auto-suficiência, vaidade e inconsciente auto-satisfação, reforçado de "frases feitas" banais, plagiadas de piedosos autores, muro inteiramente preparado a resistir a toda e qualquer penetração da humildade e da verdade. Seu coração se contrai, é tomado por um sentimento de inutilidade da coisa, de que não há jeito de destruir essa armadura e libertar a verdadeira pessoa enterrada e presa debaixo dessa falsa fachada. A autocomplacência habitual é quase sempre um sinal de estagnação espiritual. Os complacentes não experimentam nenhuma necessidade urgente do auxílio de Deus, não têm consciência real da sua indigência. A meditação desses é confortável, reconfortante e inconcludente. Sua oração mental degenera rapidamente em distrações, castelos no ar ou sono indisfarçado. Por essa razão, as provações e tentações podem ser uma verdadeira bênção na vida de oração. Simplesmente porque nos forçam a orar. Quando começamos a descobrir a necessidade que temos de Deus, é que aprendemos pela primeira vez como, realmente, meditar."

Thomas Merton, Direção Espiritual e Meditação

sábado, 1 de dezembro de 2012

Renúncia



Chora de manso e no íntimo... procura 
Tentar curtir sem queixa o mal que te crucia: 
O mundo é sem piedade e até riria 
Da tua inconsolável amargura. 

Só a dor enobrece e é grande e é pura. 
Aprende a amá-la que a amarás um dia. 
Então ela será tua alegria, 
E será ela só tua ventura... 

A vida é vã como a sombra que passa 
Sofre sereno e de alma sobranceira 
Sem um grito sequer tua desgraça. 

Encerra em ti tua tristeza inteira 
E pede humildemente a Deus que a faça 
Tua doce e constante companheira...

Manuel Bandeira

domingo, 11 de novembro de 2012

Nós queremos o que Ele quer - Georges Bernanos


Nós queremos realmente o que Ele quer, queremos verdadeiramente, sem o saber, as dores, os sofrimentos, a solidão, embora imaginemos querer só os prazeres. Imaginamos temer a morte e fugir dela, quando na realidade queremos esta morte como Ele quis a Sua. Assim como Ele Se sacrifica em cada altar onde se celebra a Missa, Ele recomeça a morrer em cada homem em agonia. Queremos tudo o que Ele quer, mas não sabemos que o queremos, nós não nos conhecemos, o pecado faz-nos viver à superfície de nós mesmos, só voltaremos a nós para morrer, e é ali que Ele nos aguarda.

Georges Bernanos, Tunísia, 1948

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

sábado, 3 de novembro de 2012

Symphonia Virginium


“Ó amante cheio de doçura, de dóceis abraços, ajuda-nos a conservar nossa virgindade. Fomos formadas do pó, ai!, ai!, e no crime de Adão. Bem duro é contradizer o gosto que o fruto tem. Dá-nos coragem, ó Cristo, Salvador. Nós desejamos ardentemente seguir-te. Ó como é gravoso, para nós miseráveis, a ti imaculado e inocente Rei dos Anjos imitar. Confiamos em ti, todavia, pois é teu desejo a pedra preciosa permanecer sem putrefação. Invocamos-te agora, Esposo e consolador, que nos redimiste na cruz. Por teu sangue comprometidas somos para ti esposas repudiando homem para te preferir a ti Filho de Deus. Ó belíssima forma, ó suavíssimo perfume de desejáveis delícias, sempre por ti suspiramos no exílio das lágrimas, na esperança de contemplar-te e contigo permanecer. Nós estamos no mundo e tu em nossa mente, abraçamos-te no profundo coração quase como se foras presente. Tu, fortíssimo leão, rompeste o céu para descer ao útero duma Virgem e destruíste a morte para elevar a vida à cidade de ouro. Concede-nos habitar dentro de seus muros e permanecer contigo, dileto Esposo, pois nos livrastes das fauces do Diabo, que seduziu nossos primeiros pais.”

(SYMPHONIA VIRGINUM, de Santa Hildegard von Bingen, Doutora da Igreja).

Fonte: O Camponês

sábado, 27 de outubro de 2012

O Combate Interior


"Esse é, em verdade, o momento e o lugar corretos do combate, isto é, diante da Luz de Sua Face. Se te manténs firme, se não te desvias, verás e sentirás grandes maravilhas. Descobrirás Cristo combatendo o inferno dentro de ti, fazendo em pedaços as tuas bestas, e fazendo surgir em ti um grande tumulto e uma grande miséria. Teus pecados secretos serão os primeiros a despertar, e tentarão separar-te de Deus. Verás e sentirás, então, como a morte e a vida lutam uma com a outra e, pelo que se passa em ti, entenderás o que são o céu e o inferno.

Mas não te movas por isso; mantém-te firme e não te desvies. Por fim, todas as más inclinações se tornarão fracas e começarão a morrer, e tua vontade se tornará cada vez mais forte e capaz de submetê-las. Então, gradualmente, tua vontade e tua mente ascenderão ao céu, e tuas más inclinações perecerão. Obterás uma mente nova e, despojando-te da deformidade bestial e recobrando a imagem divina, começarás a ser uma nova criatura. Assim te libertarás de tua presente angústia e chegarás novamente ao repouso." 

Jacob Boehme, A Sabedoria Divina

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

O Caminho Estreito


O caminho estreito da perpétua ascensão aos céus e da imitação de Cristo é este: deves desesperar de todo teu próprio poder e fortaleza, pois através dele não podes alcançar os portais de Deus. Deves decidir-te firmemente a entregar-te por completo à misericórdia de Deus. Deves submergir-te com toda tua mente e razão na paixão e morte de nosso Senhor Jesus Cristo, desejando sempre perseverar nele e morrer para todas as criaturas.

Deves também vigiar tua mente, teus pensamentos e inclinações, para que não acolham mal algum, e não deves permitir que a honra ou o proveito temporal te seduzam. Deves ter a intenção de afastar de ti toda falta de retidão e tudo o que possa obstruir a liberdade de teu movimento e progresso. Tua vontade deve ser inteiramente pura e fixar-se na firme resolução de nunca retornar aos velhos ídolos, mas abandoná-los e separar tua mente deles, entrando no caminho sincero da verdade, da retidão e da justiça, seguindo a doutrina de Cristo.

Jacob Boehme, A Sabedoria Divina

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

The Mountain


O amor é loucura para o mundo, mas sabedoria para os filhos de Deus

S. Francisco de Assis
"(...) O caminho que conduz ao amor de Deus é loucura para o mundo, mas sabedoria para os filhos de Deus. Por isso, quando o mundo percebe esse santo fogo de amor arder nos filhos de Deus, conclui prontamente que enlouqueceram; mas para os filhos de Deus, esse ardente Fogo de Amor de Deus é seu maior tesouro, um tesouro tão grande que vida alguma pode expressar o que é, nem língua alguma pode nomeá-lo. Ele é mais brilhante que o Sol, mais doce que qualquer doçura, mais forte que toda fortaleza, mais nutritivo que qualquer alimento, mais inebriante ao coração que o vinho, mais prazeroso que todo o gozo e todos os prazeres deste mundo. Quem quer que o obtenha é mais rico que qualquer coisa da terra, mais nobre que qualquer imperador e mais forte que todo poder e autoridade."

Jacob Boehme, A Sabedoria Divina

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Se o fogo do Amor acender-se em ti...

Imagem: Sta Catarina de Sena, Virgem, Mística, Doutora da Igreja
"Se, ao menos uma vez, o Fogo do Amor acender-se em ti, sentirás seu ardor consumir rapidamente toda tua egoidade, e arderás em tal regozijo em seu Fogo que não desejarás, por nada neste mundo, estar fora dele. Sim!, preferirás a morte a retornar a teu algo. Então esse Fogo se tornará cada vez mais quente, até cumprir perfeitamente sua missão com respeito a ti, e portanto não arrefecerá até alcançar o sétimo grau. Quando chegar a esse ponto, sua chama será tão grande que nunca te abandonará. Mesmo que te custe a vida temporal, ele te acompanhará na morte com seu doce calor, e se tivesses de ir ao inferno, ele destruiria o inferno por ti. Estejas certo disso, pois o amor é mais forte que a morte e o inferno"

Jacob Boehme, A Sabedoria Divina

Sobre amor e amizade

No conjunto das relações interpessoais, a amizade é o pressuposto do romance. Isto não significa que, em toda relação amorosa, uma longa e duradoura amizade preceda a união. Às vezes, o intento é o amor, desde o início. No entanto, há sim uma anterioridade, ainda que não necessariamente temporal, da amizade com relação ao namoro. Mesmo quando ambos existem simultaneamente, a amizade é como o sustentáculo de tudo. Um casal de namorados é um bom casal quando, por baixo de seu amor, está uma sólida amizade. É somente a partir desta que algo mais intenso e mais único pode ser construído. Um namoro que não se fundamentasse na amizade seria como uma construção sem alicerces. Meramente estética, aparentemente conveniente, mas sem firmeza. 

Se o aceitamos, vemos como é triste quando, por um amor, alguém trai ou abandona uma amizade. Ainda que amor e amizade não sejam dedicados à mesma pessoa, nem por isso eles necessariamente se opõem. Se por causa de uma nova relação surge a exigência de se abandonar um amigo, tal exigência não será legítima, e a satisfação desta condição assemelhar-se-ia à de quem, para obter uma promoção no emprego, tivesse de esquecer a mãe. No entanto, isto costuma ser feito sem muito remorso. Basta uma pequena dose de egoísmo para rapidamente falsearmos as coisas na sua natureza. Com um pouquinho de esforço, e um ato de covardia se veste de heroísmo. 

Isto não significa que a amizade deve se tornar um tipo de prisão, e que a pessoa deve submeter-se, antes de tudo, aos caprichos de seu amigo. Não; isso sequer seria fidelidade. Vezes haverá em que, por culpa do próprio amigo, a relação será desfeita. Porém, quando tal condição não foi posta pelo amigo, e ainda assim, o outro optou por abandoná-lo sob o pretexto de “ir ser feliz”, que falsa concepção de amizade se tinha! É semelhante a Pedro ao dizer: “não o conheço...” Que amor alguém teria pela família se, para conseguir uma bolsa de estudos fora, tivesse de renegá-la? Esse é o tipo de atitude descrita na frase: “quem quiser ganhar a sua vida...” Que Deus, nosso Senhor, por Sua Cruz e por Quem é, jamais mo permita.

"Vossa sou"

Eis aí uma das minhas poesias favoritas de autoria da minha santa favorita. Eis a disposição de alma que todos deveríamos trabalhar e lutar para ter. Que ela interceda por nós.

sábado, 20 de outubro de 2012

Sede como as criancinhas


Discípulo: "Ó mestre, suplico-te que me ensines a maneira mais rápida de chegar a esse estado"

Mestre: "De todo meu coração! Pensa nas palavras de nosso Senhor Jesus Cristo: A menos que vos convertais e vos torneis como criancinhas, não entrareis no Reino dos Céus (Mat 18,3). Não há caminho mais curto que este, nem se pode encontrar caminho melhor. Em verdade, Jesus te diz que a não ser que te transformes e sejas como uma criancinha, d'Ele dependendo para todas as coisas, não verás o Reino de Deus. Faz isso, e nada te poderá causar dano, pois serás amigo de todas as coisas que existem, uma vez que dependerás do Autor e Fonte delas e, por tal dependência e pela união de tua vontade com a Vontade d'Ele, tornar-te-ás como Ele.

Mas observa o que ainda tenho a dizer e não te inquietes com isso, mesmo que a princípio de possa ser difícil concebê-lo. Se desejas ser como todas as coisas, tens de renunciar a elas, afastar-te de todas elas e não desejar nenhuma delas; não deves estender tua vontade para possuí-las para ti como propriedades. Pois, assim que acolhes algo em teu desejo e o recebes em ti como tua propriedade, essa mesma coisa, seja qual for sua natureza, identifica-se contigo e age em tua vontade; então és obrigado a protegê-la e a cuidar dela, como se formasse parte de teu próprio ser. Mas se nada acolhes em teu desejo, és livre de todas as coisas, e governas sobre todas elas ao mesmo tempo, como um príncipe de Deus, pois nada recebeste para ti mesmo, e és como nada para todas as coisas, e todas as coisas são como nada para ti. És como uma criancinha que não compreende o que uma coisa é, e ainda que a compreendas, teu entendimento não se mescla a ela, e ela não afeta ou aprisiona tua percepção. Do mesmo modo, Deus governa, vê e compreende as coisas, sem ser apreendido por elas."

Jacob Boehme, A Sabedoria Divina

Como ver e ouvir a Deus?


Discípulo: "Qual é o obstáculo que me detém e me impede de chegar a esse estado (o estado de ouvir e ver a Deus de modo suprassensível)?"

Mestre: "Na verdade, nada senão tua própria vontade e visão te impedem de alcançar esse estado suprassensível do qual provieste; pois caíste e segues à deriva. Com tua própria vontade, te desvias da Visão de Deus. Enquanto enxergares apenas com tua vontade, estarás cego à Vontade Divina. Tua vontade detém em ti a audição divina, fazendo-te surdo a Deus, conduzindo-te às coisas terrestres e materiais, exteriores a ti, conduzindo-te às coisas terrestres e materiais, exteriores a ti. Então, obscurecido pelos objetos de teu desejo, ficas cativo da natureza, atas-te com tuas próprias cadeias e manténs-te em tua própria e escura prisão, que tu mesmo fizeste, e não te podes livrar e chegar ao estado sobrenatural e suprassensível."

Discípulo: "Mas uma vez que estou na natureza, aprisionado por minhas próprias cadeias e minha própria vontade natural, peço que me digas de que maneira, estando na natureza, posso chegar a esse plano sobrenatural, sem destruí-la?"

Mestre: "Três coisas são necessárias: a primeira, que resignes tua vontade à de Deus e te lances no abismo de Sua misericórdia; a segunda, que odeies tua própria vontade e não faças nada daquilo a que ela te conduz; a terceira, que te inclines pacientemente sob a cruz, submetendo-te a ela de coração, para que possas resistir às tentações da natureza e da criatura. Se assim o fizeres, Deus falará em teu interior e conduzirá tua resignada vontade para Si, para o plano sobrenatural, e então escutarás o que o Senhor fala em ti."

Discípulo: "Estas são duras palavras, mestre, pois para fazer isso, teria de renunciar ao mundo e à minha vida."

Mestre: "Não te desalentes com isso. Se renunciares ao mundo, chegarás àquilo a partir do qual o mundo foi feito. Se perderes tua vida, encontrarás a vida n'Aquele pelo qual renunciastes a ela; tua vida estará em Deus, de quem proveio para entrar em teu corpo. À medida que teu próprio poder tornar-se fraco e começar a morrer, o poder de Deus agirá em ti e através de ti."

Jacob Boehme, A Sabedoria Divina.

*Lembrando que Boehme é um autor bastante suspeito e gnóstico. Ler com advertência ou, se não tiver firmeza da Fé Católica, nem ler.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Oh Chuva...



Oh Chuva, tu que trazes a coragem
Que outrora o vento roubou...
Oh Chuva, tu que moves a vontade
A escolher viver sem calor,
A andar debaixo das nuvens sem ver o sol...

Shalom, Inverno

sábado, 13 de outubro de 2012

À espera do amorável Esposo


Dias atrás, comecei a sentir, já, o clima de Natal. Sempre o noto assim, bem antes. O aspecto, a luz, o jeito do mundo mudam. Tudo parece falar d'Ele. Tudo reflete a Sua proximidade. Diz S. João da Cruz que, enquanto Ele os ia olhando - aos bosques e soutos; ao mundo, em suma -, só com Sua figura, a todos revestiu de formosura. Na verdade, tudo na existência traz a marca d'Ele porque tudo é produto de Suas mãos. Quem souber ver, notará a Sua presença revelada justamente onde ela se vela. Caminhar pelas ruas e perceber o jeito sutil com que o mundo parece relembrar aquela noite... como tudo se prepara para a sua chegada.. A ternura nascerá, mas desde já ela se antecipa como numa espécie de transbordamento de si, como alguém cujo perfume já se sente antes ainda de ele chegar. Inebriemo-nos do Seu amor... Extasiemos de alegria quando Ele vier. Mas a espera... já é alegre e tão doce...

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Desaguar...


"Apenas rocei a mão em ombros alheios
Meus dedos destilaram carinho;
Quase me liquefiz...
Ando assim: querendo desaguar."

Sir Oirevlis

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Aos leitores


Bem, pessoal. Acabei de colocar uns botões de avaliação das postagens.. Eles ficam bem embaixo, no roda-pé dos artigos. É interessante que vocês avaliem. Verdade é que este é um blog pessoal e que nele vou postando aquilo que, a meu ver, concorda com o 'espírito' deste espaço, ou ainda o que eu penso dever ser conhecido pelo maior número de pessoas. Porém, mesmo assim, eu gostaria de ter algum tipo de feedback dos poucos mas reais leitores que por aqui passam. Além disto, à medida em que vocês se sentirem dispostos, comentem, façam perguntas, peçam artigos sobre algum assunto em específico. Terei muito boa vontade de os escrever se considerar o assunto viável. Se o impedimento se deve à timidez, é possível postar em qualquer blog meu de modo anônimo. Então, fica aí a recomendação. Grande abraço.

O servo de Deus deve fazer nenhum caso das honras


"Deus nos livre de pessoas, desejosas de o servir, que se lembram da própria honra! É mau lucro. 
A honra tanto mais se perde, quanto mais se deseja, especialmente em disputas acerca de proeminências. Não há tóxico no mundo que mate tão eficientemente como essas ambições destroem a perfeição." 

Sta Teresa D'Avila

A segurança de não ter satisfação em coisa alguma


Parece demasiada exigência dizer que não tenhamos satisfação em coisa alguma! 
É porque não se diz a um tempo quantos prazeres e alegrias acarretam esta contradição, 
e o quanto se ganha com ela, ainda nesta vida! Quanta segurança!

Sta Teresa D'Avila, Caminho de Perfeição

Quisera consolar-Vos...


"Quisera consolar-vos da ingratidão dos perversos, suplicando-vos que me tireis a liberdade de vos agravar. Se alguma vez cair por fraqueza, vosso Divino Olhar me purifique imediatamente a alma, consumindo todas as minhas imperfeições, como o fogo que transforma em si próprio todas as cousas..." 

Sta Teresinha de Lisieux, Ato de Oblação ao Amor Misericordioso.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Ó Verbo Divino, Águia adorada...


‎"Ó Verbo Divino, és tu a Águia adorada, a quem amo, és tu que me atrais! És tu que, lançando-te na terra do exílio, quiseste sofrer e morrer, a fim de atrair as almas ao centro do eterno foco da Bem-aventurada Trindade. És tu, que te remontas à Luz inacessível, que doravante será tua estância. És tu, ainda que, permaneces neste vale de lágrimas, e te escondes na aparência de uma hóstia branca... Águia Eternal, queres nutrir-me com tua divina  substância, a mim, pobre criaturinha, que ao nada retornaria, se teu divino olhar me não outorgasse a vida a cada instante" 

Sta Teresinha de Lisieux, Carta à Ir. Maria do Sagrado Coração

domingo, 9 de setembro de 2012

Divulgando e-mail vocacional

Olá.. Tenho vindo poucas vezes por aqui.. Mas retomarei as postagens.
Alguém me pede para divulgar este msn às pessoas que possuem dúvidas quanto à vocação.

discernindoavocacao@hotmail.com

Ele adianta que aceita qualquer pessoa.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

O objetivo da luta espiritual


Ter um coração unificado, um coração puro, sensível e capaz de discernimento, um coração que conserva e engendra pensamentos de amor, eis o objetivo da luta espiritual. Que arte apaixonante! Preparar-se, na vigilância, para a luta, para esta luta que Rimbaud definia como "mais dura que a guerra entre os homens".

domingo, 26 de agosto de 2012

Deixar a si mesmo


"Se um homem deixou um reino ou mesmo todas as coisas e se não tiver deixado a si mesmo, não terá, na verdade, deixado nada. Se deixar a si mesmo, embora fique na honra e na riqueza ou continue a possuir o que quer que seja, o homem deixou efetivamente tudo".

Mestre Eckhart

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

"Que o teu espírito se eleve acima de tudo isso..."


"Não preste muita atenção às palavras dos homens, deixa que cada um te julgue como quiser. Não te justifiques, que isso em nada te prejudicará. Entrega tudo ao primeiro sinal de exigência, ainda que sejam as coisas mais necessárias. Não peças nada sem pedir o Meu conselho. Permite que te tirem até aquilo a que tens direito: o reconhecimento, o bom nome; que o teu espírito se eleve acima de tudo isso. E, assim, liberta de tudo, descansa junto do Meu Coração." 

(Diário de Sta. Faustina - 1685)

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Sempre Amigos - Filme


Porque a coisa mais importante do mundo é a bondade....
Porque um amigo é um tesouro escondido que não se encontra de qualquer modo...

Porque a amizade, sendo amor, é da ordem do Mistério e da Transcendência.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Sta Teresa D'Avila fala do amor fraterno perfeitamente espiritual


Poderá parecer-vos descabido, irmãs, tratar eu deste assunto. Direis que já sabeis tudo isso que vos explico. Praza ao Senhor que assim seja e que o tenhais impresso nas entranhas, como é preciso.

Se o souberdes vereis que não minto quando afirmo que o Senhor atrai ao estado de perfeição a quem possui este amor. São almas generosas, almas régias, não se contentam com amar coisa tão ruim como os nossos corpos, por formosos que sejam, por muitos encantos que tenham.

Por certo os admiram, e louvam o Criador, porém, não se detêm neles de modo a lhes ter amor pelos atrativos exteriores. Pareceria amar coisa sem valor e ocupar-se em querer bem a uma sombra. Ficariam envergonhados e não teriam condições para, sem afronta, dizer depois a Deus que o amam.

Dir-me-eis: esses tais não sabem amar, nem corresponder ao afeto que se lhes tem. Na verdade, pouco se lhes dá de serem ou não queridos.

Se algumas vezes, no primeiro momento, por inclinação natural, gostam de se sentir amados, caindo em si, vêem que é disparate, a menos que se trate de pessoas capazes de lhes beneficiar a alma com doutrina ou com oração.

Qualquer outra amizade os cansa. Percebem que nenhum bem lhes faz, antes os prejudica. Não é que se descuidem de agradecer e retribuir aos amigos com sua intercessão junto de Deus, mas deixam tudo a cargo do Senhor. É coisa que lhe diz respeito e dele procede.

Em si mesmo não vêem motivo para serem queridos e apreciados. Pensam que se alguém lhes quer bem é porque Deus os ama. Deixam a Sua Majestade o cuidado de pagar, suplicam-lhe que o faça e ficam livres, como se a coisa não fosse com eles.

E, bem considerado, quando não se trata de pessoas que nos podem ajudar a conseguir os verdadeiros bens, às vezes penso que há grande cegueira neste desejo de sermos amados.

Notai agora: quando queremos o amor de alguém, sempre temos em vista um proveito ou nosso contentamento pessoal. Ora, essas almas perfeitas já trazem tudo debaixo dos pés: bens, satisfações e prazeres que o mundo lhes pode dar. Chegaram a tal ponto que, por assim dizer, ainda que queiram, não se podem deleitar senão em Deus, ou em tratar de Deus. Sendo assim, que interesse pode haver em serem amadas?

Convencidas desta verdade, riem-se de si mesmas e do tempo em que se afligiam por não saberem se era correspondido ou não o seu afeto. É muito natural querer a paga de uma boa amizade. Mas, cobrada esta, em que consiste? Palhinhas ocas e sem peso, que o vento leva...

E mesmo quando muito nos tenham querido, que é isto que nos resta? Essas almas perfeitas pouco se importam de serem ou não queridas, a não ser, repito, para seu aproveitamento espiritual, sabendo muito bem, dada a nossa natureza, que aqueles que nos ajudam, podem se cansar.

Parecer-vos-á que essas almas não amam como nós, nem sabem amar senão a Deus? Pois eu vos digo que amam muito mais, e com maior veemência, e com amor mais proveitoso e verdadeiro: enfim é amor.

São sempre muito mais afeiçoadas a dar que a receber, até com o próprio Criador. Asseguro-vos que só este amor merece tal nome, que essas outras afeições imperfeitas lhe têm usurpado o nome.

Perguntareis também: se estes não amam o que vêem, a que se afeiçoam? Na verdade, amam o que vêem e afeiçoam-se ao que ouvem, mas só vêem o que é durável, o que é eterno. Quando amam, passam para além dos corpos, põem os olhos nas almas, e procuram se há o que amar.

Se não houver, mas encontram algum germe de virtude ou alguma boa disposição, indício de ouro naquela mina, cavam e não poupam esforço. Não há coisa difícil que de boa vontade não façam para proveito daquela pessoa, porque desejam continuar a amá-la, mas sabem perfeitamente que é impossível se ela não tiver em si virtudes divinas e grande amor de Deus.

Sem essas virtudes não a podem amar, e ainda menos com afeto duradouro, por mais que essa pessoa faça os maiores obséquios e serviços, que morra de amor e possua todos os encantos da natureza reunidos: a amizade não terá força, nem poderá consolidar-se.

Ninguém pode enganar uma alma perfeita porque ela sabe por experiência, o valor das coisas terrenas. Quando não pensam do mesmo modo poderão amar-se por muito tempo? É amor que há de acabar com a vida, pois, se um não guarda a lei divina, e por conseguinte, não ama a Deus, os seus destinos serão diferentes.

Essas almas nas quais o Senhor infundiu verdadeira sabedoria, não querem amizades que só duram o tempo da vida, não lhes dão valor. Para quem deseja gozar as coisas do mundo - prazeres, honras e riquezas - esse amor terreno será válido quando o amigo é rico e possui meios de recreação e passatempo. Mas se nada disto interessa, nenhum caso faz de tal amizade.

Quando as almas perfeitas amam a alguém, desejam ardentemente que o amigo tenha amor a Deus, para ser também amado por ele. Sabem que de outro modo o amor não é durável.

É amizade que lhes custa muito caro: não há diligência que deixem de fazer para aproveitamento da pessoa amada. Mil vidas dariam para lhe obter um pequeno benefício espiritual. Ó precioso amor, que tão fielmente imita o comandante-chefe do amor, Jesus, nosso bem!

Sta Teresa D'Avila, Caminho de Perfeição

terça-feira, 14 de agosto de 2012

O Homem, um animal que fabrica dogmas


O homem pode ser definido como um animal que fabrica dogmas. À medida que empilha doutrina sobre doutrina e conclusão sobre conclusão, ao formar algum enorme esquema filosófico e religioso, está, no único sentido legítimo de que a expressão é capaz, se tornando mais e mais humano. Ao abandonar doutrina após doutrina, num refinado ceticismo, ao recusar filiar-se a um sistema, ao dizer que superou definições, ao dizer que duvida da finalidade, quando, na própria imaginação, senta-se como Deus, não professando nenhum credo, mas contemplando todos, então está, por intermédio do mesmo processo, imergindo lentamente na indistinção dos animais errantes e da inconsciência da grama. Árvores não têm dogmas. Nabos são particularmente tolerantes.

G.K. Chesterton, Hereges

sábado, 11 de agosto de 2012

G.K. Chesterton e o Culto Contemporâneo do Eu

“Os seres humanos são felizes enquanto mantêm o poder receptivo e de reacção, em atitude de surpresa e de gratidão, em relação a algo fora do Eu. Enquanto assim forem — como sempre foi afirmado pelas maiores mentes ao longo da História —, dispõem de algo que está presente na infância e que pode ainda preservar e solidificar a adultez. 

A partir do momento em que o Eu é conscientemente sentido como algo superior a qualquer uma das qualidades exteriores que vêm ao seu encontro, ou superior a qualquer uma das aventuras que pode desfrutar, surge então nele uma espécie de previamente determinado enfado e desencanto auto-destrutivos que preenchem totalmente os símbolos tartáreos [infernais] de sede e de desespero. 

 — G. K. Chesterton, “The Common Man”

Fonte: Espectivas.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

A Perfeita Pobreza Interior por S. João da Cruz


"Cuide de conservar o espírito de pobreza e desprezo de tudo; de outra forma, saiba V. Rev. que cairão em mil necessidades espirituais e temporais. Todas hão de contentar-se com Deus somente. Saibam que só haverão de provar e padecer as necessidades a que sujeitarem o coração: o pobre de espírito, vendo-se à míngua, está mais contente e alegre, porque pôs seu tudo em nada, em coisa alguma; e assim em tudo ele encontra largueza de coração. Feliz é esse nada, feliz esse esconderijo do coração: tem tanto poder que a tudo domina, sem nada querer sujeitar a si próprio e desfazendo-se de preocupações para poder arder em maior amor. As irmãs aproveitem-se dessas primícias de espírito que Deus concede nesse início, para retomar com muita renovação o caminho da perfeição em total humildade e desapego, interior e exterior, não com ânimo pueril, mas com vontade robusta. Sigam a mortificação e a penitência, querendo que Cristo lhes custe algo, e não sendo como os que buscam, em Deus, ou fora dele, seu próprio conforto e sossego; procurem o padecer em Deus e fora dele, por seu amor, no silêncio, na esperança e na lembrança amorosa..."

S. João da Cruz em Carta à priora do recém fundado convento de Córdoba.

Impressão de Sta Teresa ao visitar a casinha de S. João da Cruz, em Durvelo.


"Ao entrar na capela, fiquei admirada ao ver o espírito que o Senhor havia infundido ali. E não só eu, pois dois mercadores, meus amigos, que haviam vindo comigo de Medina, não faziam outra coisa senão chorar! Nunca me esqueço de uma pequena cruz de madeira sobre a pia de água benta: sobre essa cruz estava colada uma imagem de Cristo, feita de papel, que parecia suscitar mais devoção que se fosse feita de material muito bem trabalhado"

Sta Teresa de Jesus, As Fundações.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Grande verdade encerrada numa pequena frase


"Alguns pensam ter verdadeira fé sem cumprir os mandamentos. 
Outros cumprem os mandamentos e esperam o Reino como sua devida recompensa. 
Ambos estão errados." 

 (São Marcos, o Asceta)

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Hans Zimmer - Tennessee HD

Sta Teresinha fala de seus escrúpulos

No retiro para a Segunda Comunhão é que fui assaltada pela terrível doença de escrúpulos... É preciso passar por tal martírio, para o compreender. Ser-me-ia impossível dizer quanto não sofri em ano e meio... Todos os meus pensamentos e as minhas mais comezinhas atividades se tornavam para mim motivo de perturbação. Só tinha sossego, quando os contava à Maria, e isto me era muito penoso, por sentir a obrigação de lhe dizer todas as idéias extravagantes que me vinham à mente a respeito dela própria. Alijado meu fardo, desfrutava um instante de paz, mas a paz desvanecia-se como um relâmpago, e logo começava novamente meu martírio. De quanta paciência não precisava minha querida Maria, para me ouvir, sem dar mostras de nenhum aborrecimento!...

Mal chegava eu da Abadia, punha-se ela a arrumar-me os cabelos para o dia seguinte (pois, querendo agradar ao Papai, a rainhazinha andava todos os dias com os cabelos em cachinhos, para grande admiração das colegas, mormente das professoras que não tinham diante de si crianças tão bem cuidadas pelos pais). E durante a arrumação não parava de chorar, contando todos os meus escrúpulos.

Sta Teresinha de Lisieux, História de Uma Alma.

Sta Teresinha fala de sua Primeira Comunhão



Raiou, enfim, o "mais belo de todos os dias". Quão inefáveis não são as recordações que na alma me deixaram as mínimas circunstâncias dessa data do Céu!... A alegre alvorada, os respeitosos e afetuosos ósculos das mestras e das colegas maiores... O salão nobre, repleto de tufos cor de neve, com os quais cada criança se via adornada por sua vez... Acima de tudo, a entrada na Capela e a entoação matinal do lindo cântico: "O Santo Altar, que de Anjos sois rodeado!"

Não quero, contudo, descer a pormenores. Coisas há que perdem a fragrância, quando expostas ao ar. Existem pensamentos da alma que não se podem traduzir em linguagem terrena, sem perderem o sentido autêntico e celestial. São como a "pedrinha branca que se dará ao vencedor, sobre a qual está escrito um nome, que ninguém CONHECE, senão QUEM a recebe. (Ap 2,17). Ah! como foi afetuoso o primeiro ósculo de Jesus à minha alma!...

Foi um ósculo de amor. Sentia-me amada, e de minha parte dizia: "Amo-vos, entrego-me a Vós para sempre". Não houve pedidos, nem porfias, nem sacrifícios. Desde muito, Jesus e a pobre Teresinha se tinham olhado e compreendido. Naquele dia, porém, já não era um olhar, era uma fusão. Já não eram dois, Teresa desvanecera, como a gota de água que se dilui no bojo do oceano. Ficava só Jesus, era Ele o Senhor, o Rei. Teresa pedira-lhe tirasse sua liberdade, pois sua liberdade lhe fazia medo. Sentia-se tão fraca, tão frágil, que desejava permanecer para sempre unida à Força Divina!... Sua alegria era grande demais, era profunda demais, para que a pudesse represar. Não tardou em debulhar-se em deliciosas lágrimas, com grande espanto das colegas que, mais tarde, diziam entre si: "Por que será que chorou? Sentiria algo que a acabrunhasse?... Não será, antes, por não ver junto a si a própria mãe ou a irmã, que é carmelita, a quem tanto ama?" - Não compreendiam que, ao descer a um coração toda a alegria do Céu, não a pode suportar um coração banido, sem derramar lágrimas... Oh! não! A ausência de Mamãe não me contristava no dia de minha Primeira Comunhão. Não estava o Céu dentro de mim, e nele não tinha Mamãe desde muito tomado lugar? Desta forma, quando recebi a visita de Jesus, recebi também a de minha querida Mãe, que me abençoava e se regozijava com minha felicidade...

Não chorava, outrossim, a ausência de Paulina. Sem dúvida alguma, ficaria contente, se a visse ao meu lado, mas desde muito meu sacrifício estava aceito. Nessa data, meu coração se encheu só de alegria. Uni-me a ela, que irrevogavelmente se dava Àquele que tão amorosamente se dava a mim!...

Sta Teresinha de Lisieux, História de Uma Alma

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Sta Teresinha e sua primeira Confissão


Ó minha Mãe querida! com que solicitude me preparastes, quando me explicastes que não era a um homem, mas ao Bom Deus que iria contar meus pecados. Disto estava tão convicta, que fiz minha confissão com grande espírito de fé, e cheguei até a perguntar-vos, se não seria mister referir ao Padre Ducellier que o amava de todo o meu coração, pois que em sua pessoa era ao Bom Deus que ia falar.

Bem instruída a respeito de tudo quanto devia fazer e dizer, entrei no confessionário e pus-me de joelhos. Quando, porém, abriu o postigo, Padre Ducellier não enxergou ninguém. Era tão pequena, que a cabeça não alcançava o parapeito, onde se apoiam as mãos. Então mandou-me ficar de pé. Obedecendo imediatamente, levantei-me e postei-me bem na frente dele para o ver melhor. Fiz minha confissão, como se fosse uma menina grande, e recebi sua bênção com grande devoção, porque me havíeis explicado que, nesse momento, as lágrimas do Menino Jesus purificariam minha alma. Lembro-me de que a primeira exortação que me foi feita, incitava-me principalmente a ter devoção à Santíssima Virgem, e prometi a mim mesma redobrar minha ternura para com ela. Ao sair do confessionário estava tão contente e lépida, como jamais sentira tamanha alegria na alma. Depois, tornava a confessar-me em todas as grandes festas litúrgicas, e para mim era cada vez um verdadeiro gozo, quando o fazia.

Sta Teresinha de Lisieux, História de Uma Alma.

Teresinha e o seu pobre


Nos passeios que fazia com ele, papai gostava de me mandar entregar a esmola aos pobres que encontrássemos. Certo dia vimos um que se arrastava com dificuldade em muletas. Acerquei-me para lhe dar um óbolo. Mas, não se julgando bastante pobre a ponto de aceita a esmola, ele olhou-me com triste sorriso e não quis pegar o que lhe oferecia. Não consigo descrever o que se passou em meu coração. Quisera consolá-lo e reconfortá-lo. Em lugar disso, porém, julguei que o tinha magoado. O pobre doente adivinhou por certo meu pensamento, pois que o vi virar-se para trás e envolver-me num sorriso. Papai acabava de comprar um doce para mim. Bem me veio a vontade de lho dar, mas não tive coragem. Ainda assim, queria dar-lhe alguma coisa que não me pudesse refugar, pois sentia por ele uma simpatia muito grande. Ocorreu-me então ter ouvido falar que, no dia da primeira comunhão, a gente obteria tudo o que pedisse. Este pensamento foi um consolo para mim, e disse comigo mesma, embora só tivesse seis anos ainda: "Rezarei pelo meu pobre no dia da minha primeira comunhão". Cumpri a promessa cinco anos mais tarde, e espero que o Bom Deus tenha atendido a oração que me inspirara a fazer-lhe por um de seus membros sofredores...

Sta Teresinha de Lisieux, História de Uma Alma

domingo, 29 de julho de 2012

"Só no Céu haverá alegria sem anuviamento"


Bonitos para mim eram os dias em que meu "rei querido" me levava à pescaria consigo. Tinha tanto amor ao campo, às flores e às aves! Tentava às vezes pescar com minha varinha, mas de preferência ia sentar sozinha na relva florida. Meus pensamentos aprofundavam-se bastante e, sem saber o que era meditar, minha alma mergulhava em autêntica oração... Ouvia ruídos ao longe... O murmúrio do vento e até a música indecisa de soldados, cuja sonoridade me chegavam aos ouvidos, melancolizavam suavemente meu coração... A terra parecia-me lugar de degredo, e eu sonhava com o Céu... A tarde passava rápida, e dentro em pouco era hora de regressar aos Buissonnets. Antes de partir, porém, tomava o lanche trazido no meu cestinho. Mudara de aspecto, a linda merenda com geléia de fruta que me tínheis preparado. Em lugar da cor ativa, já não via senão uma ligeira mancha cor de rosa, toda ressequida e amarfanhada... Então a terra se me apresentava mais tristonha ainda, e compenetrava-me de que só no Céu haverá alegria sem anuviamento... 

 Sta Teresinha de Lisieux, História de Uma Alma

"Não quero ser santa pela metade"


"Mais tarde, quando se me tornou evidente o que era perfeição, compreendi que para se tornar santa era preciso sofrer muito, ir sempre atrás do mais perfeito e esquecer-se a si mesmo. Compreendi que na perfeição havia muitos graus e que cada alma era livre no responder às solicitações de Nosso Senhor, no fazer muito ou pouco por Ele, numa palavra, no escolher entre os sacrifícios que exige. Então, como nos dias de minha primeira infância, exclamei: "Meu Deus, escolho tudo". Não quero ser santa pela metade. Não me faz medo sofrer por vós, a única coisa que me dá receio é a de ficar com minha vontade. Tomai-a vós, pois "escolho tudo" o que vós quiserdes" 

 Sta Teresinha de Lisieux, História de Uma Alma

quarta-feira, 25 de julho de 2012

À santidade se vai pela kenosis


"Já não vivo eu, mas é Cristo que vive em mim", escreve S. Paulo, mostrando que o cristianismo é um caminho de negação do eu para que apareça verdadeiramente quem nós somos. Esta verdade sobre nós dorme sob a capa densa dos nossos desejos e medos. É necessário, pois, negar este eu superficial a partir do qual a imensa maioria de nós age. É preciso fazer a experiência da "kenonis", do rebaixamento que o próprio Cristo fez, a fim de que se manifeste quem nós somos, manifestação pela qual a terra inteira geme em dores de parto.

É esta a proposta de Jesus: "quem quiser me seguir, negue-se". Ainda ontem, eu lia das revelações de Jesus a Sta Brígida: "somente irá entrar no céu os que se humilham e se mortificam". E o que são a humilhação e a mortificação senão o rebaixamento da alma e do corpo, respectivamente? Este falso eu que todos trazemos, altivo e inconstante, não é quem de fato nós somos. Ou descobrimos a nossa verdadeira identidade - e para isso, é preciso procurar em Deus - ou morreremos e nos daremos conta da grande mentira que fomos e que estaremos - Deus nos livre - condenados a estender pela eternidade.

Se a via da conversão é mesmo uma via de negação do próprio eu, pouquíssima gente faz progressos no mundo. Antes, se poderia dizer que o cristianismo, como é pregado nos moldes atuais pela maioria, se encontra precisamente no rumo oposto, isto é: o da promoção do próprio ego. Não à toa Jesus diz que são pouquíssimos os que encontram o Caminho.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Saudade não tem tradução


Há uma música bastante conhecida, da banda Rosa de Saron, que diz que "saudade não tem tradução". Eu sempre apreciei a frase.. De fato, segundo se diz, o termo "saudades" parece não ter um equivalente exato em outras línguas... É diferente, por exemplo, do "missing" inglês. Alguns dizem que isto é mito, e que há sim... Eu não conheço todas as línguas, pelo que não posso afirmá-lo nem negá-lo. Mas, obviamente, a expressão da música não se restringe a estas questões idiomáticas. Há um significado muito mais profundo e que se refere à inexpressibilidade daquilo que se sente. A carga semântica do termo "saudade" ainda não alcança o realismo do que se experiencia... Por isso, eu sempre gostei da frase.

Dias atrás, porém, eu tive uma fortíssima evidência disto. "Saudade não tem tradução"... Sim, de fato, eu vi, eu constatei que não tem... não tem... Por mais que se diga, nunca se diz inequivocamente aquilo que se passa na alma. Penso que é disto que S. João da Cruz fala quando escreve que uma coisa é a notícia - isto é, a palavra - e outra é a substância - a realidade que a palavra pretendeu evocar. O amor é, de fato, de uma ordem transcendente.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Reencontrar o tesouro

Quem for estudar as origens do Cristianismo, verá que a natureza dele é totalmente distinta do discurso romântico moderno. Abandonou-se a ênfase metafísica e erigiu-se em seu lugar o reino do subjetivismo. O cristianismo em muitos lugares está irreconhecível. Não à toa os cristãos ortodoxos se divertem com os católicos romanos modernos... A nossa perda do senso legitimamente espiritual tem sido motivo de chacota, desperdício de tempo e esterilidade espiritual. Reencontremos o tesouro escondido.. ele é muito diferente dessa bijuteria que temos ostentado com vão orgulho nestes dias. Enquanto vivermos no campo dos sentimentos e das sensações, não daremos com O caminho, pois estaremos restritos a nós mesmos, ocupados com nossa miséria...

O que a mística não é...


Se, hoje em dia, em pleno século XXI, era da ciência e herdeira dos ideais iluministas, alguém ainda assim quiser ser um espiritual, como é que faz? É só querer? É nada... Queira o quanto possa, a coisa não vai só assim.. "Ah, mas eu escuto o Pe. Fábio de Melo e leio os livros do Augusto Cury.. não é suficiente?" Quê?! É mais fácil se tornar um espiritual assistindo anime japonês do que por aí...

Interessante que, hoje em dia, esse é o tipo de afirmação que causa revolta nalguns pretensos elevados. Esse é o tempo em que nada pode ser dito com clareza; tudo tem de fazer parte de uma sopa de ingredientes indefinidos.. é suficiente que cheire bem. A sensibilidade foi elevada ao critério de verdade. No mundo moderno, há um grande repúdio pela clareza. Uma coisa clara é uma coisa definida, isto é, é algo que é de um modo e não é de outro. Portanto, não convém fazer afirmações claras, porque isto fere susceptibilidades alheias. Ser bom, hoje, é respeitar todas as idéias, correntes, ideologias, etc, etc. Quem pensa assim, vive numa espécie de contínua ebriedade; ela não tem noção clara de nada; apenas tem idéias nubladas, fragmentadas e erige sempre como critério a própria simpatia. Foi simpático a uma idéia? A idéia é boa. A idéia não agradou? É ruim. São incapazes de fazer a pergunta: mas porque tal coisa me causa simpatia ou antipatia? E o bêbado vai caminhando, escutando Pe. Fábio de Melo e lendo Augusto Cury, projetando um deus da sua simpatia, dormindo no conforto das próprias suposições e vendo com maus olhos qualquer um que ouse definir bem as coisas, separando a luz das trevas. 

Nós vivemos num tempo humanista. Os maiores valores são aqueles que promovem o bem estar. Estar em paz com Deus virou sinônimo de estar tranquilo e agradável. Misteriosamente, se crê que Deus obedece real e servilmente os movimentos inconstantes da alma. Oh que sacro e inconcusso vínculo este da alma com Deus que a permite reconhecer imediatamente em si a atual disposição divina para consigo.. E como o sabe? O sabe pela sensibilidade.. está a se sentir bem, foi à Missa e se sentiu tocada... que maior garantia de que Deus a observa do alto com um sorriso largo no rosto e quase que se segura para não dizer-lhe: "eis o meu filho bem amado..."?

Religião serve para quê? "Ora, é para promover o bem estar!", dizem.. C.S. Lewis diz que uma garrafa de cachaça cumpriria melhor esse papel. Não à toa ela tem se convertido num novo ídolo. Mas, se é o bem estar o valor supremo, então vamos fazer uma religião à nossa imagem e semelhança, à altura do homem; importa que seja criação nossa, um novo bezerro de ouro, e o chamaremos de Deus, ou de Jesus, ou do que quer que seja. Apenas não aceitaremos que alguém de fora nos ensine; não aceitaremos aprender; não aceitaremos que as coisas já sejam de antemão... Não aceitaremos que alguma pretensa deidade venha nos dizer "Eu sou", porque, na verdade, "nós é que somos". Partimos do pressuposto de que, desde sempre, nós conhecemos a natureza deste negócio e ele é assim como dizemos que é. Se alguém não se sente bem, a gente adapta.. Toca aquela música lá.. põe essa ênfase aqui.. diz aquela frasesinha tola e clichê que provoca arrepios.. diz que ele vai ser acolhido no céu de todo jeito... Penitência? Mortificação? Ora, deixemos de medievalidades.. Naqueles tempos obscuros, o povo aceitava uma religião pretensamente ensinada pelo próprio Deus. Hoje, em pleno século XXI, a gente sabe que não é bem assim. Tudo é simbólico e, em última instância, somos nós que interpretamos os símbolos. 

Já não se observa mais que a verdade existe e é objetiva. Não se observa mais que o bem existe e é objetivo. Tudo pode ser distorcido, puxado de um lado, estendido de outro, segundo a divindade do nosso próprio conforto. Um Deus numa cruz? Que coisa medonha! Tira daí.. Põe a cruz vazia, ou então, põe Ele sem a cruz... Cruz pra quê? Importa que a gente se ame...

E o amor fica raso... e ninguém sabe exatamente o que é o amor.. E as pessoas acreditam que amar é dissimular, ter respeitos humanos, onde a regra suprema é não incomodar o outro. Tornam-se cúmplices silenciosos de crimes e pecados mútuos, e se sorriem, e se vão empurrando e crendo que, pelo fato de não haver atrito, estão a atingir o sumo grau da caridade.

Ai, Deus.. Quem ensinou o homem a ser tão tolo? Nada disso é mística. Nada disso é caridade. Nada disso é espiritualidade. Nada disso é cristianismo... Não vai nem perto. Não avista nem de longe.

Em qualquer lugar em que, na terra, houver alguém confortável, pode-se acreditar que o cristianismo ali não foi aceito. Como dizia Gustavo Corção, "é terrível a seriedade do cristianismo". 

O humanismo é tolo, é fragmentário, é falso, é satânico: "sereis como deuses". O homem só encontra a sua dignidade quando se abre à severa objetividade daquele Outro. Enquanto não O aceita tal qual é, prosseguirá na sua brincadeira medíocre de se auto-projetar, só mais um jeito confortável de acreditar ser, ele mesmo, seu próprio deus. A serpente do Éden é a verdadeira rainha deste mundo... e um dos seus maiores divertimentos é compor discursos pseudo-católicos. Mas como dizia Nosso Senhor: "quem tiver olhos, que veja!", pois eu não vos fiz cegos. 

terça-feira, 17 de julho de 2012

Hildegard Von Bingen



Sintomas de saudade...


Depois de passar um pouco de tempo com bons amigos, eles foram... e eu fiquei. Acostumado que sou a desapegar-me, desta vez, porém, a ausência se impôs e o coração reclamou. Muito boa a amizade. E isto é o que me falta. Os amigos, os tenho, mas vão distantes.. os de perto, são pouquinhos. Posso, porém, dizer que, na saudade que sinto, há como um vislumbre do Céu. Que esta falta se converta em força, pois é preciso lutar pela bem-aventurança. Lá, enfim, será o grande encontro de verdadeiros amigos. Integrados todos, saber-se-á o que é ser família - até aqui, não o sei. A esperança do céu é o único ânimo da vida. Que não se pense ser isso pouca coisa. Benditos os amigos que me trazem notícias da eternidade, mesmo que, por ora, elas venham pintadas de dor e de vazio. Sinto-lhes tremendamente o vácuo. Amo os meus amigos... os poucos que tenho.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Senhor, tende piedade de mim...



Senhor, tende piedade de mim!... sofro, sim..., mas quisera que meu sofrimento não fosse tão egoísta; quisera, Senhor, sofrer por tuas dores na Cruz, pelos olvidos dos homens, pelos pecados próprios e alheios..., por tudo, meu Deus, menos por mim."

S. Rafael Arnaiz Barón

quarta-feira, 11 de julho de 2012

A falsidade do orgulho


Um homem que presume ser muito importante tentará ser multiforme, buscará uma excelência aparatosa em todos os pormenores, tentará ser uma enciclopédia de cultura, e sua verdadeira personalidade será perdida num falso universalismo. Pensar ser muito importante o levará a tentar ser o universo; a tentativa de ser o universo o levará a deixar de ser. Suponhamos que, por outro lado, um homem seja sensível o bastante para pensar sobre o universo, ele o pensará em termos individuais. Manterá intocado o segredo de Deus; verá a grama como nenhum outro homem conseguirá vê-la, e olhará para o sol como nenhum homem jamais olhou.

G. K. Chesterton, Hereges.

domingo, 8 de julho de 2012

Tesouro, de novo...


A Sagrada Escritura nos diz que encontrar um amigo é encontrar um tesouro. Como poderíamos, então, definir a alegria de reencontrar este amigo? 

Neste dia de hoje, estou felicíssimo porque reencontrei uma pessoa muito querida por mim. Não sei se convém dizer-lhe o nome, mas é suficiente dar a saber que é uma grande amiga, alguém por quem aprendi a ter  bastante carinho. Agradeço a Deus por esta alegria. E que ela seja muito bem vinda, de novo! ^^

Deus a abençoe.

sábado, 30 de junho de 2012

Aprenda a rezar, rezando.


Pergunta: Se o senhor pudesse e quisesse dar às pessoas um breve conselho sobre como rezar, o que o senhor diria?

Resposta: Se você quiser aprender a nadar, pule na piscina. Esta é a única maneira. Só quem reza descobre o significado, o gosto e a alegria de rezar. Não dá para aprender a rezar sentado numa poltrona macia. Quando estiver pronto para se ajoelhar, para se arrepender com sinceridade, para levantar os olhos e aos mãos para o Céu, então muitas coisas lhe serão reveladas. Você até pode ler livros, ouvir palestras, conversar -- estas coisas também são importantes e ajudam a entender melhor a questão. Mas de que valem essas coisas se você não der o primeiro passo? Se você não começar a rezar?

Pe. Gabriel Bunge

quarta-feira, 20 de junho de 2012

"Vou me casar com uma noiva tão nobre e tão bonita como vocês nunca vão ver"


"Certo dia, tendo invocado mais completamente a misericórdia divina, mostrou-lhe o Senhor o que convinha fazer. A partir de então ficou tão cheio de alegria, que não cabia mais em si e, mesmo sem querer, deixou escapar alguma coisa aos ouvidos dos outros. Mas embora não pudesse calar por causa da grandeza do amor que lhe fora inspirado, era com cautela que comunicava alguma coisa, e falando em parábolas. Assim como falara ao amigo íntimo de um tesouro escondido, como dissemos, aos outros procurava falar por analogias. Dizia que não queria ir à Apúlia, mas prometia que haveria de fazer coisas nobres e estupendas em sua própria terra. Pensavam os outros que queria casar-se e lhe perguntavam: "Por acaso, você vai se casar, Francisco?" Respondia-lhes: "Vou me casar com uma noiva tão nobre e tão bonita como vocês nunca vão ver, que ganha das outras em beleza e supera a todas em sabedoria." Na verdade, a esposa imaculada do Senhor era a verdadeira religião, que ele abraçara, e o tesouro escondido era o reino dos céus, que buscou com tanto entusiasmo."

Tomás de Celano, Primeira Vida de São Francisco

domingo, 17 de junho de 2012

Recomendando um texto do Pe. Castellani


Passando rapidamente pare recomendar um excelente texto do grande Pe. Leonardo Castellani. Para lê-lo, clique aqui.

sábado, 16 de junho de 2012

Mil graças...


Mil graças, meu Senhor, por Tu me teres criado
Por teu amor, nasci, e vim sob teus cuidados.
Senhor, tu me livraste de uns tão nefandos laços
E, enfim, cheguei aqui, com o meu tão tímido passo.

A graça da existência é um dom de vosso amor
É pura gratuidade que Tu dás porque és bom.
Ninguém mereceu tal, pois o mérito não há
Num ser, antes de ser, e o ser és Tu Quem dás.

Oh Deus, quem saberá ser-vos grato o suficiente?
E eu: que posso dar que não seja ruim e doente?
Me dotaste, oh Sumo Bem, de uma alma imortal
Eu, porém, somente sei vos pagar com tanto mal.

Tu vieste, ainda, a Mim e subiste no Madeiro
As minhas tolas desculpas, Tu rasgaste com teu peito
E, de novo, tu me deste, sem eu nunca merecer
Uma tão pujante vida, a preço do teu sofrer.

Eis-me, pois, aqui, Senhor, com as minhas mãos vazias
Nu, sujo e sem graça, portando somente a vida
Culpado de tantos crimes, ingrato com vossa dor
Mas ouso seguir teus passos, constrangido em tanto amor.

Neste dia, nada tenho a vos dar ou a pedir
Quero, só, erguer os olhos; ver que o céu não é aqui.
Não faz mal que o meu sorriso seja, por ora, adiado
E mil graças, meu Senhor, por Tu teres me criado.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Sou o que sou diante de Deus, e nada mais


A sinceridade é o ato pelo qual me coloco a mim mesmo sob o olhar de Deus. Não há sinceridade de outro modo. Pois somente para Deus não há mais espetáculo, não há mais aparência. Ele próprio é a pura presença de tudo o que é. Quando me volto para ele, nada mais conta em mim, a não ser o que eu sou. 

Pois Deus não é apenas o olho sempre aberto ao qual nada posso dissimular do que sei de mim mesmo, ele é a luz que atravessa as trevas e que me revela tal como sou, sem que eu soubesse que era. O amor próprio que me ocultava de mim mesmo é uma roupa que cai de repente. Um outro amor me envolve, tornando minha alma transparente.

Enquanto a vida persiste em nós, conservamos ainda a esperança de mudar o que somos ou de dissimulá-lo. Mas quando nossa vida é ameaçada ou está perto de acabar, somente o que somos importa. Só diante da morte somos perfeitamente sinceros, porque a morte é irrevogável e dá à nossa existência, completando-a, o caráter do absoluto. É o que exprimimos ao imaginar o olhar de um juiz a quem nada escapa e que, logo após a morte, vê a verdade da nossa alma até nos seus meandros mais remotos. E o que significa esse olhar senão a impossibilidade em que estamos de acrescentarmos algo ao que fizemos, de nos evadirmos num novo futuro, de distinguirmos ainda nosso ser real do nosso ser manifesto e, no momento em que a vontade se torna impotente, de não abarcarmos num ato de contemplação pura esse ser agora realizado, ele que até então era apenas um esboço sempre sujeito a retoques?

Não basta à sinceridade evocar a Deus como testemunha, ela deve evocá-lo também como modelo. Pois a sinceridade não é somente ver-se em sua luz, mas realizar-se conforme sua vontade. Que sou eu, senão o que ele me pede para ser? Mas uma distância infinita logo se revela a mim entre o que faço e esse poder que está em mim e que meu único desejo é exercer: é que não cesso de faltar a ele e, na medida mesma em que falto, não sou mais para mim e para outrem senão uma aparência que um sopro dissipa e que a morte abolirá.

Tal é o verdadeiro sentido que devemos dar a estas palavras: "Todo aquele, portanto, que se declarar por mim diante dos homens, também eu me declararei por ele diante de meu Pai que está nos Céus. Aquele, porém, que me renegar diante dos homens, também o renegarei diante de meu Pai que está nos Céus" (Mt 10,32-33).

Louis Lavelle