quinta-feira, 28 de abril de 2011

Paulo viu o Nada


Paulo levantou-se do chão e com os olhos plenamente abertos nada viu.

Na minha opinião, esse texto tem quatro sentidos: O primeiro é que, ao levantar do chão com os olhos abertos viu o "nada", e o "nada" era Deus. O segundo: ao se levantar, nada viu além de Deus. Terceiro, em todas as coisas nada mais viu além de Deus. No quarto, quando viu Deus viu todas as coisas como "nada". Esta frase "quando Paulo se levantou do chão com os olhos plenamente abertos nada viu" corresponde à experiência de São Paulo quando ia para Damasco.

A luz que Deus é brilha no escuro. Deus é que é a verdadeira luz. Para ver isso a pessoa deve estar cega e deve tirar para fora de Deus tudo o que é algo. Um mestre diz que aquele que falar de Deus através de qualquer semelhança, fala de modo simplório Dele. Mas falar de Deus através do 'nada'; é falar Dele corretamente. Quando a alma unificada entra na total auto-abnegação, encontra Deus como um Nada.

Mestre Eckhart

domingo, 24 de abril de 2011

Ressuscitou! Que alegria!


Enfim, chega o Domingo. As mulheres, ainda pesarosas, levantam-se cedo e rumam para o sepulcro onde, dias atrás, tinham sepultado Jesus. Além dos cuidados comuns aos judeus com os corpos dos defuntos, talvez o fato de se aproximarem do corpo d'Ele mais uma vez como que pudesse, quem sabe, estender um pouco aquela primavera que tinham vivido junto àquele terno nazareno.

Mas a saudade era tamanha que sequer notaram que aquele não era simplesmente um novo dia, mas o primeiro dia de uma nova criação. A dor de seus corações lhes impedia de notar que, naquela manhã, toda a terra como que respirava outros ares, como se invadida por um sopro de vida, à semelhança de uma criança perdida que vê, de repente, atrás de si a presença tão conhecida e única do seu pai.

E lá foram elas. De repente, viram o túmulo vazio e a pesada pedra movida da entrada. Roubaram o Seu corpo? Mas quem poderia ter feito isto? Suposições meramente humanas e de horizonte estreito. Dois seres celestiais, presentes à cena, anunciam com grande alegria a novidade: "por que procurais entre os mortos Aquele que vive? Ele não está aqui... ressuscitou como havia dito!"

E, então, se fez dia também naquelas almas...

A alegria de sabê-Lo vivo? Como poderei descrever? Não posso...

Viram-No depois. Nada era mentira... Tudo quanto Ele tinha falado era a mais pura e concreta verdade. Que alegria! Que alegria! Que alegria! Só posso dizer que aquela alegria era ainda prelúdio de uma vindoura. "E ninguém vos tirará a vossa alegria!" Ah... que nobre esperança! E esta é a alegria de um amor real: o amor dAquele que crucificaram e que agora vive!

Bendito seja Deus! Bendita seja a Cruz pela qual fomos reconciliados com Deus! Ó mistério dos mistérios! Ó alegria verdadeira! Mil graças sejam dadas a Nosso Senhor!

"Eis que estareis convosco até o fim dos tempos..."

Ahhh...

Dizia S. Francisco de Assis: o cristão é aquele que não consegue esconder a alegria por ter descoberto tão precioso tesouro...

Que assim seja.

sábado, 23 de abril de 2011

Tempo da ausência


Certa vez, ouvi dizer que a grande inspiração da Teologia Apofática é este curto período entre a morte do Senhor e a sua ressurreição. O período da ausência. Neste momento, a saudade do ser amado se faz mais pungente, mais sofrida. A ausência é muito sentida e o amor alcança vôos muito altos. De fato, esta é a lógica da teologia negativa.

Meditando um pouco neste mistério, lembrei-me do episódio ocorrido com a Sagrada Família quando Jesus tinha seus doze anos. Em visita ao templo, seus pais se perderam dele e passaram a procurá-lo incessantemente durante três dias. Esta experiência consta como uma das dores de Nossa Senhora e, de fato, como deve ter sido aflitiva esta ausência!

Numa de suas reflexões sobre este fato, Sua Santidade Bento XVI comenta que talvez os pais de Jesus é que tenham se sentido perdidos. Jesus é quem dava alegria ao ambiente; com Ele, tudo era diferente. E agora, porém, Ele não estava. Depois de três dias, O reencontraram e quão grande deve ter sido o alívio!

Agora, porém, Jesus morreu. Humanamente, não é possível esperar que, após três dias, O houvessem de reencontrar. A cena da crucifixão, com toda a sua crueldade, não os deixa ter esperanças aparentemente ingênuas. Viram-no morrer; estavam lá. Que dor a da ausência! E os apóstolos? Depois de três anos tão intensos, como não ficaram? Como era dolorido relembrar as ocasiões felizes com Jesus; o simples conforto que a Sua presença trazia. E João? Há dois dias atrás, estava reclinado sobre o coração do mestre e agora, talvez relembre com tristeza as palavras de Jesus, já que também o discípulo amado já não tem onde reclinar a cabeça.

A mística de trevas é a mística da ausência. É onde a presença do Amado é mais que tudo desejada, é onde se inflama de vez o pequeno coração humano e se transforma como numa pura labareda. É quando a alma não se consola com mais nada, a não ser, como diz S. João da Cruz, com a Presença e com a Figura do ser amado. 

Neste sofrimento, muitas imperfeições da alma se extinguem à semelhança da ferrugem consumida pelo fogo, tornando o ferro incandescente. E é precisamente aí que os Apóstolos se prepararão para revê-Lo.

Maria, a mulher forte, tem agora o seu coração perfurado, trespassado, como o dissera, anos atrás, Simeão.
No entanto, ela nunca duvidou...

Fábio.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Humildade e Inteligência

Filósofo Diógenes com sua lamparina procurando um homem de verdade.

Humildade é para os inteligentes.

Ora, se a humildade é a verdade, e a verdade é objeto do intelecto, então há uma clara ligação entre verdade e intelecto; ligação que, mesmo estando tão clara, inclusive no que constantemente escrevo sobre o assunto, veio me saltar aos olhos hoje, enquanto eu lia uma página do Thomas Merton. E que descoberta! Foi-me suficiente.

A humildade é inteligente; para ser humildes, devemos usar a inteligência. Vou transcrever exatamente o que li:

"De fato a feliz cooperação de nossa alma às graças infusas depende duma passividade que é sumamente humilde por ser inteligente. Afinal, se humildade é verdade, ela pressupõe uma inteligência sobrenaturalmente iluminada." (Thomas Merton, Sementes de Contemplação, grifos originais)

Pronto. Fiz a descoberta do dia! 

De hoje em diante, quando virmos alguém soberbo, seja um mestre ou doutor, apontemos divertidamente o indicador pra ele e digamos: "que burro!"

Fábio.

sábado, 9 de abril de 2011

Mais sobre amor e pobreza


Amor e pobreza, como eu digo vez ou outra, são como as duas hastes da Cruz. Essa é uma afirmação sem qualquer preocupação de exatidão teológica, por favor.. rs A identificação das duas virtudes com as hastes da cruz é, claro, arbitrária. Mas a Cruz é, sim, a perfeição, tanto do amor, quanto da pobreza.

Ora, se a cruz é o caminho do cristão, é a sua insígnia muito querida e, como diz a Igreja, é a única esperança, convém, então, aprender algo do que seja isso. Quero, como sempre, enfatizar então estas duas virtudes. Já falei bastante delas, mas pretendo agora, quem sabe, pôr novas luzes nisso aí. rs

Vou seguindo um estilo bem informal.
Nós sabemos que, dentre todas as virtudes, o amor ou a caridade, para usar o termo paulino, é a que tem predominância, é a mais importante. O amor é a própria substância divina. Deus é amor, escreve S. João. O homem, chamado a imitar a Deus, deve viver este amor que o configura à vida de Cristo.

O amor, então, é a consumação da vida cristã autêntica. Acontece, porém, que o amor não é qualquer coisa. Como a iniquidade costuma fazer imitações ou macaquices de tudo aquilo que é bom, o amor, sendo a essência da vida cristã, claramente iria ser objeto de desvirtuação. Daí os inúmeros falsos conceitos e falsas versões do amor. O sucesso das telenovelas se deve a isto, ao mesmo tempo em que elas reforçam esta onda de distorção dos valores cristãos. É bem como escrevia o Chesterton.

Na vida cristã, porém, não podemos ter o luxo de seguir um ideal subjetivo do que seja o amor. Até porque, tendo a Deus por origem, o amor não terá esta multiplicidade de natureza. Não, de forma alguma. Deus é um só e, portanto, o amor, embora possa ser manifestado de diversas formas (ágape, eros, filos), tem uma mesma natureza última. Isso aí pode ser discutido e melhor explicado, mas, por ora, passemos a questão.

Dizíamos que é preciso aderir ao modo correto do amor. É o que S. João da Cruz, recorrente nas minhas citações, diz: "aprende a amar como Deus quer ser amado, e deixa a tua condição". Deus, que é amor, quer ser amado de modo correto. Até chegarmos a este tipo de amor, será preciso renunciar bastante coisa, purificar o nosso conceito e a nossa prática. E este processo de aperfeiçoamento do amor é gradativo.

Vamos, então, ao caminho.

A pobreza, virtude muito alta e muito querida minha, é a que nos disponibiliza para amar corretamente e purifica a nossa visão. Eu já tratei disso aqui e expliquei como a pobreza nos dispõe para a contemplação, conforme Jesus mesmo disse: "Felizes os pobres porque verão a Deus".

Pois bem. Também a pobreza tem seus macacos. Há o pessoal da TL que tenta beatificar o marxismo e tende a identificar a pobreza da qual Jesus falou à simples condição de indigência social, o que não tem nada a ver. Se assim fosse, a miséria social deveria ser buscada como um bem. Mas isso não tem nada a ver.

Outro modo de perverter a pobreza cristã está na concepção errada do Mestre Eckhart. Ele parece pretender que esta virtude deve ser buscada como um fim em si mesmo. Em certos trechos, diz ele que até da presença de Deus a pessoa deve se esvaziar, ou algo semelhante. Isto é bastante equivocado. Esta visão se assemelha a um relato que li, de um biógrafo suspeito de S. Francisco de Assis, o Frei Ignácio Larrañaga, onde ele diz que, a determinada altura, S. Francisco, bastante cioso com a prática da pobreza na sua ordem, sofria demasiado porque os freis abandonavam este ideal. Indo, depois, ter com Clara, Francisco teria manifetado a ela o seu pesar, ao que Clara teria respondido algo assim: "Francisco, estás tão voltado para o ideal da pobreza, que não estás enxergando a única coisa! Que Deus é e que só há isso!" 

Seja ou não verdadeiro, o relato serve para elucidar o papel da pobreza como disponibilizadora para o amor. Ao redescobrir o abismo divino acima da própria virtude da pobreza, Francisco tinha redescoberto a verdadeira pobreza espiritual. Portanto, a visão de Eckhart desta virtude como um fim em si mesmo é equivocada.

Continuemos, então.

A pobreza corta os imperativos da soberba que são, basicamente, dois: busca do prazer e fuga da dor. A alma que obedece cegamente a estes princípios egoístas tem, por força, um horizonte muito estreito. Sua visão somente poderá ser alargada pela vivência da filosofia da cruz. A cruz é o avesso da soberba; por isto que ela é um instrumento de liberdade.

A pobreza, então, permite que nós persistamos num determinado projeto, mesmo que aquilo não nos dê um prazer sensível ou, até, seja, a princípio, um pouco desagradável. Além disto, ela também nos permite uma grande liberdade de negar aquilo que, não obstante nos desse prazer, constituísse algo ilícito. "Faz as coisas somente pela razão de fazê-las" escreveu o doutor da Igreja que citei acima, isto é, realiza os teus trabalhos independentemente do gosto que neles encontras.

Continuo depois.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

O filósofo para Sócrates


O texto que vai abaixo não tem nada de estritamente religioso. Mas, em se tratando de ser um livro de Platão, o Teeteto, em que, uma vez mais, ele retrata o seu mestre, Sócrates, a discutir com alguns presentes, não se podia esperar mediocridade nas discussões. Muito embora, em alguns pontos do que aqui transcrevo, seja fácil encontrar críticos - entre os quais, eu também-, o texto traz uma descrição muito interessante da consagração que é pedida ao filósofo. Aproveitemos.

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Sócrates - De início, devemos observar acerca dos primeiros (os filósofos) que desde a mocidade o que mais do que tudo ignoram é o caminho da ágora ou onde fica o tribunal, a sala de conselho e quejandos, locais de reuniões públicas; não ouvem nem vêem as leis nem as decisões escritas ou faladas. As disputas dos cargos públicos nas hetéreas, as reuniões e os festins, os banquetes animados por tocadores de flautas: nem em sonhos lhes ocorre comparecer a nada disso. Nasceu na cidade alguém de nobre ou baixa estirpe? Certo cidadão herdou tara de seus antepassados, homens ou mulheres? É o que o filósofo conhece tão pouco, como se diz, como se diz, como quanta areia há no mar. Nem chega mesmo a saber que não sabe nada disso. Porém não se alheia dessas coisas por vanglória, mas porque realmente só de corpo está presente na cidade em que habita, enquanto o pensamento, considerando inane e sem valor todas as coisas merecedoras apenas de desdém, paira por cima de tudo, como diz Píndaro, sondando os abismos da terra e medindo a sua superfície, contemplando os astros para além do céu, a perscrutar a natureza em universal e a cada ser em sua totalidade, sem jamais descer a ocupar-se com o que se passa ao seu lado.

Teodoro - Que queres dizer com isso, Sócrates?

Sócrates - Foi o caso de Tales, Teodoro, quando observava os astros; porque olhava para o céu, caiu num poço. Contam que uma decidida e espirituosa rapariga da Trácia zombou dele, com dizer-lhe que ele procurava conhecer o que se passava no céu mas não via o que estava junto dos próprios pés. Essa pilhéria se aplica a todos os que vivem para a filosofia. Realmente, um indivíduo assim alheia-se por completo até dos vizinhos mais chegados e desconhece não somente o que eles fazem como até mesmo se se trata de homens ou de criaturas de espécie diferente. Mas o que seja o homem e o que, por natureza, lhe cumpre fazer ou suportar, para distingui-lo dos outros seres, eis o que ele procura conhecer, sem se poupar a esforços em sua investigação. Compreendes-me, Teorodo, ou não?

Teodoro - Compreendo; é muito verdadeiro tudo isso.

Sócrates - Eis a razão, amigo, como disse no começo, de em todas as circunstâncias, assim na vida pública como no trato particular com seus cidadãos, no tribunal ou alhures, sempre que nosso filósofo é forçado a tratar de assuntos que lhe caem sob a vista ou diante dos pés, torna-se alvo de galhofa não apenas por parte das raparigas da Trácia como de todo o povo, levando-o sua falta de experiência a cair nos poçose na mais triste confusão. Sua irremediável inabilidade para as coisas práticas fá-lo passar por imbecil. Num revide de injúrias não sabe como atacar o adversário, por desconhecer os vícios dos homens, já que nunca se preocupou com a vida de ninguém. E por não saber como sair-se de tais enrascadas, faz papel mais que ridículo.

Por outro lado, quando se trata de elogios e de enaltecerem uns aos outros com termos tão pomposos, não procura esconder o riso; estoura em gargalhadas sem nenhum constrangimento, o que o faz parecer tolo. Quando ouve o encômio de qualquer tirano ou potentado, imagina que se trata de um elogio de um pastor: porqueiro, cabreiro ou vaqueiro, por ser abundante a sua ordenha. É de opinião, aliás, que os reis guardam e ordenham um rebanho muito mais insidioso e intratável do que os dos verdadeiros pastores, e que por falta de vagar acabam ficando tão rústicos e ignorantes como aqueles e tão cercados por seus muros como os verdadeiros pastores pelos currais das montanhas. 

Quando ouve dizer que tal indivíduo é dono de dez mil plectros de terra, ou até de mais, como se se tratasse de uma grande propriedade, julga que lhe falam de coisinhas sem valor, acostumado, como está, a contemplar a terra inteira. Ao ouvir gabarem títulos de nobreza, por poder alguém mencionar sete antepassados ricos, considera absolutamente fútil tal elogio e revelador de curteza de vista por parte dos que falam, os quais, por ignorância, são incapazes de apreender o todo e de calcular que não há quem não tenha miríades sem conta de avós e antepassados, entre os quais se sucedem ricos e pobres, também por miríades, potentados e escravos, Helenos e bárbaros, indiscriminadamente, nesta ou naquela geração. Enumerar como grande coisa vinte e cinco antepassados ou dizer-se originário de Héracles, filho de Anfitrião, é para ele uma contagem ínfima. O vigésimo quinto antepassado foi quem a sorte quis, sem falarmos no quinquagésimo avô desse vigésimo quinto, divertindo-se o filósofo com a incapacidade de toda essa gente para contar e para purgar a mente de tanta fatuidade. Em tais situações, o filósofo é ridicularizado pela plebe, que ora o considera desdenhoso, ora desconhecedor do que lhe está na frente dos pés e a quem as menores coisas causam inextricável confusão.

Platão, Teeteto

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Aí vão algumas gravações.

Aí vão algumas músicas que pus na net. A qualidade não é boa, sobretudo de algumas que gravei pelo celular.. rsrs. Mas dá pra escutar.

Seguem os links

Deixar-me consumir de amor: http://mp3twit.com/9mI
Oração de Cristo musicada: http://mp3twit.com/9mK
Onde é que te escondeste?: http://mp3twit.com/9mL
Tesouro escondido: http://mp3twit.com/9mR

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Sobre as músicas

Bom.. Dei uma retirada das músicas. rsrs
Logo em breve, farei umas gravações mais atuais em que a coisa esteja um pouco mais legal, e disponibilizo. rs

Por falar nisso, disponibilizo logo logo uma das músicas do Musical da Paixão que encenamos em 2010. Abraço.