terça-feira, 28 de junho de 2011

Importantes conselhos para os que iniciam a vida espiritual

Nestas férias, um dos livros que me propus a ler direito foi o "Castelo Interior ou Sete Moradas" da Santa que é Doutora da Igreja e Mestra de Oração, Teresa D'ávila. É assunto que me interessa sobremaneira. Portanto, ficarei pondo certas transcrições do livro neste espaço que é mais pessoal e mais íntimo que o blog do Anjos. Os que quiserem ficar acompanhando, sintam-se à vontade. Santa Leitura.

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Discorrendo sobre a grande conveniência que é adentrar neste castelo e, uma fez feito, ir rumando às moradas mais interiores, vencendo as seduções do inimigo que tenta distrair a alma com as aparências de bem dispersas no mundo e em seus atrativos, Sta Teresa segue:

"Ah! Senhor meu!, aqui é mister a Vossa ajuda, pois, sem ela, não se pode fazer nada. Por Vossa misericórdia não consintais que esta alma seja enganada para deixar o que começou. Dai-lhe luz para ver como está nisto todo o seu bem e para se apartar das más companhias. Grandíssima coisa é tratar com os que tratam disto e achegar-se, não só aos que vier nestes aposentos em que está, mas também aos que entender que já entraram nos mais interiores; porque lhe será grande ajuda, e tanto poderá conversar com estes, que ali a metam consigo. Esteja sempre de sobreaviso para não se deixar vencer; porque, se o demônio a vê com uma grande determinação de que, antes perderá a vida, o descanso e tudo o que ele lhe oferece, do que voltar ao primeiro aposento, muito mais depressa a deixará. Seja varão e não dos que se deitavam a beber de bruços, quando iam para a batalha, não me lembro com quem, mas determine-se: vai pelejar com todos os demônios e não há melhores armas do que as da Cruz.

Ainda que de outras vezes tenha dito isto, importa tanto, que o torno a dizer aqui; é que não se lembre que há regalos nisto que principia, porque é maneira muito baixa de começar a construir tão precioso e grande edifício; e, se começam sobre areia, darão com tudo em terra; nunca deixarão de andar desgostosos e tentados. Porque não são estas moradas onde chove o maná; estão mais adiante, onde tudo sabe ao que uma alma quer, porque não quer senão o que Deus quer. É coisa muito engraçada que ainda estejamos com mil embaraços e imperfeições e as virtudes que ainda não sabem andar, pois só há pouco começaram a nascer, e mesmo praza a Deus que estejam começadas; e não temos vergonha de querer gostos na oração e de nos queixarmos de aridez? Nunca isto vos aconteça, irmãs; abraçai-vos com a cruz que vosso Esposo tomou sobre Si e entendei que esta deve ser a vossa empresa.

Sta Teresa D'Avila, Castelo Interior

É preciso sair da miséria da nossa terra e pôr os olhos em Cristo


"Assim como dizíamos dos que estão em pecado mortal quão negras e de mau odor são seus cursos de água, assim aqui (ainda que não são como aqueles, Deus nos livre, que isto é só comparação), metidos sempre na miséria da nossa terra, nunca o curso sairá do lodo de temores, de pusilanimidade e covardia: de olhar a se me olham, se me não olham; se indo por este caminho, me sucederá mal; se ousarei começar aquela obra, se será soberba; se é bom que uma pessoa tão miserável trate de coisa tão alta como a oração; se me hão-de ter por melhor não indo pelo caminho de toda a gente; que não são bons os extremos, mesmo em virtude; que, como sou tão pecadora, será cair de mais alto; não irei talvez por diante e farei dano aos bons; uma como eu não precisa de singularidades.

Oh! Valha-me Deus, filhas, quantas almas deve o demônio ter feito perder por este meio! Tudo isto lhes parece humildade e outras muitas coisas que pudera dizer, vem de nunca acabarmos de nos entender; rende-se o próprio conhecimento, e, se nunca saímos de nós mesmos, não me espanto, que isto e mais se possa temer. Por isso digo, filhas, que ponhamos os olhos em Cristo, nosso Bem, e ali aprenderemos a verdadeira humildade, e em seus santos, e enobrecer-se-á o entendimento - como disse -, e não ficará o próprio conhecimento rasteiro e covarde. (...) Terríveis são os ardis e manhas do demônio para que as almas não se conheçam a si mesmas nem entendam Seus caminhos.

Sta Teresa D'Avila, Castelo Interior

domingo, 26 de junho de 2011

Se os outros são outros, deixemos de pantim

Na postagem anterior, eu afirmava que é muito frequente que nós tentemos enquadrar os outros - sejam as demais pessoas, seja Deus - dentro dos nossos critérios e previsões. Como somos naturalmente inclinados ao egoísmo, agrada-nos a idéia de saber de ante-mão tudo o que pode acontecer e o que não pode. Fazemos esforço para isso, nos angustiamos quanto a isso. Enfim, não aceitamos direito que algo nos escape e fuja às nossas antecipações. Mas, como eu também dizia, esses outros se recusam a reconhecer esse nosso poder ou essa nossa majestade que os ordena gravitar em torno de nós. E eles se negam simplesmente não somente porque não partilham dos nossos critérios, mas porque não partilham das nossas ilusões.

Acontece que como essas coisas são, em geral, frutos do nosso egoísmo, a própria consideração dos fatos se torna afetada. Ficamos a estudar as possibilidades de extrair prazer e de evitar a dor, que é o que qualquer sujeito medíocre faz. Para isso, tratamos os outros como objetos de auto-satisfação. Muitos há que agem assim enquanto rezam.

Quando nos damos conta que justamente pelo fato de serem outros, eles nos extrapolam e podem agir de modo totalmente independente de nós, brincando com as nossas previsões, e mais: que eles têm o direito de fazê-lo, então podemos adquirir o importante hábito de duvidar das próprias suposições e sair dos seus estreitos limites. O mundo é muito mais amplo, e a vida é muito mais complexa no bom sentido, o que significa, de algum modo, dizer que é mais simples do que os complicados cálculos que costumamos fazer.

Se o sabemos, deixamos de fazer essas exigências, deixamos de esperar certas respostas prontas, deixamos as coisas serem o que são, na sua liberdade e encontramos o nosso lugar no contexto: não como centro da história, mas como alguém a quem foi dado participar do enredo, e, por isso, ficamos gratos. A surpresa pára de soar como ameaça, e aparece, agora, como algo que nos encanta. É a abertura às verdadeiras alegrias, alegrias que não nos dávamos conta de que existiam e que, não obstante, residem nas coisas mais simples. É aí que começamos, de fato, a viver.

Os pantins somem, pelo menos em grande parte. Os caprichos deixam de ocupar demasiadamente a alma. A humildade desabrocha e, com ela, a inteligência encontra espaço para exercer o seu amplo alcance. Passamos a respeitar as outras pessoas, e respeitamos a Deus, compreendendo que os nossos problemas e os nossos desejos não têm direito algum de reclamar prioridade. É aí que encaramos o mistério, pois só podemos fazê-lo depois que o aceitamos. Aceitamos o mistério quando acolhemos a verdade de que há coisas que nos ultrapassam infinitamente. É quando nos encantamos com a vida e com tudo o que há. E é aí também que, tomando profunda consciência do valor da existência - inclusive da nossa - podemos viver aquilo que o Thomas Merton chamava de "intuição metafísica do ser", experiência que, embora esteja ainda no campo natural, pode transformar a vida de alguém para sempre.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Deus e as demais pessoas são, de fato, outros.

Em geral, por causa da nossa natureza decaída, nós tendemos a considerar as outras pessoas e até mesmo o próprio Deus mais ou menos como extensões de nós mesmos; nós os instrumentalizamos para que nos sirvam e obedeçam sempre à idéia que deles fazemos. Se algo escapa à nossa tola previsão, consideramo-lo logo como uma ameaça. Muito embora este tipo de atitude seja absurda, é o que mais encontramos. Muitos dispensam amizades ou companhias quando estas não correspondem às expectativas que tinham e à qual se apegavam como condição para a manutenção do vínculo. No entanto, assim que o outro demonstra ter liberdade, esquivando-se de agir como um autômato, o encaramos como qualquer coisa desagradável, e isto porque, no fundo, intentamos ser os senhores do mundo, ser deuses ao redor dos quais tudo o mais gravita.

Este tipo de vida é, por força, uma ilusão e traz consigo, em verdade, muitas angústias, porque, por mais força que se faça, as coisas simplesmente não reconhecem a nossa suposta majestade ou divindade. Riem das nossas previsões pelo simples fato de serem outras, com existência própria, ao invés de prolongamentos do nosso próprio ser. Aquilo que é outro age, também, de modo diverso. Nem sempre os abarcaremos pelas previsões e outras tantas vezes as suas ações distarão bastante daquilo que, de imediato, nos agradaria a sensibilidade. Isto se dá com os fatos, com as pessoas, que são dotadas de grande liberdade e possuem a dimensão do mistério, e sobretudo com Deus, que é Pessoa e é o próprio Mistério. Como pretender que Deus partilhe dos nossos preconceitos, dos nossos esquemas estreitos de interpretação do mundo e de previsão dos acontecimentos futuros? Será que não vemos que tudo isto nada mais é do que uma tentativa covarde e cínica de nos apossarmos do todo a fim de evitarmos as dores e desprazeres e, ao mesmo tempo, de agarrarmos e garantirmos o máximo grau de prazer, seja das coisas ou das pessoas? Nós instrumentalizamos e tornamos os outros em objetos. Mesmo Deus, se não corresponde às minhas considerações rasteiras ao seu respeito, às minhas expectativas mais imediatas, poderá passar a ser tido como ser esquivo.

O que precisamos entender é que as outras pessoas são, de fato, outras. Elas podem agir segundo critérios totalmente distintos dos que cultivamos e não serão culpadas por isso. Conceder-lhes a liberdade da autonomia; relativizar um pouco as próprias suposições. Compreender que Deus também é Outro, e que de modo algum podemos abarcá-lo e esgotá-lo. Ele é sumamente livre para corresponder ou não às nossas expectativas. Deixemo-lo ser surpreendente, ainda que isto pareça ameaçador ao nosso egoísmo que busca freneticamente ter tudo ao seu domínio. Deus escapa ao nosso horizonte, e o faz infinitamente. É a Ele que cabe legitimamente o posto de absoluto e é em torno dele que tudo, inclusive nós também, devemos gravitar.

As outras pessoas são mesmo outras. E Deus é mesmo outro. Isso é importante de se compreender e, posso dizê-lo, é revolucionário no bom sentido. Uma vez entendido, terá implicâncias várias. Depois retomarei esse assunto. Agora, preciso ir-me.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Aniversário da Rafinha, eehhhhh!!!


Risinho doce, ela é um amor de pessoa, e é muito agradável estar junto dela
Abraço terno, de um dengo só, Rafinha faz lembrar uma criança traquina
Flor delicada que inspira cuidado, é, no entanto, uma pessoa forte
Acontece de se revoltar e falar umas potocas, mas ela é bem inteligente
Ela é como uma janelinha transparente; sua alma se deixa ver
Livre será quando vencer tantos medos no seu coraçãozinho
Ypsilon é uma letra que não dá pra escrever muita coisa com ela.

Bju Rafinha. Feliz Aniversário. Que Deus te abençoe e Mamãe te conduza sempre. Pax.

sábado, 18 de junho de 2011

S. Francisco descrito pelo Chesterton


São Francisco era magro, pequeno e vivaz - fino como um cordel, vibrante como a corda de um arco, e, nos seus movimentos, semelhante a uma flecha disparada. A vida toda ele foi um conjunto de mergulhos e de fugas: correndo atrás do mendigo, ou nu pela floresta, atirando-se para o estranho navio, ou se arremessando para a tenda do sultão e propondo atirar-se ao fogo. Exteriormente, deve ter-se assemelhado ao esqueleto muito fino e amarelado de uma folha outonal, a dançar eternamente adiante do vento; em verdade, porém, ele é que era o vento.

G.K. Chesterton, Biografia de Sto Tomás de Aquino.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Férias e Kung Fu


Penso que já estou de férias. Isso é bom ^.^. Nesse tempo, quero descansar um pouco, pôr certas leituras em dia, ver se arrumo uns bicos com aulas de violão e digitação de trabalhos. Mas eu quero ver, também, se volto aos meus treinos de Kung Fu, pelo menos modestamente. Não é a primeira vez que me proponho a fazê-lo mas, se eu levar a termo, será a primeira vez que efetivo o planejado.

Tenho alguns motivos pra supor que dessa vez possa ser diferente. Primeiro, se eu o considerar como uma ascese - e estou precisando disso - o treino se revestirá de uma nova motivação. Depois, uma das razões de eu estar meio que sedentário já durante algum tempo se deve ao fato de que, há pouco mais de um ano, numa brincadeira sem jeito, eu machuquei a coxa direita; acho que foi algo como uma distensão e, infelizmente, isso se prolongou bastante. O simples fato de eu me agachar já causava dor. Então, eu deixei a coisa melhorar por si mesma. Hoje, enfim, parece que passou.

No treino de Kung Fu, a coxa é fundamental. Há muitas posturas baixas e há a famosa mapu ou posição de cavalo. Kung Fu sem Mapu pra mim não existe, embora o Wing Chun não a cultive. Mas, enfim, agora eu posso voltar a esses treinos. Como escreveu Nietzsche, certos jejuns servem como estratégia para a disciplinação e cultivo da fome a fim de que, uma vez terminado o tempo de recesso, a atividade seja desempenhada de maneira mais perfeita e intensa. Vamos ver se isso é suficiente pra que eu retome os treinos.

Outro fator que pode ser visto como desestimulante é o fato de ter que treinar sozinho. Mesmo nos processos de caminhada e/ou corrida, encontram-se poucas pessoas dispostas. Não tem problema. Eu sempre me dei bem em fazer as coisas sozinho. A única diferença é que, quando são pelo menos dois, é mais fácil levantar cedo, rs... Mas, enfim, há projetos para essas férias. Que Deus me ajude a cumpri-los. Estou voltando ao Kung Fu. ^.^

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Mais um ano de vida.. Obrigado, Senhor...

Acabo de completar meus 26 anos e, sinceramente, estou feliz, embora um tanto mais emotivo que o comum. Acaba de terminar este que chamei de "meu dia" e o deixo passar enquanto mantenho as mãos bem abertas e sem tensão e esboço um sorriso na alma. Tudo indica que hoje eu também fico de férias na Faculdade, embora ainda precise receber as notas de duas disciplinas. 

Mas este foi um bom dia e, no entanto, um dia comum. Levantei-me cedo e voltei-me aos textos. Passei a manhã e a tarde entretido em trabalhos e, já pertinho da noite, fui à Faculdade. Tive aula, com clima de despedida - por ser término do semestre, pelo menos para os que não farão reavaliação - e, se não fossem os votos de felicidades que recebi ao longo do dia, seja no orkut, seja por mensagens de celular, seja por ligações,  ou pessoalmente, o dia teria sido como tantos outros. No entanto, na minha alma, ele foi único. Passei-o com um estranho senso de gratidão e fui notando como é bom ter sido criado por Deus. Naquela ocasião, Ele não me criou a partir de qualquer mérito meu, já que eu não existia. Foi um ato de pura gratuidade e bondade. E hoje, a completar meu 26º aniversário, eu percebia que a mesma bondade e a mesma gratuidade ainda permanecem. Quem sou eu para me apegar ao tempo que corre? Não... Livre como o vento, sigo imitando aquela gratuidade, aquela pobreza belíssima dAquele homem único que dormia num barco numa noite de tempestade. Ele não tinha onde reclinar a cabeça e, no entanto, era imensamente feliz! Oh verdadeira poesia a deste meu Deus que é a própria bondade e beleza feitas homem.

Bem dizia S. João da Cruz: "oh belíssimo amor de Deus; quem vos encontrou a fonte, repousou". Eu também a quero encontrar; E já me apontaram o caminho. Não fosse a fraqueza e a curteza das minhas perninhas, para lá eu correria e chegaria num salto.

Enfim, agradeço a Deus pela graça de mais um aniversário. Foi uma honra pra mim. Passei o dia meio constrangido por testemunhar esse amor de Deus, tão doce. "O amor de Cristo nos constange", escreve S. Paulo. E é isso mesmo... a gente fica sem saber direito como agir, sem saber direito como rezar. É aí que o Espírito ora em nós e é aí que, enquanto fracos, somos fortes. 

Meu Senhor, como dizia Sta Clara no leito de morte, pouco antes de nascer para a verdadeira vida, "mil graças por me teres criado". Eu também, agora, festejo este dia que marca o meu nascimento e volto os olhos para aquele outro, que será quando Tu quiseres, e em que, se eu estiver na tua Graça, nascerei para sempre nos teus prados e vales. Obrigado, meu Deus.

A Mamãe...


Um video dedicado à esta minha doce Soberana; deste seu escravo mui rebelde tentando compensar um pouco por suas travessuras e libertinagens.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

"Desde que me olhaste, a graça e a formosura em mim deixaste..."


"Alegremo-nos, Amado, e vamos ver-nos em tua Beleza"


"Possa eu ser tão transformado em tua beleza, que sendo semelhantes em beleza, possamos ver-nos ambos em tua beleza, tendo já eu a tua própria beleza. De modo que, olhando um para o outro, veja cada um no outro a tua beleza, já que a beleza dos dois é a tua só, e eu sou absorvido na tua beleza"

S. João da Cruz

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Vontade e Intelecto no amor a Deus


"Como o fim de todas as coisas é o amor, que reside na vontade, cuja propriedade é dar e não receber, ao passo que a propriedade do intelecto, que é o sujeito da glória essencial, é receber e não dar, assim a alma aqui inebriada de amor põe em primeiro lugar não a glória que Deus está para dar-lhe, mas a oblação de si mesma a Deus num ato de puro amor, sem qualquer consideração de sua própria utilidade"

S. João da Cruz

quinta-feira, 2 de junho de 2011

O deleite do amor


"Em toda espécie de amor, humano ou divino, a alma pode refletir sobre a sua atividade amante e assim se tornar objeto de seu próprio conhecimento. Por esta razão, o deleite do amor humano pode produzir um estado que se assemelha a uma forma inferior de contemplação, se a mente descansa nesta experiência deliciosa e a aprecia por ela mesma. Neste caso o amor é objeto de uma intuição reflexa. A alma fica em fruição da sua própria experiência. Ela ama e sabe que é amada. Este conhecimento produz o deleite."

Thomas Merton, Ascensão para a Verdade

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Um pequeno pobre


Aquele pequeno gostava de, todos os dias, subir a pequena elevação de pedra que dava para um abismo. Lá embaixo, um belo vale avistava-se e era alheio a toda escravidão.

O pequeno subia e saltava e gostava de, com a alma vazia, sentir o vento a lhe acarinhar o rosto, a lhe mover os cabelos e se sentia amigo dos pássaros, destes seres livres que, não raro, acompanhavam o seu vôo.

Saltava o pequeno e era abraçado pela imensidão.

Um dia, porém, tendo feito o mesmo percurso, percebeu uma receptividade diferente. O vale como que se enamorara pelo rapaz e, tendo este saltado, foi abraçado de modo único. E foi único por dois motivos: por ter sido diferente de todos os anteriores; e por nunca mais ter se repetido. Foi único, primeiro e último.

E a alma do rapazinho? Ela feriu-se e ao lago, no vale, ele juntou umas poucas lágrimas. Parece que o vento não soube que sofrera. O menino, porém, nunca deixou de saltar, pois sua alegria era ser pobre e sabia que isto implicava em não se defender.

Fábio