quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Um diálogo com Ele

Conversei bastante com Nosso Senhor, hoje. Foi muito bom e me parece ser um mistério o motivo de eu não fazer isso mais frequentemente. Tivemos um momento único de intimidade; no Seu silêncio, Nosso Senhor parecia um pouco tímido.

Eu não costumo conversar longamente com Ele. Converso sim, mas com frases curtas. Há anos que aderi à mística sanjuanista e, nela, dá-se bastante ênfase ao silêncio. Grande parte da minha oração é simplesmente silêncio. Para isso, há anos também que venho disciplinando a alma para a quietude. Tudo isto tem uma razão de ser. Mas, hoje, eu enfatizei a oração mental, que é a oração espontânea. E foi bom. Lembrei-me do que diz S. Josemaria Escrivá: "A oração do cristão nunca é monólogo". No entanto, as respostas de Nosso Senhor são sempre silêncio. E, no entanto, Ele está lá...

Lembrei-me também da Julian de Norwich: "Eu entendo o ministério dos anjos, mas Deus é muito mais próximo e muito mais terno". Lembrei-me de Sto Agostinho: "Deus é mais íntimo de mim do que eu mesmo". E lembro, agora, de Sta Teresa que, não obstante tenha alcançado os níveis mais altos de oração, nunca escondeu sua predileção pela oração mental.

Conversei com Nosso Senhor, hoje. E lhe fiz várias perguntas. Foi muito bom porque foi muito sincero. Ele me fez ver certas coisas e eu lhe disse tantas outras. E, no fim, eu só sei dizer que Deus é muito bom. Por ora, a minha oração não pode ser outra, senão essa de S. Pio de Pietrelcina. É, mesmo, o que de mais importante eu tenho a Lhe dizer...

Deus e o Homem


"Singular é o relacionamento Deus-Homem: 
o primeiro que não necessita complementar-se 
é origem de toda união; 
o segundo, ainda que de tudo carente, 
é a causa de toda recusa."

Hélio Drago Romano, A Gnose e a "Morte de Deus"

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Impressionante relato de conversão de Afonso Ratisbonne


Afonso Ratisbonne foi um judeu que cresceu nutrindo ódio à Igreja Católica e, no entanto, como S. Paulo, foi pego de surpresa, rs. Logo após o ocorrido, ele exclamava comovido: “Oh, como eu sou feliz! Oh, como é bom o Senhor! Que plenitude de Graça e felicidade! Como é lamentável o lote daqueles que não sabem!” Para ler o texto, cliquem aqui.

sábado, 20 de agosto de 2011

5º Mistério Gozoso - A perda e o encontro do menino Jesus no Templo


Estamos uns doze anos depois do nascimento de Jesus. Ele e seus pais, como autênticos judeus, costumavam ir anualmente visitar o Templo de Jerusalém. Era sempre uma alegria essa viagem. Iam em caravanas e é neste contexto que devemos entender, primariamente, as palavras do Salmista: "Que alegria quando ouvi que me disseram: vamos à casa do Senhor; e agora, nossos pés já se detêm, Jerusalém, em tuas portas."

E lá ia Jesus, com seus pais. Chegados no templo, Lucas não fala dos pormenores. Mas, segundo alguns, era comum que as crianças de várias famílias ficassem juntas, de modo que os pais não se preocupavam, supondo que eles estavam com conhecidos. Quando Jesus chega ao Templo, não podemos sondar o que seu passou na sua alma. Erra, porém, quem pensa que Ele rejeitou o templo. De modo algum. Lembremos que, anos depois, o mesmo Jesus se levantará energicamente contra o comércio no interior do templo e sua desvirtuação do culto. Depois de ter derrubado bancas e lançado seu chicote contra os cambistas, os Apóstolos O olharão e lembrarão da Escritura: "O zelo por tua casa me consome". Jesus amava o templo.

Pois bem. Não temos como dizer, como já o adiantamos, os pormenores dessa visita. O que o Evangelista Lucas nos relata de modo mais claro é o que se deu quando esses judeus voltavam, já, às suas casas. José e Maria iam juntos e Jesus estava ausente. A suposição, como dissemos, é que Ele estivesse em alguma outra caravana. No entanto, ao final de três dias, perceberam que algo não estava certo. Depois de perguntar a todos os seus conhecidos e constatar que Jesus não estava entre eles, a aflição tomou conta do coração de Maria e de José. Decidiram voltar imediatamente ao templo de Jerusalém, com a esperança de encontrá-Lo lá.

Aqui a Virgem Santíssima nos dá uma grande lição. Sabemos, pela teologia, que perdemos a amizade com Nosso Senhor toda vez que caímos em pecado mortal. É então que se dá algo similar a essa perda de Jesus. Maria nos ensina o que fazer: procurá-Lo imediatamente, pois tudo é nada sem Ele. Para encontrá-Lo não se devem medir os esforços. Lembremos de Maria Madalena que, vendo como o corpo de Jesus não estava na tumba no terceiro dia após a Sua morte, pergunta aflita: "Onde O puseram? Digam-me e eu irei buscá-Lo". 

Também a esposa dos Cantares dirá coisa similar: 

"Durante as noites, no meu leito, busquei Aquele que meu coração ama; procurei-O, sem encontrá-Lo. Vou levantar-me e percorrer as ruas e as praças, em busca d'Aquele que meu coração ama; procurei-O sem encontrá-lO. Os guardas encontraram-me quando faziam sua ronda na cidade. "Viste acaso Aquele que meu coração ama?" Mal passara por eles, encontrei Aquele que meu coração ama. Segurei-O e não O largarei."

S. João da Cruz, numa poesia baseada neste livro dos Cânticos, põe a esposa a falar com os transeuntes nestes termos: "Se vires o meu Amado, dizei-lhe que adoeço, peno e morro"

Não podemos descrever a dor de Nossa Senhora ao supor ter perdido Jesus. Assim como Madalena se propunha a ir buscar o corpo do Senhor sem atentar à sua própria fraqueza física, também em Maria sumira-lhe o cansaço e todo o seu ser se voltava a um único objetivo: encontrar Jesus.

Esta deveria ser a nossa atitude toda vez que O perdemos pelo pecado mortal. Notemos que Maria volta imediatamente ao templo. Também nós, uma vez perdida a Graça, devemos retomá-la no templo, na Igreja, pelo Sacramento da Confissão. A esposa dos Cantares, vendo-se sem o Amado, O busca no leito, sem encontrá-lO. Isto pode referir-se a nós quando, hesitando em ir à confissão, tentamos retomar, por nós mesmos, isto que está muito além de nossas forças. Não O encontraremos desse modo. Ao ler este trecho dos cantares, associei os guardas aos sacerdotes da Igreja, que são os guardas dos Sacramentos e da doutrina. Diz a esposa que, tão logo passou por eles, encontrou o Amado. Assim é quando, arrependidos e com a disposição de não mais pecar, acorremos ao sacerdote. Reencontramos o Cristo.

Aqui, porém, Maria continua a sua angústia. Chegando ao templo, procuram apressadamente e, de repente, um nuance familiar lhe acelera o coração: era Jesus. Que alívio! Depois de tê-lO encontrado, Maria, por fim, se dá conta do que está a acontecer: Jesus está no meio de doutores da lei, homens extremamente inteligentes e conhecedores das Escrituras, e, coisa admirável, Jesus os deixa boquiabertos por Sua inteligência, não obstante tivesse apenas 12 anos. Naturalmente, Maria se surpreende... Depois, indo a Jesus, lhe faz uma censura: "Por que fizeste isto conosco?" ao que Jesus responde: "Por que vos preocupáveis? Não sabíeis que devo ocupar-me das coisas de meu Pai?". 

De novo, há muito o que meditar aqui. Maria, a Mãe de Jesus, estava preocupada com o sumiço do seu Filho. E era um motivo bastante compreensível e justo. No entanto, Jesus mostra a Sua Mãe que, para além das convenções e cuidados humanos, Deus merece a absoluta primazia. Ele mesmo dirá, anos depois: "Não penseis que vim trazer a paz; vim trazer a espada: por minha causa, mãe se porá contra filho e irmão contra irmão". E isto porque, aquele que adere ao projeto de Nosso Senhor, naturalmente adentra num ambiente de largos horizontes e de valores muito diferentes dos de cá de baixo. Lembremos ainda o que Jesus diz: "Vós sois daqui. Eu sou de cima". Se tornar cristão é assumir esta descendência do alto; é descobrir-se exilado e reconhecer que os valores de cima é que são os verdadeiros. Isto, claro, causa uma grande incompreensão dos demais. É, talvez, fácil ver alguma arrogância ou irresponsabilidade em Jesus, neste episódio e em outros. Mas isto se dá porque O julgamos com critérios muito terrenos. Dirá Ele, no Antigo Testamento: "Meus pensamentos estão tão acima dos vossos pensamentos, como o céu dista da terra". Aderir a Jesus, portanto, expõe o cristão a uma série de coisas: o torna solitário, separando-o; e lhe atrai as reprimendas e as críticas dos que não o compreendem. Isto sempre foi assim. Lembremos do profeta que se lamentava: "Seduziste-me, Senhor, e eu me deixei seduzir; por Tua causa e por Teu nome estão todos contra mim"

Depois, há uma interessantíssima associação de idéias. Jesus fala que deve ocupar-se das coisas de Seu Pai imediatamente depois de ter demonstrado uma inteligência singular. Dedicar-se às coisas de Deus surge, no contexto cristão, como a verdadeira sabedoria. Esta constatação estará em S. Paulo, uma vez que ridicularizará a sabedoria deste mundo, chamando-a de estultícia. Ser sábio é, para este Apóstolo, aderir à "loucura da Cruz". Ser verdadeiramente sábio é abrir-se à transcendência de Deus e fazer d'Ele a prioridade da própria vida. É, nas palavras de Jesus, "ocupar-se das Suas coisas", ainda quando estas contrastam com outras coisas, mesmo que legítimas. É que nada é bom sem Ele. "Só Deus é bom", dirá Jesus. Sem Ele, portanto, nada é bom. 

Maria parecia não ter compreendido profundamente o que Jesus havia dito ali. No entanto, Lucas a descreve como "Aquela que guardava tudo no seu coração", e o coração é justamente, na linguagem bíblica, a sede da sabedoria no homem. 

Em seguida, Lucas conclui que Jesus permanecia obediente aos seus pais, e crescia em sabedoria, tamanho e em graça.

Por este mistério, e pela intercessão da Virgem Maria, peçamos a graça de ter a Nosso Senhor como centro absoluto da nossa vida, de sofrer quando d'Ele estamos distantes e de desejar, sobretudo, a Sua intimidade.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

4º Mistério Gozoso - A Apresentação do Menino Jesus no Templo e a Purificação de Nossa Senhora


Pouco tempo após o nascimento de Jesus, Maria e José vão a Jerusalém para apresentar o menino ao Templo. Isto era um costume judeu, segundo o qual o primeiro filho deveria ser apresentado ao Senhor. É justamente por isto, porque a Escritura determina a consagração do Primogênito, que os Apóstolos utilizam este termo para referir-se a Jesus, ao invés de "Unigênito". A objeção protestante de que Jesus teria tido irmãos de sangue já foi refutada de mil modos. Sigamos, então, a exposição.

A lei judaica determinava que a mulher que dava à luz um filho homem deveria esperar por um período de quarenta dias antes de entrar no templo. Obviamente, Maria era absolutamente isenta de qualquer mancha, pelo que não havia necessidade estrita de cumprir este preceito. No entanto, ela humildemente se submete e, mais uma vez, nos mostra que a grandeza não se associa à auto-suficiência ou auto-afirmação, mas é íntima da humildade e da obediência a Deus. Maria espera o tempo de purificação, embora fosse sem mancha, assim como o Seu Filho se submeterá a um batismo de perdão embora não houvesse cometido nenhum pecado.

E lá vai Maria ao templo, acompanhada de seu esposo, José, e de seu Filho Deus. Eles dão, como oferenda, um par de pombinhos, que era o típico dos pobres. Lembremos ainda que Maria era descendente direta de Davi e, portanto, possuía linhagem nobre. No entanto, ei-la aqui reconhecendo-se e se afirmando pobre. Da sua perfeita pobreza é que surge a sua imensa grandeza. Seu Filho um dia dirá que são felizes os pobres, porque deles é o Céu. Não à toa, o próprio Deus, o Amante da pobreza, quis nascer em tal meio, o que mais uma vez nos faz refletir: se queremos o convívio com o Cristo, necessário é fazer que o nosso coração se torne pobre, lembrando que a pobreza interior não se qualifica tanto como não ter nada, mas como um desapego, uma disposição de dar.

Maria foi perfeita em sua pobreza. Vimos como ela abandonou-se diante do anúncio do anjo. E por toda a vida, ela será constante nessa sua atitude interior. Quando a vemos, no livro do Apocalipse, tendo a lua por baixo dos pés, devemos entender que, sendo a lua o símbolo da inconstância, Maria pisou-a de modo tal que a retidão da sua alma nunca sofreu oscilação, nem mesmo a mais leve. Ela é a totalmente constante. Toda a vida de Maria foi uma plena perpetuação do seu "fiat".

Sabemos que as virtudes são amigas das virtudes, assim como os vícios são amigos dos vícios. Diz Nosso Senhor: "onde está o cadáver, aí estarão os abutres". Desse modo, Maria possuía em sua alma a plenitude de todas as virtudes. A sua perfeita pureza e a sua total pobreza permitiam um amor de tal modo grandioso e ardente por Jesus que, dizem os escritores espirituais, os seres angélicos poderiam ter descido a Nazaré a fim de aprender dela o amor a Deus. E, no entanto, ei-la apresentando o seu Filho no templo, como que fazendo um ofertório, reconhecendo que, embora O amasse imensamente, o seu Filho haveria de dedicar-Se à salvação de todo o mundo, obedecendo, antes de tudo, ao Pai, o que implicava toda uma vida de doação e sacrifício. Maria mantém a sua pobreza e oferta o seu bendito Filho. Abraão fora poupado deste sacrifício. Mas ela não será.

Ao chegarem no templo, havia um profeta idoso, de nome Simeão, que apenas esperava o dia, garantido por Deus, em que veria o prometido das nações e o objeto de espera de todos os profetas: Aquele que iria redimir a humanidade. Nos dias de hoje, temos muito pouca condição de compreender o que era esta espera visceral. Se fôssemos bons católicos, poderíamos entender algo disso em comparar com a espera que temos da vinda de Jesus. No entanto, para muitos esta promessa se tornou obscura e se converteu em matéria pouco provável ou distante. Para os profetas da Antiga Lei, porém, isto era o que havia de mais importava. E Simeão, agraciado pela promessa de que, literalmente, veria o Salvador, vivia apenas para este dia.

Quão profunda deve ter sido a alegria deste velhinho ao presenciar, diante de Si, Ele, o esperado! "Já podes deixar ir o teu servo, pois meus olhos viram a tua salvação", é o que ele exclamará. Agora, morrerá feliz, pois sabia que o Cristo já vivia no mundo. O fato de saber ou conhecer o Cristo, o libertava da sua longa espera. "Conhecereis a Verdade, e Ela vos libertará".

Dirá ainda, este profeta, a respeito de Jesus: "Ele será motivo de soerguimento para alguns, e de queda para outros", profetizando que ninguém permaneceria indiferente àquele menino. E a história o dirá: ou o amarão muito, ou o odiarão muito. Jesus mesmo se pronunciará a este respeito: "Quem não está comigo, está contra mim; quem comigo não ajunta, espalha" e ainda "feliz o homem para quem eu não for pedra de tropeço" e, por fim, "aquele sobre quem esta pedra cair se fará em pedaços". Toda a história humana tem o seu centro n'Ele e é o amor por Ele e a adesão a Ele o que determinará a bem-aventurança ou a eterna proscrição. Ele dividirá os homens à Sua direita e à Sua esquerda, sendo Ele mesmo o centro. Não é que seja amigo da arrogância, é que é, Ele mesmo, a Verdade, e não terá medo de o dizer.

E Simeão como que previra tudo isto quando O viu. Depois, olhando para os olhos da Virgem Santíssima, lhe adiantou: "Uma espada de dor transpassará o teu peito". Aqui se vê, claramente, uma alusão à Cruz e uma participação muito íntima de Maria na obra da Redenção. De fato, diz a Igreja: "O que Cristo sofreu no corpo, Maria o sofreu na alma". Desta dor, não fazemos sequer idéia. Alguém, sobre isto, se pronunciou deste modo: "Se a dor que Maria sentiu fosse dividida, em partes iguais, por todos os homens, todos, sem exceção, morreriam de imediato". Uma dor proporcional ao seu amor e, portanto, um abismo.

Por este mistério, peçamos, através da intercessão da Santíssima Virgem, um amor firmíssimo por Jesus, uma pureza imensa e uma pobreza perfeita.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Virgem Maria - Assunção


Hoje foi dia da Assunção de Maria Santíssima e eu quase não tenho tempo de escrever nada a respeito. Porém, o faço agora, muito sucintamente.

A Virgem Maria foi, como dizíamos noutras postagens, uma mulher que viveu perfeitamente abandonada em Deus. Ao contrário da primeira Eva que se ensoberbeceu, Maria humilhou-se e foi a primeira na humildade. Eva revoltou-se; Maria rendeu-se. Não espanta, então que, assim como o Novo Adão, o Cristo, tendo morrido, ressuscitou e ascendeu aos céus, pois era Deus verdadeiro, também a Virgem Maria, tendo passado pelo que se chama "dormição", termine, na constância da sua entrega, por ser elevada aos céus, antecipando a sorte dos eleitos. Em Maria, há um particular dignificação do gênero humano de modo que, estando já com Deus, ela nos apresenta a glória legítima, destinada aos humildes e obedientes, aos que reconhecem que "só Deus é bom" e que só n'Ele é possível realizar-se, nós que buscamos o bem.

Sim, Maria já está com Deus e de lá pede por nós. Que nós aprendamos dela a perfeita humildade, obediência e o total abandono para que, um dia, também nós, unidos em Deus, gozemos das alegrias dos eleitos.

domingo, 14 de agosto de 2011

De um Silvério, com muita honra, ao maior mestre de Kung Fu de todos os tempos



Se for também escravo da suposição
Reinará, na sua alma, algo de solidão

Faz tempo, já, que deixei de dizer os
Risos que, no íntimo, se abriam sem esforço
Ainda quando, calado e sério, te visitava
Nunca disfarcei os pulos de um coração em alvoroço
Curioso que, estando assim meio longe
Imitei, eu mesmo, os teus trejeitos
Saudade é, já, grande conhecida
Corria eu - lembra? - quando te via na esquina,
Orgulhoso e feliz de uma visita...

Mas, tu sabes, nunca me foi dado
Estar, por muito tempo, extasiado
Um presente assim, talvez, do outro lado...

Peço, tão só, que não pense que eu mudei
A saudade não passou; só me acostumei
Isso de amar é eterno; eu já sei.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Nós estávamos, em bom português nordestino, ferrados...


Nós, os humanos, fomos feitos.. Isto é fato! As coisas exigem um início. O nada, não sendo nada, tampouco pode vir a tornar-se alguma coisa. O nada sequer existe. E Deus fez tudo o que há. Fez-nos também e nos criou num estado de amizade com Ele, o que chamamos tecnicamente de Estado de Graça. No entanto, como sabemos, os primeiros humanos desobedeceram a Deus e contraíram pecado e, por este meio, entrou no mundo a morte, como diz S. Paulo.

Muita gente gosta de decrescer esta história, como se fosse conto infantil. Mas observemos algumas coisas pra entender bem o que que aconteceu, compreender as implicâncias desta desobediência e ver como estávamos em muito maus lençóis. 

Geralmente olhamos para Adão como se fosse alguém parecido conosco, só que lá no início. Acontece, porém, que a nossa experiência no mundo já é posterior àquela desobediência. Por causa disso, nós herdamos uma desordem na sensibilidade, o que nos inclina fortemente ao prazer egoísta, nem que para isso nós tenhamos de transigir certas regras. Porém, Adão não tinha essa inclinação.

Nós, os homens, possuímos uma hierarquia de potências que é a seguinte: abaixo, vai a sensibilidade. Esta se submete à vontade que se submete, por sua vez, à inteligência. Portanto, a sensibilidade, no homem original, não se voltaria para um objeto que a inteligência visse como mau e que a vontade, portanto, consideraria digna de ódio. Se perguntarmos a um drogado hoje, ele dirá que a droga é repugnante aos seus olhos e, no entanto, ele a quer. Desordem das potências. Mas isso é consequência daquela desobediência. Em Adão, porém, o ser era perfeitamente ordenado.

Isso é fundamental para que percebamos a gravidade do seu ato. Adão foi criado perfeito: inteligência profunda que atingia a verdade sem esforço; uma vontade capaz de amar com facilidade; uma sensibilidade que acrescentava à alegria da sua alma, também a do seu corpo, fazendo com que ele fosse uma harmônica unidade.

Porém, Deus tinha lhe proibido comer do fruto daquela tal arvorezinha. Daí, aparece o demônio na forma de uma serpente, e diz que Deus mentiu, e convence Eva a comer do fruto e dá-lo a Adão.

Lembremos que não havia propriamente tentação tal qual a entendemos hoje, como uma inclinação da sensibilidade para algo errado. Adão recebe aquela proposta da serpente e se decide, de modo frio, pela desobediência. Ora, para entendermos a gravidade de um pecado, convém considerar três coisas:

1- O conhecimento de que aquilo é errado;
2- A liberdade com que se realiza o tal ato;
3- A dignidade do ser que foi ofendido com o pecado.

Nos três casos, Adão se meteu numa enrascada, pois ele tinha pleno conhecimento de que o que fazia era errado. Como não havia uma inclinação da sensibilidade, Adão peca por fria resolução, num abuso da sua liberdade. Ele investe naquilo a vontade, iluminada pela sua inteligência. Por fim, o Ser ofendido possuía uma dignidade infinita, pois era Deus.

Este ato deliberado dos dois teve uma dupla consequência, semelhantemente a todo e qualquer pecado. A primeira consequência foi a culpa; esta destruiu a graça santificante que fazia Adão amigo de Deus, e isto lhe pôs num estado de morte na alma. A partir de agora, Adão, que fora criado para fruir Deus pela eternidade, se verá, por causa de seu pecado, totalmente impedido de cumprir o fim para o qual existia. Sua natureza viu-se frustrada. 

A segunda consequência é a pena; por esta, bagunçou-se aquela ordem e harmonia das potências. A sensibilidade se rebelou. A inteligência cegou-se e ficou rasteira e a vontade, feita para amar a Deus e, n'Ele, todas as coisas, uma vez que deixou de ser bem conduzida pela inteligência, passou a apegar-se a tudo quanto o intelecto, agora míope, lhe apresentava como bem. Enfraqueceu-se, ainda, o vínculo que unia alma e corpo e fazia com que aquela comunicasse a este os seus atributos, como a imortalidade, a incorruptibilidade, a leveza, etc. Agora, o homem conhecerá a morte, tanto física quanto espiritual, e experimentará a dor e toda sorte de suplícios.

Esses seres decaídos são os que gerarão a humanidade. Toda ela provirá deles e lhes herdará as penas do pecado. 

O homem estava em dívida com Deus. Este conhecimento permaneceu na alma humana, meio que de modo intuitivo, mesmo depois de muito tempo passado deste fato. Todas as civilizações e religiões antigas traziam a idéia de que Deus ou os deuses estavam irados por algum motivo. A única forma de lhes mitigar a ira era a partir dos sacrifícios. Mas, por que justamente um sacrifício?

Vejamos. Desnecessário é aqui remontar à etimologia do termo que, embora sugestiva, contribui menos para compreender, por ora, a importância deste ato. Importa, antes, entender em que consiste propriamente o sacrifício. O pecado original foi um pecado de soberba - Superbia - que é o mesmo que egoísmo. É uma preferência absoluta por si mesmo em detrimento de tudo mais. Este ato gera desordem porque faz que o homem se veja como o centro de tudo, quando, na verdade, ele não é. Deus é o centro. Portanto, a soberba, coerente com o seu prefixo Super, faz que o homem se pretenda Deus e caia numa idolatria de si. Lembremos que a proposta a Adão era justamente a de tornar-se semelhante a Deus e isto sem o auxílio de Deus; por conta própria. Adão restringe-se, limita-se a observar apenas a sua pequenez e perde aquele senso de grandeza legítima. Não à toa a sua inteligência fica rasteira, pois ela deixa de se elevar às coisas altas.

O sacrifício é, precisamente, outra coisa! É quando nós amamos tanto algo fora de nós que investimos, por este algo, o que temos, ainda que nos seja caro. É como um esquecer-se de si, ou pôr-se limites a si mesmo em função daquele outro que é mais importante. O sacrifício é, portanto, o guarda da humildade e da legítima grandeza. Estas duas são como irmãs gêmeas.

O sacrifício implica uma espécie de morte que faça, por sua entrega, merecer a vida. É como uma violência que o sujeito se faz para que não se feche em si mesmo. É, portanto, um modo de transcendência. É um sair de si. Esta última característica, o sair de si - êxtase - é um traço inerente ao amor. Daí que amor e sacrifício andam sempre juntos. O sacrifício, pondo o homem para além de si mesmo, mantém pura a inteligência, fazendo-a voar mais alto. Naturalmente, a vontade adquire mais luz e maior capacidade de amor. A sensibilidade, por sua vez, aborrecida pelo sacrifício, vai deixando de impôr-se com tanta força, até voltar à sua obediência às demais potências. Ora, se o sacrifício é capaz de fazer isso tudo, convém colocá-lo de modo decisivo dentro da própria vida dos homens. Daí que a teologia ascética vai afirmar que a mortificação é uma necessidade da vida espiritual.

Geralmente, os que fazem sacrifícios, desde a antiguidade, são chamados de sacerdotes. Notemos que é o mesmo radical que é participado nas duas palavras. Ambas provêm do termo "sacer" que traz sempre a idéia de transcendência, de algo que toca uma outra dimensão para além desta. Por isso, desde muito tempo, os sacerdotes eram aqueles que serviam de mediadores entre o povo e os deuses.

Quando Deus disse a Adão para não comer daquele fruto, ele fazia de Adão um sacerdote, pois ele deveria sacrificar. Isto asseguraria a sua dignidade enquanto homem. No entanto, Adão pecou precisamente pela recusa em agir como sacerdote. É natural, portanto, que os homens, ainda que intuitivamente, como pus acima, saibam que é pelo sacrifício - o ofício do sacerdote - que deverão aplacar a ira de Deus.

No entanto, isto não resolvia a questão, porque, se foi toda a humanidade que herdou o pecado original, ela toda, então, deveria ser sacrificada. Mas, sem considerar o absurdo dessa hipótese, nem desse modo eles conseguiriam seu intento, porque o ato redentor deve ser universal, mas não apenas no sentido geográfico, como também no cronológico. Esse ato deveria incluir necessariamente todos os homens desde o início. Obviamente, nenhum homem era capaz de tal.

Além disto, a morte de um criminoso não pode servir de expiação por outros. A morte do pecador seria tão somente um ato de justiça. Muitos criminosos foram sacrificados, sobretudo nas religiões tribais, mas isto não os limpava da culpa. Era preciso a morte de um inocente para que, por seu sacrifício, o valor pudesse ser aplicado a outros. No entanto, aqui há mais dois problemas: primeiro, que a dignidade de qualquer inocente humano é incapaz de conseguir abarcar toda a humanidade. Depois, porque o sacrifício de um inocente é, pela própria natureza, outra injustiça e, portanto, outro pecado. Não obstante, tentativas foram feitas e o que há de mais puro, as crianças e as virgens, foram, também, sacrificadas.

Nos sacrifícios judaicos, povo ao qual Deus falou por primeiro, não havia sacrifícios humanos. Ao invés, eles sacrificavam animais e faziam um tipo de "projeção de culpas" naqueles bichos que iam ser mortos. Havia inclusive uma orientação divina de que o sacerdote faria o sacrifício de um cordeiro em vista da purificação de um povo - delimitação geográfica - pelo espaço de um ano - delimitação cronológica. O cordeiro foi, em geral, o animal usado por dois motivos: 1- porque é absolutamente dócil ao sacrifício. 2- porque vai prefigurar o Filho de Deus. Daí a importância de ser um cordeiro sem defeitos, assim como o Filho de Deus será sem mancha.

Tal sacrifício de cordeiros, porém, era limitado, como vimos. E, se o objeto da redenção devia ser a humanidade inteira, a situação era difícil. Como se não bastasse, o sacrifício deveria se elevar à dignidade do ofendido. Ora, o ofendido era Deus. Somente um Deus pode igualar Deus em valor. No entanto, isso era absurdo! Primeiro, porque Deus não tinha pecado, e deveria, como vimos, ser um ser que traga sobre si a culpa dos pecados, para ser sacrificado. Depois, a idéia de Deus sofrer é totalmente contraditória! Deus é impassível! Não sofre e, tampouco, morre.

Retomemos as exigências para o tal sacrifício.
1- Deveria ser alguém que pudesse estender a eficácia do seu sacrifício de modo universal, seja no aspecto espacial, seja no aspecto temporal. Portanto, deve ser alguém que esteja além do tempo e espaço. Nenhum homem podia fazê-lo.
2- O ser sacrificado deveria ser pecador, pelo que seu sacrifício não implicaria em injustiça. Mas deveria, também, ser inocente, pelo que sua morte servisse de expiação por outros. Ora, como ser pecador e inocente ao mesmo tempo?
3- Deveria ser alguém cujo sacrifício fosse feito em total liberdade, com puro consentimento, tal como os cordeiros sacrificados. Qual o homem que, ferido pelo egoísmo, poderia se elevar com perfeição a um tal nível de amor?
4- Deveria ser homem, para poder sofrer e morrer. Mas deveria ser Deus, para poder elevar a um nível divino o seu sacrifício. Homem e Deus? Complicado.

Se fosse deixado por si mesmo, o homem estava perdido. Não havia o que fazer.

Porém, Deus resolve esse problema para os homens. De tal modo amou Deus o mundo que fez o seguinte:

- Era preciso ser Deus e homem. Deus se faz homem. "E o Verbo se fez carne e habitou entre nós".
- Era preciso estar além do tempo e do espaço. Este Deus humanado será Aquele que dirá: "Antes que Abraão fosse, eu sou" e "glorificai-me com a glória que eu tinha junto de Ti antes da criação do mundo".
- Deveria ser um ato de plena liberdade e consentimento: Dirá também o Redentor do mundo: "Ninguém me tira a vida; eu a dou por mim mesmo".
- Deveria ser pecador e inocente. Dele, se dirá: "não havia mentiras em sua boca, nem crime algum que tenha cometido", e, no entanto, ele será batizado por João, num batismo de remissão dos pecados, assumindo, desse modo, os pecados da humanidade. João dirá dele: "Eis o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo" e Paulo dirá: "Ele se fez pecado por nós".

E Jesus, o Deus feito homem, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, sofreu e morreu por nós. D'Ele, Isaías tinha escrito: "Por Suas chagas fomos curados". Sobre Ele se descarregou toda a seriedade e violência da Justiça divina e n'Ele se satisfez a infinita misericórdia de Deus pelos homens.

É por isso que os Apóstolos dirão que nenhum outro nome foi dado aos homens para que se salvassem. Por mais que um homem tenha sido virtuoso ou nobre, seja Buda, seja Ghandi, seja quem for, nada disso sequer sonha em ser suficiente para a redenção nem de si mesmos, quanto mais de todo o gênero humano.

Compreende-se também como o ato de rejeição deste Amor adquira uma gravidade tal que mereça a eternidade de suplício. "De Deus não se zomba", dirá S. Paulo. E, de fato, Deus é muito sério.

Para terminar esta primeira exposição, cito uma frase que Ele falou para uma mística franciscana:

"Não foi para rir que eu te amei".

Fábio.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

"Por que é mais forte quem sabe mentir..." Não é.. só parece...


Não precisamos ser falsos com nós mesmos. Aliás, não devemos. Se é a verdade que liberta, importa abandonar a mentira, ainda quando, à primeira vista, ela indique uma espécie de proteção. Acontece que enquanto alguém se protege freneticamente, isto também o impede de se lançar de verdade em qualquer coisa. Um covarde passa a vida paralisado. É por isso que Jesus diz: "quem perder a sua vida, vai ganhá-la". Dar o passo! Há tanto egoísmo envolvido nessa covardia - e já tratei bastante disso - que não o quero pormenorizar aqui.

Por vezes, queremos expectadores de cada ato nosso, construindo um tipo de draminha da nossa existência, onde a gente possa garantir que ganhará alguns aplausos. Isso parece nos dar uma motivação extra para fazer as coisas. E tão logo encontramos a platéia, no meio dos nossos amigos, familiares ou quem seja, iniciamos também os showzinhos, os exageros, as demonstrações de força. Mas, sobretudo, é importante fazer barulho. Não se pode correr o risco de não sermos notados! Cada boa decisão, cada virtude posta em prática, tem de causar uma admiração de alguém. E nesse processo, choramos e rimos e fazemos caras de herói e trejeitos de artista.

Só que isso tudo não passa de uma palhaçada! Enquanto vamos crentes de causar admiração, a única resposta que causamos é um riso de diversão pela nossa trágica falta de senso. Se um sujeito passa a vida assim, talvez adquira o conforto de se imaginar uma espécime rara dentre os humanos, muito embora tenha vivido, na verdade, como um bobo. Enquanto se pensava tão sincero, suas intenções estavam atentas nas reações que causava nos outros, ou nas recompensas que podia adquirir pelo seu teatro. E inverte tudo: dificulta o que é fácil, e facilita o que é difícil, mas isto só aparentemente. Se lhes é pedido para erguer uma formiga, farão todo tipo de caretas no processo de levantamento e se certificarão de cair pelo menos umas três vezes a fim de intensificar o ato heróico final do soerguimento histórico. Se lhes pedem para correr a São Silvestre, a vaidade não lhe permitirá desistir no meio do processo e, embora cansado, quase tendo um ataque cardíaco, passará em frente à câmera com o rosto tranquilíssimo, ostentando um preparo que ele não tem. "Vaidade das vaidades", diz o Eclesiastes. E, no final, o sujeito estará seguro de que fez algo grandioso. Realmente: uma imbecilidade monumental.

É por isso que eu gosto tanto dos santos. Eles foram totalmente o oposto disso. Quem quer que conheça um santo a partir dele mesmo ou mesmo de outro, mas de uma forma profunda, verá que estas coisas vão sendo gradativamente abandonadas por eles. S. Josemaria dizia que os biógrafos dos santos são seus traidores, pois os santos nunca pretenderam ser muito conhecidos. Lembro-me de S. Pio de Pietrelcina que, quando recebera os estigmas, chorava copiosamente e dizia: "quero morrer com dor, sim! Mas anônimo..." Lembro-me de S. João da Cruz que pedia diariamente para morrer desprezado e, no final da vida, tendo de escolher entre dois mosteiros a ficar, escolheu o que por certo o maltratariam ao invés do outro em que seria aclamado. Lembro-me de S. Francisco de Assis e seus retiros prolongados no Alverne onde, sem expectadores, ele se dava aos maiores rigores. E tantos e tantos outros santos que se tornavam amigos de Cristo justamente porque abandonavam esta busca frenética e neurótica por vaidades e por reconhecimentos. A "Perfeita Alegria" de Francisco é justamente isto: ser desprezado, ser vilipendiado, ser maltratado e ver que isso não causa nenhuma repercussão interior, nenhuma revolta, nenhum coitadismo, nem nenhum senso de heroísmo, nenhuma encenação, nenhuma estratégia artística.

Que Nosso Senhor nos liberte da nossa pequenez disfarçada de grandeza. De um monte de fezes pode-se imitar uma montanha. Que Deus nos livre da encenação barata que, como se não bastasse ser perda de tempo,  nos impede de ser quem somos e nos ameaça de perder a eternidade.

Que a Virgem nos conduza.

domingo, 7 de agosto de 2011

Desiderio Del Cielo - Sta Teresa

3º Mistério Gozoso - O Nascimento de Jesus na gruta de Belém


"Ave, que a estrela perene geraste"
Ave, és aurora do Místico dia!
Ave, que a forja do engano extinguiste!
Ave, os mistérios de Deus iluminas"

Akatistos, Ikos V


Neste Mistério, contemplamos o nascimento de Nosso Senhor quando, por ocasião do recenseamento, José e Maria tiveram de viajar para Jerusalém. No meio do caminho, quando passavam por Belém, completaram-se os dias da gravidez de Maria e, notando-o, José procurou conseguir um lugar nalguma hospedaria. No entanto, onde quer que batesse, escutava sempre o mesmo: "Não há lugar aqui para vós".

Há um gênero literário bíblico que se chama "Midrash". Nele, os escritores esboçam, já no nascimento de um grande sujeito, algo do que ele será futuramente. Aqui, nós temos, no nascimento de Cristo, uma série de antecipações de coisas que é bom compreender. Desde o início, Ele será rejeitado, conforme diz a Escritura: "Ele veio para os seus, mas os seus não o receberam". Os homens estavam ocupados demais com os seus trabalhos, embotados de preocupações terrenas, fechados ao Mistério de tal modo que, ainda quando Ele bateu em suas portas, eles não o reconheceram e, portanto, não o receberam.

No entanto, é verdade que os homens encontram sua alegria em Deus. Portanto, aquela distração em ocupar-se somente com as coisas nas quais se importavam os afastava, concretamente, da alegria. Que honra teria sido hospedar aquela família! Eles não O reconheceram. Afinal, era uma noite aparentemente comum e nada de extraordinário se insinuava naquele homem que pedia abrigo.

Isto me faz lembrar de duas coisas. Primeiramente, de Elias que reconheceu a presença de Deus numa brisa suave. Soprou a brisa e Elias cobriu o rosto. Deus é discreto, é simples e não gosta de chamar a atenção. É muito amigo do silêncio e da humildade. Só que, para notar essas coisas, é preciso sair do frenético do dia-a-dia. Contemplar o silêncio implica pôr-se em silêncio. Aqueles homens da hospedaria estavam ocupados demais: "Não há lugar para vós".

Depois, quantas vezes teremos sido, nós mesmos, estes maus hospedeiros! Quantas vezes Jesus poderá ter batido em nossa porta e nós não O teremos reconhecido! Ocupados demais com as nossas bagatelas, com o draminha da nossa vida, ou preocupados demais com a aparência ou o cheiro deste que veio. "Não, não pode ser Ele". Como desconhecemos a Nosso Senhor! E como, por diversas vezes, estamos fechados ao Mistério. É precisamente este o sentido autêntico do que Jesus diz no Sermão da Montanha: "Ai de vós que rides", isto é, ai de vós que vos distraís com vossas coisinhas, fechados em vosso egoísmo, e desprezais as visitas que o Mistério vos faz. E, crentes de nossa bondade, nós perpetuamos o "não há lugar aqui para vós".

Nosso Senhor foi rejeitado desde o início. Nem havia ainda nascido, os homens já lhe negavam lugar em seu meio. E, no entanto, a Escritura nos diz que a alegria de Jesus era habitar no meio dos homens. Jesus não desiste e ama os homens de tal maneira que se exila com eles. E é, aí, feliz. Tem esperança de despertar-nos da nossa letargia.

José não conseguiu hospedagem. Voltando ao lugar onde estava sua Esposa, uma gruta em Belém, Jesus já era nascido e chorava sobre uma manjedoura. Primeiro, vejamos um ponto muito interessante. Toda aquela situação parecia muito inusitada, parecia algo meio caótico, uma coisa meio desesperadora. Ninguém poderia supor uma participação divina naquilo. Ao contrário, parecia talvez um descuido e era muito fácil lamentar-se, pensando ser obra do acaso. No entanto, a Escritura nos diz: "E nasceu em Belém para que se cumprissem as Profecias". De novo, Deus é discreto. Teríamos muito maior facilidade de acreditar a atuação divina se José tivesse encontrado uma hospedaria muito particular, ornada de ouro, e animada pelos músicos mais habilidosos da antiguidade. No entanto, a vontade divina se revela justamente aqui, onde o baixo parecer humano apenas teria motivos de lamentar. Que frescura temos nós de reduzir Deus aos nossos critérios! Afirmamos teologicamente que Ele é infinito, mas quase não O aceitamos sê-lo no real.

Ter nascido em Belém ainda nos revela algumas coisas muito interessantes. Belém, cujo nome original é Bethlehem, significa "Casa do Pão". Nenhum lugar mais adequado para Aquele que será o "Pão Vivo que desceu do Céu", o "Verdadeiro Maná", tantas vezes prefigurado nas Escrituras. Depois, Jesus foi posto numa manjedoura, que é justamente um lugar onde se coloca a comida dos animais. E faziam-Lhe companhia um boi e um jumentinho, e isto nos remonta a Isaías, onde se lê: “O boi conhece o seu dono, e o jumento o presépio do seu senhor, mas Israel não me conheceu” (Is. I, 3) Coisa admirável!

Deus nascia! E vinha como um indefeso e inofensivo infante. Naquela noite, Seu chorinho rompeu o silêncio e, junto a Ele, cantavam talvez uns grilos e... mais nada. Silêncio. Nasceu pobre,  porque assim foi do Seu agrado, Ele que será o Esposo da Pobreza desde o início. Foi pobre, não porque nada tivesse, pois nunca deixou de ser Deus e de ser Rei, mas foi pobre porque tudo deu. "Amou-nos ao extremo", dirá João, o Apóstolo que se reclinava no Seu coração.

Era comum e extraordinário! Era Deus e homem! O saudoso prof. Orlando Fedeli fazia notar que, como homem, nascera de Mulher; como Deus, nascia de uma Virgem e não lhe rompia a Virgindade, assim como quando, depois de ressurreto, entrava no Cenáculo estando as portas fechadas. Como criança humana, não sabia andar. Como Deus, movia a estrela. Mais tarde, como homem, dormirá num barco. Como Deus, despertado, ordenará que o mar se acalme. Este é Jesus que, agora, dorme nos braços da Virgem. O Amante da pobreza, o Coração que tanto amou o mundo, o Pão que veio nos saciar a fome.

Jesus foi ainda visitado por dois grupos: um de pastores, e outro de reis. Os pastores, avisados pelos anjos, vieram adorá-Lo e reconheciam n'Ele Aquele que será o Verdadeiro Pastor, Aquele que dirá: "As minhas ovelhas conhecem a minha voz". É este quem guiará as ovelhas perdidas aos pastos onde mana leite e mel, e saberá deixar as noventa e nove em segurança para ir buscar aquela única que se extraviou, e a trará sobre os ombros.

Também os reis o visitaram, reconhecendo n'Ele a verdadeira Majestade, e O adoraram. S. Pedro Julião Eymard, comentando sobre esta visita, ensina que o amor quer, por força, imitar o que se ama. Também os reis magos, contemplando a Suma Majestade rebaixada daquele modo, quereriam, eles também, rebaixar-se até as entranhas da terra, se pudessem, a fim de imitar-Lhe a humildade. E Lhe presentearam com Ouro, Incenso e Mirra.

O ouro, ornamento de reis, testemunhava que a realeza de Jesus não era algo imputado por outro, mas algo que lhe pertencia por Natureza. 

O incenso representa a divindade de Jesus que, sob a forma de criança, sustentava a existência do mundo. Não obstante dormisse ou chorasse, Aquele era o Onipotente. O incenso representa ainda os cultos e sacrifícios antigos que, aqui, têm o seu término, cedendo lugar para o Verdadeiro Deus.

A Mirra, uma erva amarga, fala da vida do Cristo que, assumindo a condição do escravo, viverá na pobreza, na privação, "sem ter onde reclinar a cabeça", e, por fim, morrerá sobre o lenho da Cruz, humilhado, escarnecido e desprezado pelos seus. Este traço do Cristo resignado não deve ser visto somente no Calvário. Na verdade, ele acompanhará toda a vida do Cristo e Lhe será grande cruz, dirá Sta Teresa D'Avila, amar tanto os homens e, ao mesmo tempo, contemplar-lhes, até o fundo da alma, as crueldades, hipocrisias e pecados. Cristo será o "amigo das dores e do sofrimento" de que falou Isaías.

Agora, porém, Ele dorme. É noite, faz frio e o mundo parece todo em silêncio, como cuidadoso de não acordá-Lo. A Virgem e José O adoram, admirados de tudo isso.

Por este mistério, peçamos a Nosso Senhor, pela intercessão da Virgem Santíssima, o desprezo das honrarias humanas, o amor da pobreza e a graça de nos esvaziarmos para que possamos estar sempre abertos ao Mistério.

"Sei que gostais de vir sem ser notado... 
Mas o coração puro, de longe, Senhor, vos perceberá."
Sta Faustina

Fábio

sábado, 6 de agosto de 2011

Tudo é bom perto de TI - Beato Frei Tito Brandsma

S. Bernardo de Claraval e o Cristo

“Ó Jesus, quando te contemplo,
Eu redescubro, a sós contigo,
Que te amo e que teu coração
Me ama como a um dileto amigo.

Ainda que a descoberta exija
Coragem, faz-me bem a dor:
Por ela me assemelho a ti
Que ela é o caminho redentor.

Na minha dor me rejubilo:
Já não a julgo sofrimento,
Mas sim predestinada escolha
Que me une a ti neste momento.

Deixa-me, pois, nessa quietude,
Malgrado o frio que me alcança.
Presença humana não permitas,
Que a solidão já não me cansa,

Pois de mim sinto-te tão próximo
Como jamais antes senti.
Doce Jesus, fica comigo,
Que tudo é bom junto de ti”.


Esta oração foi escrita pelo beato Frei Tito Brandsma, na passagem do dia 12 para 13 de fevereiro de 1942, na prisão de Scheveningen. Tradução de Lacyr Schettino, terceira carmelita.

Fonte: Vox Silencio

2º Mistério Gozoso - Maria visita sua prima


No mistério anterior, vimos como Maria abandona-se à vontade divina, de modo pleno, e que isto lhe possibilita assumir em seu bendito ventre o Verbo divino, desposada que foi pelo Espírito Santo.

Pois bem. Aqui veremos que, tão logo assume em si o próprio Deus e toma conhecimento de ser objeto da predileção divina, Maria não se põe a descansar, olhando o mundo como de cima para baixo. Não. Neste mistério, contemplamos que a mesma Maria que se disse "Ancilla Domine", permanece no seu ministério de serviço e, sabendo da gravidez de sua prima, uma senhora já de idade, a Virgem ruma para sua casa, enfrentando uma longa distância. A sede de servir na sua alma era grande, pois, além de ser agraciada com todas as virtudes, Maria trazia consigo o próprio Deus, Aquele mesmo que disse: "eu não vim para ser servido, mas para servir". Oh bem aventurada disposição esta que não considera nada como pesado. "Se te pedirem para andar mil passos, anda dois mil". Vazia de si mesma, Maria era plenamente revestida de Deus, era a Gratia Plena, a Kecharitomene (1), um oceano de bondade e de todas as demais virtudes.

E lá vai Maria. Sob o corpo talvez franzino daquela menina, um abismo de Mistério e, naquele ventre, o Altíssimo. Chega Maria na casa de sua prima e, ao ouvir a sua saudação, Isabel sente a criança em seu ventre, cujo nome será João, estremecer. A voz de Maria, vazia de si e rendida a Deus, torna-se suficiente para que o Espírito Santo preencha Isabel e santifique a criança no seu ventre. Aqui se realiza o que, mais tarde, este mesmo João irá dizer: "O amigo do Esposo se alegra ao ouvir a Sua voz". É ainda o mesmo que é descrito no livro dos Cânticos quando o Amado, ainda que sem se deixar ver, faz que a esposa note a Sua presença por trás da porta e, apenas isso, faz que a alma da esposa estremeça. Oh Virgem Santíssima que és a Porta Coeli, a Porta do Céu. Feliz o que te encontra e ouve a tua saudação. Feliz foi Isabel que, ao ouvi-la, exclamou: "De onde me vem a honra de que a Mãe do Meu Senhor me venha visitar?". Oh Maria, és como que o transporte divino, pois Deus vem a nós por meio de ti e é também por meio de ti que iremos a Ele.

De onde me vem a honra de que sejas minha Mãe? Certamente, não vem de mim mesmo. Mas do teu Filho, Deus feito carne, que, assumindo a nossa humanidade e tocando a nossa dor, elevou-nos e mereceu-nos tão inestimável dom. És uma digna mãe de Deus, já dizia um santo. E este Deus curou a nossa orfandade confiando-nos aos teus cuidados. Que honra! E, então, Maria canta:

"Minha alma engrandece o Senhor 
e meu espírito se transporta em santa alegria em Deus meu Salvador.
Porque pôs os olhos em sua humilde escrava; por isso todas as gerações me chamarão bem-aventurada.
Grandes maravilhas obrou comigo o Onipotente, cujo nome é santo.
Cuja misericórdia se estende de geração em geração em todos os que o temem.
Assim ostenta o poder de seu braço, transtorna os desígnios dos soberbos.
Derruba os poderosos do seu assento, e exalta os humildes.
Enche de bens os necessitados e os ricos deixa vazios.
Decretou exaltar Israel seu povo, lembrando-se de sua misericórdia.
Para cumprir a promessa que fez aos nossos pais, Abraão e a todos os seus descendentes."

Feliz, mãe, mil vezes feliz os que a ti se confiam e imitam o vosso abandono, se fazem vossos escravos e encarnam em si mesmos o Verbo que levaste em vosso seio.

Ave, mistério, vontade inefável!
Ave, ó fé maturada em silêncio!
Ave, prelúdio dos fastos de Cristo!
Ave, sumário do Santo Evangelho!

Akatistos, Ikos II


Fábio.

(1) Kecharitomene - termo grego usado pelo Arcanjo Gabriel em sua visita à Virgem Maria e que significa "plena de todas as graças de modo atemporal, isto é, desde o início da sua existência e para sempre".

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Que religião é a Católica


"Convém acostumar-vos a considerar o Evangelho sob o seu verdadeiro ponto de vista e saber que a nossa religião é toda de sofrimento, de mortificação, de sacrifício, de amor consumidor, de zelo que se esquece a si mesmo, e de união que se crucifica. Numa palavra, é a religião da Cruz e do Crucificado. Compenetrai-vos bem dessa verdade, que tanto repugna à natureza, de que a abnegação lhe constitui a essência, e que a abnegação deve ser diária, não somente para que possamos ser perfeitos, mas ainda para que possamos ser discípulos de nosso amado Senhor."

Pe. Faber

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Sabeis o que é ser espiritual deveras?


Sta Teresa D'Avila

"Olhai que isto importa muito mais do que eu vos saberei encarecer. Ponde os olhos no Crucificado e tudo se vos fará pouco. Se Sua Majestade nos mostrou o Seu amor com tão espantosas obras e tormentos, como quereis contentá-Lo só com palavras? Sabeis o que é ser espiritual deveras? É fazer-se escravos de Deus, para que, marcados com o Seu ferrete que é a cruz, pois já Lhe deram a sua liberdade, os possa vender por escravos de todo o mundo, como Ele o foi; e não lhes faz nenhum agravo nem pequena mercê. E se a isto não se determinam, não haja medo que aproveitem muito, porque de todo este edifício - como já se disse - é seu fundamento a humildade; e se não há esta muito deveras, até para vosso bem não quererá o Senhor subi-lo muito alto, para não dar com tudo em terra. Assim, irmãs, para que leve bons alicerces, procurai ser a menor de todas e sua escrava, vendo como ou em que as podeis servir e dar-lhes prazer; pois, o que fizerdes neste caso, o fazeis mais para vós do que para elas, pondo pedras tão firmes, que não vos caia o castelo."

Castelo Interior.

1º Mistério Gozoso - A anunciação do Anjo Gabriel à Virgem Maria e a Encarnação do Verbo


Pretendo escrever uma série de posts a respeito dos mistérios do terço que serão tão somente meditações pessoais. Afirmo desde já que incluirei também os mistérios luminosos, embora alguns não os considerem válidos. Nestes pontos em que não há perigo contra a Fé, minha atitude é, obviamente, de obediência.

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Neste mistério nós contemplamos a ocasião em que o Anjo Gabriel visitou a Virgem Maria, então adolescente, na pequena cidade de Nazaré. Como sabemos, a Virgem Maria é chamada de Nova Eva, enquanto o Cristo é chamado o Novo Adão. Assim como Adão e Eva são os primeiros humanos existentes na ordem da natureza, Jesus e Maria são os primeiros na ordem da Graça. Eles como que recapitulam a humanidade. 

Em se tratando de Eva, o anjo Lúcifer, caracterizado pela serpente, animal de língua partida representando sua duplicidade e cujo andar se faz em forma de zigue-zague mostrando que o seu caminho não é reto, vai a ela e lhe seduz com uma mentira. Eva, aceitando a sugestão maligna, toma do fruto proibido e o dá a Adão. Por meio de ambos, entra a morte no mundo, a partir da desobediência. O próprio Lúcifer era um anjo rebelado que, à proposta divina, gritou asquerosamente: "não sirvirei". Esta é a gênese de todo pecado: a não aceitação do projeto divino, a não obediência a Deus. Na ocasião do pecado de Eva, esta somente caiu no engodo do demônio porque duvidou de Deus, pois, enquanto Deus lhe havia dito que morreria ao tomar do fruto proibido, a serpente lhe havia dito: "não, não morrerás".

Quando olhamos para Maria, a Nova Eva, vamos percebendo as perfeitas analogias, como que a corrigir o antigo erro. É também um anjo que vai a ela; só que desta vez, é um anjo de Deus, Gabriel, a força de Deus, demonstrando que a verdadeira força está, não na rebeldia, mas na obediência. Maria escuta a proposta do anjo e, muito ao invés do "non serviam" demoníaco, Maria apenas diz: "Fiat mihi secundum Verbum tuum" - Faça-se em mim segundo a sua Palavra". Faça-se! Eu aceito! Eu servirei!

Ao contrário de Eva que quis ser deusa sem Deus, Maria se diz a escrava: "Ecce ancilla Domine" - eis a escrava do Senhor. Em Eva, rebeldia; em Maria, abandono de si. Maria se insere, portanto, na tradição de Abraão, o pai da Fé, aquele que acreditou sem ver a terra que Deus lhe indicara. Também Maria não fez questão de esclarecimentos, ainda que, à primeira vista, uma gravidez, na sua cultura, poderia ter lhe causado o repúdio de José, seu noivo, como até o seu apedrejamento. Maria simplesmente aceita, porque a mensagem provém do próprio Deus, aquele que não mente! "Felizes os que crêem sem ter visto", dirá o Verbo mais tarde. Que diferença de Eva!

E, no Sim de Maria, o Verbo divino vem encarnar-Se em seu seio, pois Maria demonstrava ter as perfeitas disposições de alma que se requeria e era, já em virtude dos méritos da Paixão, totalmente isenta de qualquer pecado, e agraciada com todas as virtudes. Diz-se dela que é a aurora que prenuncia a luz do sol ainda quando este não surgiu. E Maria deu ao mundo o fruto da vida.

E o Verbo se fez carne e habitou no seio da Virgem Santíssima. Fez-se homem o Onipotente e foi gerado no ventre desta nova Eva Aquele que é incriado. Realiza-se aqui aquilo que S. Paulo descreve: "Não se prevaleceu de Sua igualdade com Deus, rebaixando-Se e tomando a forma de escravo". Assumiu a condição humana e assumiu-a perpetuamente. Ao fazê-lo, sem fim a elevou. Ao contrário do antigo Adão, que também cedeu à soberba -Superbia - da serpente, o novo Adão distingue-se sobretudo por Sua humildade. Ei-lo recluso por nove meses no ventre santíssimo da Virgem, como um Rei em seu leito particular. Ei-lo submisso... Dizia-nos Santa Catarina de Sena que, ao contemplar a humildade do Verbo divino, nós, os homens, deveríamos chorar de vergonha por nossa vaidade.

Por meio deste mistério, e pela intercessão de Maria Santíssima, conceda-nos o Senhor uma grande docilidade para conSigo, o expurgo de toda revolta da nossa alma e uma profunda humildade. Serviam!


"Foi um anjo orgulhoso, entre esplendores,
Que disse: "Nunca irei obedecer!"
Mas grito, na noite desta vida,
Quero obedecer sempre na terra."
Sta Teresinha de Lisieux

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Mais algumas da Giuni Russo

Giuni Russo é uma cantora que eu conheci já há algum tempo. Deve fazer um ano e meio, dois, algo assim. E é alguém com que eu simpatizei rápido. Como podem ver, é uma cantora italiana, e já é falecida. Além da sua voz que, embora haja quem não goste, eu considero belíssima, ela tem uma grande particularidade que contribuiu, sem dúvida, para que eu me detivesse a escutá-la. A Giuni teve contato com as obras de Sta Teresa D'Avila e S. João da Cruz, o que provocou a sua conversão. Muitas das suas músicas, a partir daí, são poesias carmelitas ou, ao menos, inspiradas nelas. Abaixo, disponibilizo algumas. Pax.






















Deus lhe salve, Giuni.

Tu me moves, Senhor

Acima, uma bela música da cantora Giuni Russo
**

Não me move, Senhor, para amar-Te
O Céu que me prometeste
Nem me move o inferno tão temido
Para deixar, por isso, de ofender-Te

Tu me moves, Senhor,
Move-me ver-Te
Pregado em uma Cruz e escarnecido
Move-me ver Teu corpo e Tua morte

Move-me, enfim, o Teu amor
e de tal maneira, 
Que ainda que não houvesse Céu eu Te amaria,
E ainda que não houvesse inferno Te temeria.

Nada tens que dar-me para que eu Te queira,
Pois mesmo que eu não esperasse o que espero,
O mesmo que Te quero, te quereria

Poesia Anônima, Frequentemente atribuída a Sta Teresa D'Avila

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

A Escuridão me Basta - Poesia Texto


"Senhor, é quase meia-noite e estou Te esperando na escuridão e no grande silêncio.
Lamento todos os meus pecados.
Não me deixe pedir mais do que ficar sentado na escuridão, 
sem acender alguma luz por conta própria, nem me abarrotar com os próprios pensamentos
 para preencher o vazio da noite na qual espero por Ti.
Deixa-me virar nada para a luz pálida e fraca dos sentidos, 
a fim de permanecer na doce escuridão da Fé pura.
Quanto ao mundo, deixa-me tornar-me para ele totalmente obscuro para sempre. 
Que eu possa, deste modo, por esta escuridão, chegar enfim à Tua claridade.
Que eu possa, depois de ter me tornado insignificante para o mundo, 
estender-me em direção aos sentidos infinitos, contidos em Tua paz e Tua glória.
Tua claridade é minha escuridão. 
Eu não conheço nada de Ti e por mim mesmo nem posso imaginar como fazer para Te conhecer.
Se eu te imaginar, estarei errado.Se Te compreender, estarei enganado.
Se ficar consciente e certo que Te conheço, serei louco.
A escuridão me basta".

Thomas Merton, OCSO