O medo é uma atitude interna
de repulsa de algo em função de uma previsibilidade, ou seja, o medo não é uma
resposta a um desprazer atual, mas é a antecipação de um desprazer futuro,
iminente ou não. Quando ele ocorre, muda a dinâmica interior da alma, excluindo-a
de seu porte natural e a põe em defensivo. Neste ato, a alma se enrijece,
abandona sua espontaneidade, recorta o real focando sua possível ameaça, e
interpreta todas as demais coisas em função desta sua suposta ameaça. O real,
antes uno, é agora dividido e se estabelece uma assimetria entre os níveis. O
objeto temido é retirado de seu contexto, motivo pelo qual a sua consideração
objetiva é, de algum modo, impedida, pois ele somente adquire sentido completo
justamente no contexto de que faz parte originariamente. Assim sendo, o medo
gera forçosamente uma interpretação viciada do objeto temido. A alma cai, em
algum grau, em ilusão e se nela acredita é como se fugisse de fantasmas
inexistentes criados por ela mesma.
Essa ilusão, contudo, não precisa
ser total. Ela comumente se dá em parte. Mas seu grau é diretamente
proporcional à irracionalidade da sua natureza, isto é, à sua intensidade a
priori. É a priori porque, sendo necessariamente antecipação, não pode provir
da experiência – ao menos, não da experiência do objeto temido atualmente. Este
medo pode ser repercussão de experiências anteriores, é verdade. Mas
experiências anteriores, embora possam ser ditas semelhantes, não são iguais e
não são a mesma que agora se teme, de modo que a correspondência entre uma e
outra pode consistir em mera arbitrariedade. Outra coisa, porém, é quando a
situação temida o é, não por desconforto sensível, mas por princípio racional.
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