quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

No princípio era o Verbo.



"No princípio era o Verbo". O Verbo, o Logos, é, ao mesmo tempo, Pensamento e Palavra: em si, Ele é o Intelecto divino, o "lugar dos possíveis". Em relação a nós, Ele se manifesta e se exprime pela Criação, na qual se realizam, na existência atual, alguns desses possíveis que, enquanto essências, estão contidas Nele desde toda a eternidade. A Criação é obra do Verbo. Ela é também, por isso mesmo, sua manifestação, sua afirmação exterior. Por isso, o mundo é como uma linguagem divina para aqueles que sabem compreendê-la: Caeli enarrant gloriam Dei (Sl 19,2). Desse modo, o filósofo Berkeley estava certo ao afirmar que o mundo é "a linguagem que o Espírito infinito fala aos espíritos finitos". Todavia, ele não tinha razão ao acreditar que essa linguagem é apenas um conjunto de sinais arbitrários, já que, na realidade, nada existe de arbitrário na linguagem humana, onde toda significação deve ter, na origem, seu fundamento em alguma conveniência ou harmonia natural entre o signo e coisa significada. Por ter recebido de Deus o conhecimento da natureza de todos os seres vivos é que Adão pode dar-lhes os nomes (Gn 19-20). Todas as tradições antigas concordam ao ensinar que o verdadeiro nome de um ser estabelece uma unidade com sua natureza ou sua própria essência.

Se o Verbo é Pensamento no interior e Palavra no exterior, e se o mundo é o efeito da Palavra divina proferida na origem dos tempos, a natureza toda pode ser tomada como um símbolo da realidade sobrenatural. Tudo o que existe, sob qualquer forma que seja, por ter seu princípio no Intelecto divino, traduz ou representa esse princípio à sua maneira e segundo sua ordem de existência. Assim, de uma ordem à outra, todas as coisas se encadeiam e se correspondem, concorrendo para a harmonia universal e total, que é como um reflexo da própria Unidade divina.

René Guénon, O Verbo como símbolo

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