Vivemos hoje num ritmo frenético. O dia parece curto para tantas atividades, projetos, leituras, etc. E no meio desse furacão de coisas, nós pensamos que não há tempo para fazer tudo sem a devida pressa. A rapidez na execução dos trabalhos seria um modo de não perder tempo, de fazê-los com total objetividade e de aproveitar o máximo possível a demanda, pois também temos pressa de crescer e queremos gozar das benesses de tanta dedicação.
Porém, isto é uma ilusão. Só é possível aproveitar o que fazemos e fazê-lo bem feito se nos detemos no momento em que tais atividades existem, isto é, no momento presente. A pressa, ao contrário, não é o deter-se no que se faz, mas, ao contrário, é uma espécie de fuga do que se faz, para que termine logo e então possamos ser liberados para a próxima atividade, com a suposição de que os efeitos de um trabalho bem feito nos acompanharão. Desse modo, a nossa atenção apenas toca superficialmente aquilo a que estamos cenicamente nos dedicando e concentra-se na expectativa de um futuro que ainda não existe. Assim, toda a nossa pressa e a nossa sede de crescimento ficam a repousar numa fantasia - o futuro - e que nunca deixa de ser tal, pois, tão logo o futuro nos chegue, a nossa expectativa já terá elegido um outro futuro.
Assim, nunca aproveitamos o que fazemos. Nunca damos o tempo necessário para a meditação, para a reflexão de um texto e o entendimento das consequências de seus conceitos e a identificação das suas premissas, ou para o acompanhamento contemplativo de um trabalho. Viramos autômatos com a pretensão de uma educação profunda e vasta e de larga experiência pelo tanto de atividades que executamos.
É preciso, pois, retirar da alma esta tensão que nos puxa sempre para a zona do não existente que é este futuro preconcebido. Devemos nos ater ao presente e isto sem pressa. Respeitar o que fazemos é consagrar a nossa atenção àquilo, e a consagração é sempre um ato de separação: saber eleger o agora como o momento mais importante e o único em que podemos efetivamente agir.
Os santos compreendiam bem isto e por este motivo operavam com máxima objetividade, ainda que a luz de sua perspectiva proviesse do amanhã da eternidade. Este amanhã, porém, diferente do nosso "futuro" é algo mais presente que o nosso presente e, por isso, dotado de uma existência tão densa que influi no nosso agora ao ponto de ressignificá-lo.
Dizia Sta Teresinha de Lisieux: "Para amar-Vos, oh meu Deus, tenho somente hoje". O ato da verdade, portanto, concentra-se no agora à luz da eternidade. A fuga desse agora, ao contrário, vem da soberba que esconde, na pressa febril, o desejo de abarcar dentro do seu poder toda a história pessoal, ao ponto de obter total controle dela, gozando maximamente dos seus bens, esquivando-se dos seus pesos e tudo isso autossuficientemente. Mesmo quando Deus é incluído como favor motivante desse processo, Ele tende a ser reduzido a mero pretexto, a figurante que será evocado pela nossa consciência quando for preciso se autojustificar.
O que existe é o presente e a nossa vida deve estar ancorada na realidade. Expurguemos a pressa da nossa alma e ponhamos a nossa atenção, de modo calmo e respeitoso, no agora. Isso não impossibilita o fazer projetos; ao contrário, se queremos que os nossos projetos tenham consistência, então devemos cuidar para que as suas bases sejam postas já hoje, porque, seja lá o que projetemos no futuro, isso somente se efetivará quando tornar-se presente. Dedicar-se, portanto, ao agora converte-se ironicamente na melhor forma de não perder tempo, o que é bastante óbvio já que é a pressa que nos faz desperdiçar os instantes nos quais efetivamente poderíamos fazer alguma coisa de modo mais completo e perfeito.