O homem deve encontrar Deus com tudo o que ele é, pois Deus é o Ser de tudo; é esse o sentido da injunção bíblica de amar a Deus 'com todas as nossas forças'.
Ora, uma das dimensões que caracterizam o homem de facto é que ele vive para o exterior e, mais ainda, tende aos prazeres; é o que chamamos de exterioridade e concupiscência. Ele deve renunciar a elas em face de Deus, pois, em primeiro lugar, Deus está presente em nós mesmos e, em segundo, o homem deve poder encontrar prazer em si mesmo e independentemente dos fenômenos sensoriais.
Mas tudo o que nos aproxima de Deus tem por isso mesmo sua beatitude; elevar-se, orando, acima das imagens e dos ruídos da alma é uma libertação pelo Vazio divino e pela Infinitude; é a estação da serenidade.
É verdade que os fenômenos exteriores, por sua nobreza e seu simbolismo - ou sua participação nos Arquétipos celestes - podem ter uma virtude interiorizante, e toda coisa pode ser boa a seu tempo; isso não impede que se deva realizar o desapego, sem o que o homem não tem direito à exterioridade legítima, e sem o que ele cairia numa exterioridade sedutora e numa concupiscência mortal para a alma. Assim como o Criador, por sua transcendência, é independente da criação, também o homem deve ser independente do mundo em vista de Deus. É esse apanágio do homem que é o livre-arbítrio; só o homem é capaz de resistir a seus instintos e desejos. Vacare Deo.
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Outro apanágio do homem é o pensamento racional e a palavra; esta dimensão deve, por consequência, atualizar-se quando deste encontro com Deus que é a oração. O homem não se salva apenas pela abstenção do mal, ele se salva também, e a fortiori, pelo cumprimento do Bem; ora, a melhor das obras é aquela que tem Deus por objeto e o nosso coração por agente, ou seja, a "lembrança de Deus".
A essência da oração é a fé, portanto a certeza; o homem a manifesta precisamente pelo discurso, ou pelo apelo, dirigido ao Sumo Bem. A oração, ou a invocação, é igual à certeza de Deus e de nossa vocação espiritual.
A ação vale pela intenção; é evidente que não deve haver na oração nenhuma intenção tingida por qualquer ambição; ela deve ser pura de toda vaidade mundana, sob pena de provocar a Cólera do Céu.
A oração íntegra é proveitosa não só para aquele que a realiza, ela irradia-se também à sua volta, e sob este aspecto ela é um ato de caridade.
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Todo homem está em busca da felicidade; eis outra dimensão da natureza humana. Ora, não há felicidade perfeita fora de Deus; toda felicidade terrestre tem necessidade da bênção do Céu. A oração nos coloca em presença de Deus, que é pura Beatitude; se temos consciência disso, encontraremos nela a Paz. Feliz o homem que tem o senso do Sagrado e que abre assim seu coração para este mistério.
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Outra dimensão da oração resulta do fato de que, por um lado, o homem é mortal e, por outro lado, tem uma alma imortal; ele deve passar pela morte e, sobretudo, deve preocupar-se com a Eternidade, que está nas mãos de Deus.
Neste contexto, a oração será ao mesmo tempo um apelo à Misericórdia e um ato de fé e de confiança.
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O apanágio fundamental do homem é uma inteligência capaz de conhecimento metafísico; por consequência, esta capacidade determina necessariamente uma dimensão da oração, que coincide então com a meditação; o tema desta é, em primeiro lugar, a realidade absoluta do Princípio Supremo e, depois, a não-realidade - ou a realidade relativa - do mundo, que o manifesta.
Contudo, o homem não deve utilizar intenções que superam sua natureza; se não é um metafísico, ele não deve sentir-se obrigado a sê-lo. Deus ama as crianças como Ele ama os sábios; e Ele ama a sinceridade da criança que sabe permanecer criança.
Em outras palavras, há, na oração, dimensões que se impõem a todo homem, e outras que ele pode, por assim dizer, saudar de longe; pois o que importa nesta confrontação não é que o homem seja grande ou pequeno, é que ele se coloque sinceramente em face de Deus. Por um lado, o homem é sempre pequeno em face de seu Criador; por outro lado, há sempre grandeza no homem quando ele se dirige a Deus; e, em última análise, toda qualidade e todo mérito pertencem ao Sumo Bem.
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Há uma dimensão da oração meditativa, dissemos, cujo tema é a realidade absoluta do Princípio; e depois, correlativamente, a não realidade -ou a menor realidade - do mundo, que o manifesta.
Mas não basta saber que "Deus é a realidade, o mundo é a aparência"; é preciso saber também que "a alma não é senão Deus". Esta segunda verdade nos lembra que nós podemos, se nossa natureza o permite, tender para o Princípio Supremo não somente em modo intelectual, mas também em modo existencial; o que resulta do fato de que nós possuímos, não somente a inteligência capaz de conhecimento objetivo, mas também a consciência do eu, que é capaz, em princípio, de união subjetiva. Por um lado, o ego está separado da Divindade imanente pelo fato de que ele é manifestação, não Princípio; por outro lado, ele não é senão o Princípio enquanto este se manifesta; assim como o reflexo do Sol num espelho não é o Sol, mas não obstante "não é senão ele" enquanto ele - o reflexo - é a luz solar e nada mais.
Consciente disso, o homem não cessa de se postar diante de Deus, que é ao mesmo tempo transcendente e imanente; e é Ele, e não nós, que decide quanto à envergadura de nossa consciência contemplativa e ao mistério de nosso destino espiritual. Sabemos que conhecer Deus unitivamente significa que Deus mesmo se conhece em nós; mas não podemos saber em que medida Ele quer realizar em nós essa divina Consciência de Si; e não tem importância que o saibamos ou não. Nós somos o que somos, e tudo está nas mãos da Providência.
Frithjof Schuon, Transfiguração do Homem
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