sábado, 14 de janeiro de 2012

Pecado, Culpa, Humildade, Amor


Numa de suas meditações, Santa Julian de Norwich afirma que, quando pecamos, a angústia que experimentamos já é parte da punição, isto é, da pena. Para nós, que temos vasta experiência com o pecado, fica claro, porém, que há um lance bastante pessoal no que sentimos e é aí que justamente podemos levar uma rasteira. Quer dizer, o que quer que experimentemos, não significa exatamente que foi enviado por Deus, mas pode ser tão somente uma resposta subjetiva nossa com relação à nossa traição. Este é um assunto delicado.

O ponto do remorso, por exemplo, parece assemelhar-se ao arrependimento, mas é comum que a culpa  subjetiva - digo 'subjetiva' para diferenciá-la daquela outra que é uma consequência 'objetiva' do pecado e que se ordena à dimensão espiritual, estando a pena, ao contrário, restrita ao âmbito físico - exista desacompanhada de qualquer projeto de emenda. Neste caso, ela é nociva. Aliás, como o remorso costuma ser alimentado por nós mesmos, é comum que adotemos outras práticas pecaminosas como modo de distração do próprio remorso, o que gera um ciclo contínuo: 1- Peco. 2- Sinto remorso. 3- Peco de novo para me distrair do remorso. 4- Sinto remorso pelo novo pecado... etc... etc... Neste processo, é comum que o sujeito vá desacreditando de que a virtude lhe esteja acessível, ou da própria existência da virtude.

Por vezes, contudo, nós é quem não nos perdoamos e, por causa do pecado, não aceitamos retomar a intimidade que tínhamos antes com Deus. Sta Teresa D'Avila passou longos anos neste engodo, nesta falsa humildade que, mais tarde, reconheceu ser de inspiração demoníaca.

O monge Tadej dizia que o fato de repetirmos certos pecados pode ser um indício de que nós não nos perdoamos deles. Isto é bastante interessante e coerente se percebermos que, muito frequentemente, o que nos incomoda no fato de pecarmos não é que tenhamos ofendido a Deus, mas que nos tenhamos descoberto imperfeitos. Ora, uma pessoa que faça da santidade qualquer coisa de cosmético, obviamente terá de levar inúmeras quedas, para que aprenda. Uma ilusão não apenas engana, mas também impede a continuidade da busca. Para que a verdade seja encontrada, ela precisa ser buscada. Por isto, a ilusão deve ser destruída. Neste sentido, as quedas podem ter um importante papel pedagógico, perfeitamente expresso na frase dos Padres do Deserto: "Que teu entulho seja teu pedagogo". Elas podem nos dar uma compreensão mais profunda da nossa pequenez, do nosso nada e isto é fundamental para que exista humildade, sendo esta, na expressão de Sto Antônio, a gênese de toda virtude assim como o botão é o início da flor.

Temos de desenvolver no íntimo da alma a convicção aguda do que Jesus diz: "Sem mim nada podeis fazer". Enquanto esta verdade não estiver circulando no nosso sangue e impregnando a medula dos nossos ossos, estaremos fadados às quedas. Enquanto estivermos pretendendo ser alguma coisa de independente e alternativo a Jesus, estaremos pagando mico e perdendo tempo.

No entanto, a Julian de Norwich afirma que Deus assiste a nossa dor pelo fato de termos pecado e, não somente assiste - o que já sabemos -, mas também haverá de recompensá-la. Aqui está um traço muito inovador e do qual nunca encontrei nenhum equivalente em ninguém mais. Segundo ela, o sofrimento provindo do pecado seria, depois, gratificado pelo próprio Deus.

A Julian escreve seus textos com base em algumas revelações místicas que ela afirmou ter recebido.

Lembro-me que, no final destas comunicações, a Pessoa com Quem havia interagido manteve com ela este pequeno diálogo:

- O que vistes nessas revelações?
Julian - O amor.
- Quem te mostrou?
Julian - O amor.
- Por quê?
Julian - Por amor.

Havia ainda outra coisa que Deus dizia de muito motivador:

"Eu sei como fazer bem a todas as coisas,e tu verás, no final, como tudo terminará bem"

Que assim seja, por favor...

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