quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Pecado, dor, ignorância e falsidade


A fim de descobrir o que vai por trás de uma aparência, há que se ter atenção e a atenção pressupõe quietude.

Um pecado, por exemplo, se desperta inquietude e agitação, impede, no mesmo ato, a correta avaliação do que se fez e de por que se o fez. Mas é comum que às vezes o incômodo gerado não proceda diretamente do ato, mas do modo como a mente antecipa o julgamento de outros a respeito do mesmo ato. Assim, ela sofre por vaidade, e, além disso, assume um incômodo postiço, produto de uma conclusão conceitual – isto é, geral -, mas que se distingue inteiramente do incômodo visceral e singular que uma experiência também singular produz ou supostamente deveria produzir.

Assumir uma postura dolorida assim é assumir uma postura falsa. E esta falsidade tende a obscurecer a visão interior a respeito do que se fez, pois ela fica como uma capa flutuante e um modo de autoengano que a pessoa produz para esconder de si mesma o agravante de não estar pesarosa pela falta cometida. Um pecado pode, então, ser um ajudante no processo de autoconhecimento, e era isso o que os Padres do Deserto diziam: “Que o teu entulho seja teu pedagogo.” Mas, para isso, é preciso uma quietude que permita que o olhar da alma se detenha na questão.

Dar-se a si mesmo uma espécie de contrição pressupõe já tê-la antes da queda, o que é contraditório. Ninguém dá o que não tem. Assim, se um pecado em particular, embora objetivamente considerado grave, não desperte a culpa que se supõe normal em tais casos, isto deve ser aproveitado não para que seja deixado para lá, mas para que seja melhor investigado. O que está por trás da aparência? Como diz um trecho do livro de Levíticos: “Não faça isso, pois isso é bondade! (Hesed)". O ser humano só pode desejar algo, ainda que seja ruim, sob o aspecto do bem. Esta afirmação geralmente pressupõe a bondade visada no objeto. Mas é possível que a bondade esteja no que cometeu o que não deveria. Por trás do que se faz, portanto, não raro se esconde uma boa intenção ou uma boa raiz má considerada. Esta posição se avizinha da de Sócrates para o qual a maldade é produto de uma espécie de ignorância, esta entendida como o estado de não saber a respeito de algo que é essencial conhecer.

Isso obviamente não permite relativizar o pecado, mas serve para brecar a afetação posterior e para reconhecer que até mesmo ele pode ter uma função pedagógica. Se todo pecado é sempre um efeito daquela primeira Queda, todo pecado possui também a possibilidade de se tornar uma "felix culpa".

quinta-feira, 21 de julho de 2016

Sobre Moral, Liberdade, Egoísmo e Tristeza


"Para saborear tudo, não queiras ter gosto em coisa alguma" 
São João da Cruz

O ser humano é um ser que intelige e decide, mas não necessariamente nessa ordem, já que o objeto de intelecção já é submetido a um prévio ato de deliberação. Não apenas faço o que entendi dever fazer, mas escolho aquilo no que vou pensar. Porém, é verdade que este prévio ato deliberativo se relaciona muito mais com o desejo - uma espécie de instinto imediato - do que com a vontade. Temos então a seguinte ordem: desejo - inteligência - vontade. É possível e comum que desejo e vontade discordem. Neste caso, a vontade age como sucessora corretiva do desejo. Como este é prévio à inteligência, ele tende a ser amoral, pois agir moralmente é agir segundo regras ou motivos; é saber por que agir assim é correto ou errado. A vida moral - a não ser quando já se tem o hábito - não pode ser fruto de qualquer inspiracionismo, como se nós tendêssemos naturalmente à vida correta. Qualquer mínimo exame da nossa realidade psíquica dá conta de ver que isso não é assim. Tendemos ao mal, e não é raro que mesmo aquela ação que julgamos naturalmente boa encubra intenções e desejos que não o são.

Na vida moral, há que se distinguir, portanto, estas duas coisas: a ação objetiva e a intenção ou finalidade que se pretende alcançar com a ação. Isoladas, elas não são suficientes ainda para constituir a ação moral. Mas se pode dizer que a intenção isolada tende a ser mais desculpável para o sujeito do que a ação isolada. Claro que há nisso controvérsias. Se um dado ato irrefletido, mas munido de boas intenções, só foi executado assim na ignorância de sua efetividade real devido a alguma negligência anterior do sujeito, ele já não se torna tão desculpável assim porque o conjunto da negligência anterior contamina a intenção atual do sujeito. Por trás de sua intuição de sinceridade pessoal há de se esconder qualquer senso de vigarice, pois o desconhecimento da objetividade da situação é fruto de um vício prévio.

Quanto às ações, tomadas isoladamente, é sabido que quaisquer delas podem ser inspiradas por um sem fim de motivos internos. Uma pessoa pode dar esmolas porque quer alimentar o esfomeado, ou porque quer cultivar a imagem de honesto para os outros, ou porque quer cultivá-la para si, ou porque quer impressionar alguém, ou porque quer impressionar Deus, ou porque quer ir para o Céu, ou porque não quer ir para o Inferno, ou porque quer que o pedinte o deixe em paz, ou porque se recordou de alguma situação anterior que o empurra para essa ação, ou porque simpatizou com aquele pedinte em particular, ou porque se sentiu momentaneamente comovido e aí obedece a si mesmo nesse ímpeto atual e totalmente instintivo de dar, etc. Do ponto de vista exterior, temos somente a ação. É por isso que o julgamento das intenções só é reservado a Deus, pois uma ação nem sempre é efeito fiel de correspondentes interiores. É preciso ainda dizer que essa fonte confusa dos nossos atos nem sempre é totalmente consciente. Bem, é comum que não o seja. Nós costumamos mentir para nós mesmos, e por isso não nos agrada quando alguém nos acusa de algo justamente. Nos é preferível à sensibilidade ficar na ignorância dessas coisas. E isso é assim também conosco. Se quem tenta conhecer-se encontra nisso extrema dificuldade, imaginem que não tem interesse nisso.

O que caracterizaria então a ação moral? Parece-me poder dizer que é a conjugação de ação boa em si - isto é, tomada objetivamente - com o desinteresse pessoal, isto é, sem qualquer cálculo de ganho pessoal em quem age. Quando há dissociação entre ação e intenção, temos a clássica situação da hipocrisia. Esta pode ser mais consciente e voluntária, mas também pode sê-los menos. Uma pessoa que, enquanto faz uma boa ação, diz interiormente que não quer recompensa e que faz somente pelo outro, pode ainda assim esconder, numa região mais  interior e ao abrigo da visão atual da consciência, a intenção de comover a Deus, e, assim, alcançar d'Ele algum favor. São João da Cruz, por isso, pedia para que, quando fizéssemos um ato correto, fizéssemo-lo como se mesmo Deus nunca fosse tomar notícia dele.

É bastante comum também que um sujeito passe a agir moralmente depois de alguma experiência que o tenha comovido. Inspirados, todos tendemos a agir de modo diferente, e isso não é ruim, mas a esfera da comoção, que é o campo dos nossos sentimentos, é por natureza volúvel e não há que se construir nada nisso aí. Óbvio que este pode ser um começo, mas, em quem não o percebe, haverá uma vaga e tola esperança de que aquele estado de espírito que então se vive seja perpetuado, o que asseguraria então que a nova direção das ações pessoais estaria resguardada. Contudo, além da falsidade dessa conclusão - que, não obstante, retomamos de novo e de novo -, o próprio ato de agir quando isto dá à consciência aquele conforto característico - quando a ação é um modo de assegurar o próprio valor moral, ou a própria concordância a um ideal - torna a ação, já, maculada. Há, no fim, uma busca por auto-satisfação. Notem que o problema não é a satisfação que uma boa ação pode causar à pessoa, mas a busca por ela. O prazer e a felicidade não devem ser objetos diretos da busca humana. Eles, por natureza, são acompanhantes. Eles se vinculam a objetos. Se buscamos objetos prazerosos, eles nos darão prazer. Se buscamos somente o prazer, ele até se permitirá fruir, mas não o fará sem resistência. É por isso que os vícios tendem a produzir efeitos cada vez menores. Com a felicidade é o mesmo: ela será tanto maximizada quanto menos for o objeto de busca principal. "Nega os teus desejos e encontrarás o que deseja o teu coração".

Se uma pessoa se habitua a agir buscando o prazer e a felicidade nas coisas, ainda que inconscientemente, ela se condenará a uma série de prejuízos: terá um tipo de vida moral muito condicionada às circunstâncias, será necessariamente inconstante - pois se moverá segundo suas disposições interiores -, tenderá ao egoísmo - pois está sempre gravitando em torno dos próprios ganhos -, e, como sua consciência estará enredada no fluxo das sensações exteriores e interiores, será necessariamente inquieta e superficial, pois nunca entra fundo em si mesma, onde as coisas são mais estáveis. O produto disso tudo é uma espécie de cegueira e de depressão crônica subjacente, pois, a rigor, a alma anda perdida. E isto se torna um círculo vicioso: quando mais tristeza, mais busca desesperada por algo que a supra, e, como esta busca mantém a lógica da tristeza, esta aumenta, levando a mais ações e mais angústia. A pessoa age como alguém que, estando machucado, golpeia os pregos diante de si, e, ao aumento da dor, aumenta a violência dos golpes.

O desinteresse interior, ao contrário, reorienta a alma para além de si mesma. Isto gera uma saída do solipsismo, e ela se torna disponível a qualquer outra voz além da sua. Relativizar-se é o começo da saúde. Aceitar que Deus é Outro, e não eu mesmo, é algo que não basta compreender: é necessário intuir e saborear. Isto permite que a pessoa aja independentemente do que está sentindo no momento. Se ela passa a agir assim, chegará o dia em que já não se perguntará se o que tem de fazer é agradável ou não. Ela fará. A pessoa cessa de ter uma intenção curva - que voltava sempre pra ela mesma - e passa a ter uma intenção reta, e a intenção reta, diz o Imitação de Cristo, alcança Deus.

Para reorientar a intenção interior, não é suficiente somente um esforço de consciência, embora este já seja útil. Compreender essas verdades é fundamental para alguém que quer fazer da vida algo além de um rodopio em torno de si mesmo. Mas é preciso acrescer outras coisas: a nossa vida inteira foi vivida nessa lógica, e o nosso pecado não é senão uma culminância natural disso que ocorre na nossa alma. Se é verdade que a operação segue o ser - e é verdade -, o nosso pecado é sempre a exteriorização de um tipo de enfermidade interior. O que fazer, então? Primeiramente, compreender isso tudo, mesmo, pois a nossa consciência, embora seja atingida por esse fluxo desordenado de paixões, ainda é capaz, em geral, de, com o devido esforço, olhar como que por cima da tempestade. Estes saltos permitem-na ver. Em seguida, é preciso combater ativamente a desordem, e, para isso, não há outro meio que a mortificação. Mortificar-se é inverter a ordem. Se antes se vivia para o prazer e para o ganho sensível, agora o sujeito buscará ativamente os desprazeres e, passivamente, não reclamará nem fugirá dos desconfortos. É isso o que quer dizer ainda São João da Cruz quando escreve: "Deixa-te ensinar, deixa-te mandar e desprezar, e serás perfeito." É como quando, depois de girar muito para um lado, e já bêbados, precisamos agora girar para o outro para diminuir a tontura. Quanto menos tontura, melhor disposição interior e mais clara a visão. E quanto mais avançados nesse caminho, mais perceberemos detalhes e sutilezas. Desde já, porém, é preciso notar: não há caminho alternativo. Haveria somente se Deus coagisse a alma. E Ele de certo modo o faz quando nos dá sofrimentos. Os sofrimentos são como um empurrão por esse caminho em quem ia totalmente pelo outro lado. Mas, ainda assim, isso não é determinante, pois, em última instância, a decisão é sempre da pessoa.

Atos morais, que são totalmente bons, são os atos desinteressados e que se orientam em direção ao bem objetivo. É assim que Deus age, e é assim que o cristão deve viver: imitando-O.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Guénon sobre o Wu-wei


Se, de uma maneira geral, conveio-se reprovar à doutrina indiana menosprezar a ação, é sobretudo ao falar do taoísmo onde se sente a necessidade de falar mais expressamente ainda do "quietismo", e isso por causa do papel que joga ali o "não-atuar" (Wu-wei), cuja verdadeira significação os orientalistas não compreendem em modo algum, e que alguns dentre eles fazem sinônimo de "inatividade", de "passividade" e inclusive de "inércia". No entanto, há alguns que se deram conta de que há nisso um erro; mas, não compreendendo também no fundo do que se trata, e confundindo igualmente ação e atividade, negam-se então a traduzir wu-wei por "não-atuar", e substituem este termo por perífrases mais ou menos vadias e insignificantes, que diminuem o alcance da doutrina e não deixam perceber já nada de seu sentido profundo e especificamente inicial. Em realidade, a tradução por "não-atuar" é a única aceitável, mas, por causa da incompreensão ordinária, convém explicar como se deve entender: não só este "não-atuar" não é a inatividade, senão que, segundo o que indicamos precedentemente, é ao invés a suprema atividade, e isso porque está tão longe como é possível do domínio da ação exterior, e completamente liberado de todas as limitações que se lhe impõem a esta por sua própria natureza; se o "não-atuar" não estivesse, por definição mesma, além de todas as oposições, se poderia dizer pois que é em certo modo o extremo oposto da meta que o quietismo atribui ao desenvolvimento da espiritualidade.

Não há que dizer que o "não atuar", ou o que é seu equivalente na parte inicial das demais tradições, implica, para aquele que chegou a ele, um perfeito desapego a respeito da ação exterior, como pelo demais de todas as demais coisas contingentes, e isso porque um tal ser se situa no centro mesmo da "roda cósmica", enquanto essas coisas não pertencem mais do que a sua circunferência; se o quietismo professa por seu lado uma indiferença que parece recordar em alguns aspectos este desapego, é certamente por razões muito diferentes. Do mesmo modo que fenômenos similares podem dever-se a causas muito diversas, assim também maneiras de atuar (ou, em alguns casos, de abster-se de atuar) que são exteriormente as mesmas podem proceder das intenções mais diferentes; mas, naturalmente, para aqueles que ficam nas aparências, disso podem resultar muitas assimilações. Efetivamente, sob esta relação, há alguns fatos estranhos aos olhos dos profanos, que poderiam ser invocados por eles em apoio da aproximação errônea que querem estabelecer entre o quietismo e tradições de ordem inicial.

René Guénon, Contra o Quietismo.

Ao final do precedente capítulo, fazíamos alusão a algumas maneiras de atuar mais ou menos extraordinárias que podem proceder, segundo os casos, de algumas razões diferentes; é verdade que, de uma maneira geral, implicam sempre que a ação exterior se considera de maneira muito diferente a como o é pela maioria dos homens, e que, a essa ação, tomada em si mesma, não se lhe dá a importância que se lhe atribui comumente; mas a este respeito há que fazer muitas distinções. Devemos precisar primeiramente que o desapego da ação, de que falávamos a propósito do "não-atuar" é antes de mais nada uma perfeita indiferença no que diz respeito aos resultados que podem obter-se dela, já que esses resultados, quaisquer que sejam, não afetam já realmente ao ser que chegou ao centro da "roda cósmica". Ademais, é evidente que um tal ser jamais atuará por necessidade de atuar, e que, por outra parte, se deve atuar por um motivo qualquer, não sem plena consciência de que essa ação nada mais é do que uma simples aparência contingente, ilusória como tal para seu próprio ponto de vista (não dizemos, bem entendido, para o ponto e vista dos demais seres que são testemunhas dela), não a cumprirá forçadamente de uma maneira que difira exteriormente da dos demais homens, a menos que tenha para isso também motivos particulares em alguns casos determinados. Se compreenderá sem esforço que isso é algo totalmente diferente da atitude dos quietistas e de outros místicos mais ou menos "irregulares", que, pretendendo tratar a ação como algo desdenhável (enquanto, no entanto, estão muito longe de ter chegado no ponto desde onde a ação aparece como puramente ilusória), encontram nisso sobretudo um pretexto para fazer indistintamente não importa o que, seguindo os impulsos da parte instintiva ou "subconsciente" de seu ser, o que, evidentemente, corre o risco de ocasionar toda sorte de abusos, de bagunças ou de desvios, e o que, em todo caso, tem ao menos o grave perigo de deixar às possibilidades inferiores desenvolverem-se livremente e sem controle, em lugar de fazer para dominá-las um esforço que seria pelo demais incompatível com a extrema passividade que caracteriza os místicos deste gênero.

René Guénon, Loucura aparente e Sbedoria oculta

quinta-feira, 16 de junho de 2016

+1, -1 ... ∞


"Time waits for nobody", diz uma das músicas do Freddie Mercury de que eu gosto. A frase, dita assim, parece um lamento. E de fato o é. Grande parte da vida humana é ou desejar que o tempo passe, ou lamentar que ele tenha passado. Até os vinte anos, prevalece a primeira atitude. Depois, a gente vai olhando pra trás e vai querendo sabotar a engrenagem do tempo, para que corra mais devagar. Se isso fosse possível... Mesmo assim, às vezes eu observo alguns idosos e fico impressionado com a resignação que eles têm com isso. Já foram jovens. Já tiveram toda vitalidade. Mas parecem ver como natural o estado no qual se encontram. Aceitaram. Talvez seja a tal sabedoria dos anciãos. E isso me remonta ao Mickey, do filme Rocky, que dizia: "A natureza é sábia. O mundo vai nos tirando as coisas, nos deixando desapegados, até que num momento a gente percebe que não tem mais o que fazer aqui." O tempo, assim, aparece como uma espécie de desnudamento progressivo. E o que acontece quando ficarmos totalmente nus? Nascemos. "Aparecerei diante de Deus com as mãos vazias", dizia Sta Teresinha de Lisieux.

Isto por acaso significa que a vida deve tornar-se uma lamentação ou uma ânsia pela morte? Não. É verdade que esta vida só tem seu valor real - não um valor imaginado que, em última instância, não pode muito além de autoproduzir um prazer fugidio que aumenta ainda mais o blue da coisa - se posta em relação com a eternidade. Mas justamente este aspecto fá-la ser uma antecipação. Embora a espera se ordene à presença, ela tem a sua própria beleza. E o risco de não culminar com aquela visão, misturado com a esperança de tê-la, serve como que de tempero, dando variados sabores aos dias que correm, ou como um espectro de multicores que colore o ambiente com infindas combinações. "Em pensar naquele reencontro, meus olhos enchem de lágrimas", dizia o visceral Léon Bloy, cuja vida não lhe permitia muita coisa além de esperar.

Mas "o tempo é a imagem móvel da eternidade", dizia Platão. A eternidade é um instante fixo, "posse simultânea de todos os bens", escreveu Boécio. Nela não há passado ou futuro, pois estes, dirá Agostinho, são frutos de uma alma partida, efeito da Queda. De posse d'Aquele que nos completa, e possuídos por Ele, seremos inteiros. O presente é, portanto, o símbolo da vida total, e enquanto ele estiver a correr, saberemos que a vida total ainda não chegou. Nisto se dá um paradoxo: lamentamos que a nossa vida vai ficando para trás, e este lamento nos distrai do lugar onde estritamente ela acontece, ainda que premida num espaço estreitíssimo: o presente. Ser fiel ao Céu, destino eterno do homem - o que não o impede de frustrar este destino - é habituar-se, desde já, a viver no presente. "Para amar-Te, oh meu Deus, só tenho hoje." A beleza poética da espera só é possível hoje. A luz feliz e inquieta da esperança também só é possível hoje. A oscilação da Fé, igualmente. O agora tem a sua beleza por ser símbolo da eternidade. A espera é símbolo da presença. Não é bom, portanto, lamentar-se. Os que vão ficando velhos são os que vão terminando o tempo de gestação: voltarão a nascer, mas agora no eterno presente.

Esta vida inteira possui, então, duas faces: uma que se volta para o futuro, pelo que é espera; e uma que se volta para o agora, pelo que é fruição. Uma fruição que se apega é uma fruição na qual se imiscuiu a preocupação com o tempo, sobretudo com o passado. É o medo de perder que faz entrar no gozo do agora a sombra do ego. O agora é instante. Nele não há divisão. Vivê-lo é aproveitar a vida, com suas durezas e seus prazeres, recebendo-a de mãos abertas. É claro que isto não implica nenhum tipo de inconsciência ou irreflexão. Isto implica, ao invés, inteireza e não distração. É o que os budistas chamam de "mindfullness". Acima do fluxo desta vida, está a Rocha inconcussa que é Deus e sobre a qual tudo se fundamenta. Não nos distraiamos disso: Deus é futuro e presente. Aristóteles dizia que o mundo tira seu movimento do fato de ser atraído por Deus, beleza infinita, pois é próprio do belo atrair. O tempo é imagem móvel. Que o tempo da nossa vida seja puxado por aquela Beleza, "assim como a mariposa é atraída pela chama, e se queima", escreve São João da Cruz. Aquele fogo será a totalidade da nossa vida. Corramos para lá, mas já apreciando o calor que desde agora aquele Lume nos projeta. Brigado, Senhor, por mais um ano, e por menos um ano. Obrigado por esta alma imortal, cuja vida faz digno de nada o tempo.

A cena do Rocky que mencionei acima e de que gosto bastante.

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Medo, Angústia e Conhecimento


Como o dissemos, alguns não se limitam a falar de "inquietude" [metafísica], senão chegam inclusive a falar de "angústia" [metafísica], o que é ainda mais grave, e expressa uma atitude quiçá mais claramente antimetafísica ainda, se é possível; por outra parte, os dois sentimentos estão mais ou menos relacionados, já que um e outro têm sua raiz comum na ignorância. Efetivamente, a angústia nada mais é do que uma forma extrema e por assim dizer "crônica" do medo; agora bem, o homem é levado naturalmente a sentir medo diante do que não conhece ou não compreende, e este medo mesmo vem de um obstáculo que lhe impede vencer sua ignorância, já que lhe leva a apartar-se do objeto em presença do qual o sentiu e ao qual atribui sua causa, enquanto, em realidade, essa causa não está mais do que nele mesmo; ademais, a esta reação negativa se lhe segue muito frequentemente um verdadeiro ódio a respeito do desconhecido, sobretudo se o homem tem mais ou menos confusamente a impressão de que esse desconhecido é algo que rebaixa suas possibilidades atuais de entendimento.

Não obstante, se a ignorância pode dissipar-se, o medo se desvanecerá de imediato por isso  mesmo, como ocorre no exemplo bem conhecido da corda tomada por uma serpente, o medo, e portanto a angústia, que nada mais é do que um caso particular do mesmo, é pois incompatível com o conhecimento, e, se chega a um grau tal que seja verdadeiramente invencível, isso fará que o conhecimento se volte impossível, inclusive na ausência de todo outro impedimento inerente à natureza do indivíduo; por conseguinte, neste sentido se poderia falar de uma "angústia metafísica", que joga em certo modo o papel de um verdadeiro "guardião do umbral", segundo a expressão dos hermetistas, e que fecha ao homem o acesso ao domínio do conhecimento metafísico.

É mister ainda explicar mais completamente como o medo resulta da ignorância, tanto mais que tivemos recentemente a ocasião de constatar sobre este ponto um erro bastante surpreendente: vimos atribuir-se a origem do medo a um sentimento de isolamento, e isso numa exposição que se baseava sobre a doutrina vedântica, enquanto esta ensina ao invés expressamente que o medo se deve ao sentimento de uma dualidade; e, efetivamente, se um ser estivesse verdadeiramente só, de que maneira poderia ter medo? Se dirá quiçá que pode ter medo de algo que se encontra em si mesmo; mas isso mesmo implica que há nele, em sua condição atual, elementos que escapam a seu próprio entendimento, e por consequência uma multiplicidade não unificada; pelo demais, o fato de que esteja isolado ou não não muda nada nisso, e não intervém em modo algum em parecido caso. Por outra parte, não se pode invocar validamente, em favor desta explicação pelo isolamento, o medo instintivo sentido na escuridão por muitas pessoas, e concretamente pelas crianças; este medo se deve em realidade à idéia de que podem haver na escuridão coisas que não se vêem, e por tanto que não se conhecem, e que, por esta razão mesma, são terríveis; ao contrário, se a escuridão fora considerada como vazia de toda presença desconhecida, o medo careceria de objeto e não se produziria. 

O que é verdade é que o ser que sente medo procura isolar-se, mas precisamente para extrair-se a ele; toma uma atitude negativa e se "retrai" como para evitar todo contato possível com aqueles que teme, e daí provém sem dúvida a sensação de frio e os demais sintomas fisiológicos que acompanham habitualmente o medo; mas esta sorte de defesa irreflexiva é pelo demais ineficaz, já que é bem evidente que, faça um ser o que faça, não pode isolar-se realmente do meio do qual está colocado por suas condições mesmas de existência contingente, e que, enquanto se considere como rodeado por um "mundo exterior", é-lhe impossível pôr-se inteiramente ao abrigo dos atentados deste. O medo não pode ser causado mais do que pela existência dos demais seres, que, enquanto são outros, constituem esse "mundo exterior", ou de elementos que, ainda que incorporados ao ser mesmo, por isso não são menos estranhos e "exteriores" a sua consciência atual; mas o "outro" como tal não existe mais do que por um efeito da ignorância, já que todo conhecimento implica essencialmente uma identificação; por conseguinte, pode dizer-se que quanto mais conhece um ser, menos "outro" e "exterior" há para ele, e que, na mesma medida, a possibilidade do medo, possibilidade pelo demais completamente negativa, está abolida para ele.

E finalmente o estado de "solidão" absoluta (kaivalya), que está além de toda contingência é um estado de pura impassibilidade. A propósito disto, precisaremos incidentemente que a "ataraxia" estóica não representa mais do que uma concepção deformada de um tao estado, já que a mesma pretende aplicar-se a um ser que em realidade está ainda submetido às contingências, o que é contraditório; esforçar-se em tratar as coisas exteriores como indiferentes, tanto como se possa na condição individual, pode constituir uma espécie de exercício preparatório em vista da "libertação", mas nada mais, já que, para o ser que está verdadeiramente "liberado", não há coisas exteriores; um tal exercício poderia considerar-se em suma como um equivalente do que, nas "provas" iniciais, expressa sob uma forma ou outra a necessidade de superar primeiramente o medo para chegar ao conhecimento, que a seguir voltará impossível esse medo, já que então já não terá nada pelo que o ser possa ser afetado; e é bem evidente que é mister guardar-se de confundir os preliminares da iniciação com seu resultado final.

Outra precisão que, ainda que acessória, não carece de interesse, é que a sensação de frio e os sintomas exteriores aos quais fizemos alusão faz um momento se produzem também, inclusive sem que o ser que os sente tenha conscientemente medo falando propriamente, nos casos onde se manifestam influências psíquicas de ordem mais inferior, como por exemplo nas sessões espíritas e nos fenômenos de "obsessão"; aqui também, trata-se da mesma defesa subconsciente e quase "orgânica" em presença de algo hostil e ao mesmo tempo desconhecido, ao menos para o homem ordinário que não conhece efetivamente senão o que é suscetível de cair sob os sentidos, isto é, unicamente as coisas do domínio corporal. Os "terrores pânicos", que se produz em nenhuma causa aparente devem-se também à presença de algumas influências que não pertencem à ordem sensível; pelo demais, são frequentemente coletivas, o que vai igualmente contra a explicação do medo pelo isolamento; e neste caso, não se trata necessariamente de influências hostis ou de ordem inferior, já que pode ocorrer inclusive que uma influência espiritual, e não só uma influência psíquica, provoque um terror deste tipo nos "profanos" que a percebem vagamente sem conhecer nada de sua natureza; o exame destes fatos não faz mais do que confirmar também que o medo é realmente causado pela ignorância, e é pelo que cremos bom assinalá-los de passagem.

O conhecimento é o único remédio definitivo contra a angústia, bem como contra o medo sob todas as suas formas e contra a simples inquietude, já que estes sentimentos não são senão consequência ou produtos da ignorância, e já que em consequência do conhecimento, desde que se o atinge, ficam destruídos inteiramente em sua raiz mesma e tornados daí em diante impossíveis, enquanto, sem ele, inclusive se são apartados momentaneamente, sempre podem reaparecer ao fio das circunstâncias. Se se trata do conhecimento por excelência, este efeito repercutirá necessariamente em todos os domínios inferiores e assim estes mesmos sentimentos desaparecerão também no que diz respeito às coisas mais contingentes; como, efetivamente, poderiam afetar ao que, vendo todas as coisas no princípio, sabe que, quaisquer que sejam as aparências, não são em definitivo mais do que elementos da ordem total? Passa com isso como com todos os males dos que sofre o mundo moderno: o verdadeiro remédio não pode vir mais do que por cima, isto é, por uma restauração da intelectualidade; enquanto se procure remediá-los por baixo, isto é, contentando-se com opor umas contingências a outras contingências, tudo o que se pretenda fazer será vão e ineficaz; mas, quem poderá compreendê-lo enquanto ainda há tempo para isso?

René Guénon, Iniciação e realização espiritual. São Paulo: IRGET, 2014. p.18-21.

terça-feira, 1 de março de 2016

É preciso ver


Os Magos viram-no: era uma criancinha que nada dizia. Quais foram os seus motivos de credibilidade? E o que era essa estrela que lhes tinha dado o sinal de partida? Simeão, o velho, viu. E quando o Menino chegou ao templo, levado por sua mãe, Simeão não disse: "Esperai que eu consulte os meus autores". Acreditou e cantou a sua alegria.

Há em Jesus uma luz, mas nem todos a vêem. Essa luz, como a que revela a Deus na Natureza, fala ao espírito, inflama o coração e faz palpitar. Mas é preciso ver. 

Está sempre em Jesus. No momento em que, vencido, morria sobre a cruz, ensanguentado, desfeito, escarnecido e aparentemente impotente, o que é que vê o bom ladrão que lhe faça dizer: "Senhor, lembrai-vos de mim quando tiverdes entrado no vosso reino"?

Nenhum ato de fé será, talvez, mais emocionante e mais perfeito que esse, no momento em que tudo o que era humano abandonava Jesus, em que já se não vê nele nada mais que possa seduzir ou arrastar, nada mais, seguramente, que dê impressão de poder. O Mestre desapareceu, já resta só a Vítima. Os Apóstolos pensam assim e fugiram. Mas não, há uma testemunha. "Senhor", diz ele. Ouvis? Ele diz "Senhor". "Senhor, lembrai-vos de mim quando tiverdes entrado no vosso reino." É de reino que ele fala, e eles estão lado a lado, agonizando juntos, e é Jesus o mais desfeito.

Pe Jacques Leclercq, Diálogo do homem e de Deus.

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Cremos em Jesus por Ele mesmo


"É verdade que há uma sabedoria humana que todos os grandes sábios procuraram purificar. Há certa pureza em Buda, em Confúcio e em Sócrates, mas Jesus é o Filho de Deus: é outra coisa. Os outros falaram; Ele é. Não é somente por aquilo que Ele diz que o seguimos; é por Ele mesmo. Não somos apenas os discípulos dos seus ensinamentos, mas da sua pessoa. Quando dizemos que cremos nele, isso não quer dizer unicamente que julgamos justas as idéias que propõe, mas que o julgamos, a Ele, à sua pessoa, o ser mais amável e o único fim do Homem. Ama-se a Jesus, acredita-se nele, prendemo-nos a Ele; ser cristão é estar invadido até às raízes do próprio ser pela sua pessoa viva..."

Pe Jacques Laclercq

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Vivem como que esperando e não esperam nada


"Quase todos os homens vivem num nevoeiro, perseguem objetivos imediatos que saem por um instante da bruma, esse bem que convém adquirir, aquele lugar entre os seus semelhantes, tal prazer; quando atingem um deles, surge outro da bruma, e, assim, vão como à deriva oscilando e objetivo imediato em objetivo imediato, sem uma linha de vida.

Não têm idéia clara da hierarquia dos valores. Não há um que seja o fim a que os outros se deverão ordenar. Ou, então, põem o fim num bem temporal, um Homem, uma mulher, o dinheiro, a Pátria.

E muitos estão como numa sala de espera em que não esperam nada. Estão na vida sem se terem perguntado porquê; vivem porque estão na vida; obedecem ao instinto obscuro que se agarra à vida. Mas, não têm nada a fazer dela.

Vivendo em presente, tratam de estar o melhor ou o menos mal possível. Trabalham se é necessário para viver: senão, não fazem nada. Prevêem na medida de alguns fins imediatos. Quanto à morte, evitam pensar nela e permanecem na vida porque estão como que esperando e não esperam nada.

Isto é o que provoca o tom cinzento geral da vida. A maior parte dos homens tem pouca alegria; o máximo que obtêm é uma espécie de ausência de dor sofregamente conservada. Nada mais instrutivo do que passar entre pessoas que se divertem, ver a expressão dos seus rostos e ouvir as suas reflexões.

Dizem-nos especialmente que para se divertir bem numa reunião alegre é preciso beber um bocado de maneira que a cabeça não esteja totalmente firme.

A sua vida é um torpor habitual de que só saem sob o influxo da necessidade ou da paixão.

Aliás, nada há de tão triste como ver que pouca gente é feliz. Quando, afinal, a felicidade está ao alcance da mão e à vista, na Natureza e em nós mesmos. Regnum Dei intra vos est."

Pe Jacques Leclercq

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Satanismo inconsciente


René Guénon

Mas voltemos para o que chamamos o satanismo inconsciente, e, para evitar todo engano, digamos primeiro que um satanismo deste gênero pode ser puramente mental e teórico, sem implicar nenhuma tentativa de entrar em relação com entidades quaisquer, cuja existência, em muitos casos, nem sequer se considera. É neste sentido como se pode, por exemplo, considerar como satânica, em uma certa medida, toda teoria que desfigura notavelmente a idéia da Divindade; e seria mister aqui colocar em primeiro lugar as concepções de um Deus que evolui e as de um Deus limitado;além disso, umas não são mais que um caso particular das outras, já que, para supor que um ser pode evoluir, é mister evidentemente lhe conceber como limitado; dizemos um ser, já que Deus, nestas condições, não é o Ser universal, mas sim um ser particular e individual, e isso não se dá sem um certo "pluralismo" onde o Ser, no sentido metafísico, não poderia encontrar lugar. Mais ou menos abertamente, todo "imanentismo" submete a Divindade ao devir; isso pode não ser visível nas formas mais antigas, como o panteísmo de Spinozaz, e talvez esta consequência seja inclusive contrária às intenções deste; mas, em todo caso, está muito claro a partir de Hegel, quer dizer, em suma, desde que o evolucionismo surgiu, e, em nossos dias, as concepções dos modernistas são particularmente significativas sob esta relação. Quanto à idéia de um Deus limitado, tem também, na época atual, muitos partidários declarados, seja em seitas como essas das quais falamos no final do capítulo precedente (os mórmons chegam até a sustentar que Deus é um ser corporal, a quem atribuem como residência um lugar definido, um planeta imaginário chamado "Colob"), seja em algumas correntes do pensamento filosófico, do "personalismo" de Renouvier até as concepções de William James, que o novelista Wells se esforça em popularizar. Renouvier negava o Infinito metafísico porque lhe confundia com o pseudo-infinito matemático; para James, a coisa é diferente, e sua teoria tem seu ponto de partida em um "moralismo" muito anglo-saxão: é mais vantajoso, do ponto de vista sentimental, representar Deus à maneira de um indivíduo que tem qualidades (no sentido moral) comparáveis às nossas; assim, é esta concepção antropomórfica a qual deve se ter por verdadeira, segundo a atitude "pragmatista" que consiste essencialmente em substituir a verdade pela utilidade (moral ou material); e além disso, James, conforme às tendências do espírito protestante, confunde a religião com a simples religiosidade, quer dizer, que não vê nela nada mais que o elemento sentimental.

Mas há outra coisa mais grave ainda no caso de James, e é sobretudo o que nos faz pronunciar a seu propósito esta palavra de "satanismo inconsciente", que, parece, indignou tão vivamente a alguns de seus admiradores, particularmente nos meios protestantes cuja mentalidade está inteiramente disposta a receber semelhantes concepções: é a sua teoria da "experiência religiosa", que lhe faz ver no "subconsciente" o meio para que o homem fique em comunicação efetiva com o Divino; daí a aprovar as práticas do espiritismo, a lhes conferir um caráter eminentemente religioso, e a considerar os médiuns como os instrumentos por excelência desta comunicação, há de se convir, não havia mais que um passo. Entre elementos bastante diversos, o "subconsciente" contém incontestavelmente tudo o que, na individualidade humana, constitui os rastros ou os vestígios dos estados inferiores do ser, e aquilo com o que põe ao homem em comunicação é certamente tudo o que, em nosso mundo, representa a esses mesmos estados inferiores. Assim, pretender que isso é uma comunicação com o Divino é verdadeiramente colocar a Deus nos estados inferiores do ser, in infieris no sentido literal desta expressão; assim, trata-se de uma doutrina propriamente "infernal", uma inversão da ordem universal, e isso é precisamente o que chamamos "satanismo"; mas, como está claro que não é querido expressamente e que os que emitem ou aceitam tais teorias não se dão conta de sua gravidade, não é mais que satanismo inconsciente. (...) Conforme a inversão seja intencional ou não, o satanismo pode ser consciente ou inconsciente.

René Guénon, A questão do satanismo. O erro espírita.