Pretendo escrever uma série de posts a respeito dos mistérios do terço que serão tão somente meditações pessoais. Afirmo desde já que incluirei também os mistérios luminosos, embora alguns não os considerem válidos. Nestes pontos em que não há perigo contra a Fé, minha atitude é, obviamente, de obediência.
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Neste mistério nós contemplamos a ocasião em que o Anjo Gabriel visitou a Virgem Maria, então adolescente, na pequena cidade de Nazaré. Como sabemos, a Virgem Maria é chamada de Nova Eva, enquanto o Cristo é chamado o Novo Adão. Assim como Adão e Eva são os primeiros humanos existentes na ordem da natureza, Jesus e Maria são os primeiros na ordem da Graça. Eles como que recapitulam a humanidade.
Em se tratando de Eva, o anjo Lúcifer, caracterizado pela serpente, animal de língua partida representando sua duplicidade e cujo andar se faz em forma de zigue-zague mostrando que o seu caminho não é reto, vai a ela e lhe seduz com uma mentira. Eva, aceitando a sugestão maligna, toma do fruto proibido e o dá a Adão. Por meio de ambos, entra a morte no mundo, a partir da desobediência. O próprio Lúcifer era um anjo rebelado que, à proposta divina, gritou asquerosamente: "não sirvirei". Esta é a gênese de todo pecado: a não aceitação do projeto divino, a não obediência a Deus. Na ocasião do pecado de Eva, esta somente caiu no engodo do demônio porque duvidou de Deus, pois, enquanto Deus lhe havia dito que morreria ao tomar do fruto proibido, a serpente lhe havia dito: "não, não morrerás".
Quando olhamos para Maria, a Nova Eva, vamos percebendo as perfeitas analogias, como que a corrigir o antigo erro. É também um anjo que vai a ela; só que desta vez, é um anjo de Deus, Gabriel, a força de Deus, demonstrando que a verdadeira força está, não na rebeldia, mas na obediência. Maria escuta a proposta do anjo e, muito ao invés do "non serviam" demoníaco, Maria apenas diz: "Fiat mihi secundum Verbum tuum" - Faça-se em mim segundo a sua Palavra". Faça-se! Eu aceito! Eu servirei!
Ao contrário de Eva que quis ser deusa sem Deus, Maria se diz a escrava: "Ecce ancilla Domine" - eis a escrava do Senhor. Em Eva, rebeldia; em Maria, abandono de si. Maria se insere, portanto, na tradição de Abraão, o pai da Fé, aquele que acreditou sem ver a terra que Deus lhe indicara. Também Maria não fez questão de esclarecimentos, ainda que, à primeira vista, uma gravidez, na sua cultura, poderia ter lhe causado o repúdio de José, seu noivo, como até o seu apedrejamento. Maria simplesmente aceita, porque a mensagem provém do próprio Deus, aquele que não mente! "Felizes os que crêem sem ter visto", dirá o Verbo mais tarde. Que diferença de Eva!
E, no Sim de Maria, o Verbo divino vem encarnar-Se em seu seio, pois Maria demonstrava ter as perfeitas disposições de alma que se requeria e era, já em virtude dos méritos da Paixão, totalmente isenta de qualquer pecado, e agraciada com todas as virtudes. Diz-se dela que é a aurora que prenuncia a luz do sol ainda quando este não surgiu. E Maria deu ao mundo o fruto da vida.
E o Verbo se fez carne e habitou no seio da Virgem Santíssima. Fez-se homem o Onipotente e foi gerado no ventre desta nova Eva Aquele que é incriado. Realiza-se aqui aquilo que S. Paulo descreve: "Não se prevaleceu de Sua igualdade com Deus, rebaixando-Se e tomando a forma de escravo". Assumiu a condição humana e assumiu-a perpetuamente. Ao fazê-lo, sem fim a elevou. Ao contrário do antigo Adão, que também cedeu à soberba -Superbia - da serpente, o novo Adão distingue-se sobretudo por Sua humildade. Ei-lo recluso por nove meses no ventre santíssimo da Virgem, como um Rei em seu leito particular. Ei-lo submisso... Dizia-nos Santa Catarina de Sena que, ao contemplar a humildade do Verbo divino, nós, os homens, deveríamos chorar de vergonha por nossa vaidade.
Por meio deste mistério, e pela intercessão de Maria Santíssima, conceda-nos o Senhor uma grande docilidade para conSigo, o expurgo de toda revolta da nossa alma e uma profunda humildade. Serviam!
"Foi um anjo orgulhoso, entre esplendores,
Que disse: "Nunca irei obedecer!"
Mas grito, na noite desta vida,
Quero obedecer sempre na terra."
Sta Teresinha de Lisieux
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